Até quando jornalistas como Merval serão
financiados com dinheiro público?
Por Paulo Nogueira
Diário do Centro do Mundo
Postado em 29 out 2014
Uma das coisas
essenciais que você aprende como executivo é a chamada “base zero” para
elaborar orçamentos.
Na inércia, nas
empresas, cada departamento vai simplesmente acrescentando no planejamento de
seus gastos 5% ou 10%, a cada ano.
A base zero
evita isso. Você mergulha em cada investimento e verifica se ele ainda faz
sentido. Às vezes, em vez de mantê-lo ou aumentá-lo, você percebe que o melhor
mesmo é eliminá-lo.
A quem
interessar: foi uma das coisas que aprendi em meus anos de editor da Exame e,
depois, de diretor superintendente de uma unidade de negócios da Abril.
Minha
introdução se destina a falar da regulação da mídia – um assunto que vai
provocar fortes emoções nos próximos meses.
Um passo vital
– e este independe de qualquer outra coisa que não seja a vontade do governo –
é fazer um orçamento a partir da base zero nos gastos com publicidade do
governo federal.
Por exemplo:
faz sentido colocar 600 milhões de reais por ano na Globo? Citei a Globo
porque, de longe, é ela quem mais recebe dinheiro federal na forma de anúncios.
Do ponto de vista
técnico, o carro-chefe da Globo é a televisão aberta – uma mídia que vai se
tornando mais e mais obsoleta à medida que avança a Era Digital.
Veja as
audiências da Globo. Nos últimos meses, ou até anos, é comum você ver que foi
batido o recorde de pior Ibope de virtualmente toda a grade da Globo.
Jornal
Nacional? Antes, 60% ou coisa parecida. Agora, um esforço para ficar na casa
dos 20%.
Novelas? Para
quem chegou a ter 100% em capítulos finais, é uma tragédia regredir, hoje, a
30%, e isto na novela principal, a das 9.
Faustão,
Fantástico? Em breve, estarão com um dígito de audiência, pelo trote atual.
Não vou entrar
aqui na questão da qualidade. Se um gênio assumisse o Jornal Nacional, o
conteúdo melhoraria, mas a audiência não: é a Era Digital em ação.
Pois bem.
Tudo aquilo
considerado, 600 milhões por ano fazem sentido tecnicamente?
É claro que
não.
Quanto faz
sentido: metade? Um terço? Não sei: é aí que entra o estudo com base zero.
É curioso notar
que um efeito colateral desse dinheiro colossal que entra todos os anos na
Globo – seu Anualão – é o pelotão de jornalistas como Jabor, Merval,
Sardenberg, Waack, Noblat e tantos outros dedicados à manutenção dos
privilégios de seus patrões e, claro, deles próprios.
Não é
exagero dizer que eles são financiados pelo dinheiro do contribuinte.
Digamos que
para 2015 fosse mantida metade do Anualão da Globo. Haveria, aí, 300 milhões de
reais ou para ajudar a equilibrar as contas públicas ou, no melhor cenário,
para ampliar programas sociais.
Cito a Globo
apenas pelo tamanho de seu caso.
Alguns meses
atrás, a sociedade subitamente se perguntou se era certo o governo federal
colocar 150 milhões por ano no SBT, em publicidade, para que, no final, aparecesse
em seu principal telejornal com enorme destaque uma comentarista que apoiava
justiceiros, Raquel Sheherazade.
Esqueçamos, no
caso do SBT, Sheherazade e tantos outros comentaristas de emissoras afiliadas
iguais a ela, como Paulo Martins, do SBT de Curitiba.
“O PT é um
tumor maligno”, escreveu ele em sua conta no Twitter perto das eleições. “Essa
eleição é o ponto limite para o Brasil desse mal com tratamento convencional.
Depois dessa, é muita dor ou morte.”
Em português:
ele estava pregando um golpe na democracia em caso de fracasso no “tratamento
convencional” – a vontade da maioria expressa nas urnas.
Também ele –
aliás numa concessão pública – é bancado pelo dinheiro público. A sociedade
aprovaria esse emprego de dinheiro?
É irônico, mas
o que a mídia tem que enfrentar é um choque de capitalismo: andar pelas
próprias pernas, sem o Estado-babá. (Até hoje vigora uma reserva de mercado na
imprensa, por absurdo que pareça em pleno 2014.)
Os bilhões que
ano após ano o sucessivos governos – na Era FHC as somas eram ainda maiores –
colocam nas grandes corporações de mídia têm ainda uma consequência pouco
discutida.
Dependentes do
governo – nenhuma sobreviveria se as verbas fossem extirpadas –, elas entram em
pânico a cada eleição presidencial. E fazem o que todos sabemos que fazem,
pela manutenção de seus privilégios.
Aécio, agora,
era a garantia de vida boa para todas elas. O modus operandi de Aécio é
conhecido: como governador de Minas, ele triplicou os gastos com publicidade.
Ele não teve o
pudor de deixar de colocar dinheiro público nem nas rádios de sua própria
família.
Na Minas de
Aécio, a imprensa amiga foi bem recompensada com anúncios, incluída a Globo
local.
E aqui um
acréscimo importante: fora o dinheiro federal, as grandes corporações de mídia são
abençoadas também com anúncios de governos estaduais e municipais.
Em São Paulo,
os governos do PSDB têm contribuído na medida de suas possibilidades com
empresas como Abril, Estado e Folha.
E não só com
publicidade. Todo ano, o governo paulista renova um grande lote de assinaturas
da Veja para distribuir as revistas em escolas públicas.
Felizmente para
a cabeça dos jovens, as revistas sequer são tiradas do plástico que as embala.
Que jovem lê
revista, hoje? Mesmo assim, as assinaturas são sempre renovadas.
Mas um passo
por vez.
Fazer um
orçamento de marketing com base zero nos gastos com publicidade seria uma
das atividades mais nobres nestes meses finais de 2014 para a equipe do
governo.
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Sobre o Autor
O jornalista
Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises
Diário do Centro do Mundo.
Reproduzido de Diário
do Centro do Mundo
29 out 2014
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