Neelie
Kroes, with Prof Herta Daubler-Gmelin (left) and Prof Vaire Vike Freiberga
Venício
A. de Lima *
Observatório
da Imprensa
29/01/2013
na edição 731
Sob o ensurdecedor
silêncio da grande mídia brasileira, foi divulgado em Bruxelas, no último dia
22, o relatório “Uma mídia livre e pluralista para sustentar a democracia
europeia”, comissionado pela vice-presidente da União Europeia, Neelie Kroes,
encarregada da Agenda Digital [ver aqui
a íntegra do relatório].
Preparado por um grupo
de alto nível (HLG) presidido pela ex-presidente da Letônia, Vaira
Vike-Freiberga, e do qual faziam parte Herta Däubler-Gmelin, ex-ministra da
Justiça alemã; Luís Miguel Poiares Pessoa Maduro, ex-advogado geral na Corte de
Justiça Europeia, e Ben Hammersley, jornalista especializado em tecnologia, o
relatório faz 30 recomendações sobre a regulamentação da mídia como resultado
de um trabalho de 16 meses que começou em outubro de 2011. As recomendações
serão agora debatidas no âmbito da Comissão Europeia.
O
relatório
O relatório, por óbvio,
deve ser lido na íntegra. Ele começa com um sumário das principais conclusões e
recomendações e, na parte substantiva, está dividido em cinco capítulos que
apresentam e discutem as bases conceituais e jurídicas que justificam as
diferentes recomendações: (1) por que a liberdade da mídia e o pluralismo
importam; (2) o papel da União Europeia; (3) o mutante ambiente da mídia; (4) a
proteção da liberdade do jornalista; e (5) o pluralismo na mídia.
Há ainda um anexo de 12
páginas que lista as autoridades ouvidas, as contribuições escritas recebidas e
os documentos consultados. A boa notícia é que quase todo esse material está
disponível online.
Para aqueles a favor da
regulamentação democrática da mídia, da mesma forma que já havia acontecido com
o relatório Leveson, é alentador verificar como antigas propostas
sistematicamente tachadas pela grande mídia e seus aliados da direita
conservadora de autoritárias, promotoras da censura e inimigas da liberdade de
expressão são apresentadas e defendidas por experts internacionais,
comissionados pela União Europeia.
Fundamento
de todo o relatório são os conceitos de liberdade de mídia e pluralismo. Está
lá:
“O
conceito de liberdade de mídia está intimamente relacionado à noção de
liberdade de expressão, mas não é idêntico a ela [grifo meu]. A última está
entronizada nos valores e direitos fundamentais da Europa: ‘Todos têm o direito
à liberdade de expressão. Esse direito inclui a liberdade de ter opiniões, de
transmitir e receber informações e ideias sem interferência da autoridade
pública e independente de fronteiras’ (…).
“Pluralismo
na mídia é um conceito que vai muito além da propriedade. Ele inclui muitos aspectos,
desde, por exemplo, regras relativas a controle de conteúdo no licenciamento de
sistemas de radiodifusão, o estabelecimento de liberdade editorial, a
independência e o status de serviço público de radiodifusores, a situação
profissional de jornalistas, a relação entre a mídia e os atores políticos etc.
Pluralismo inclui todas as medidas que garantam o acesso dos cidadãos a uma
variedade de fontes e vozes de informação, permitindo a eles que formem
opiniões sem a influência indevida de um poder [formador de opiniões]
dominante”.
Encontram-se no
relatório propostas como: (1) a introdução da educação para a leitura crítica
da mídia nas escolas secundárias; (2) o monitoramento permanente do conteúdo da
mídia por parte de organismo oficial ou, alternativamente, por um centro
independente ligado à academia, e a publicação regular de relatórios que seriam
encaminhados ao Parlamento para eventuais medidas que assegurem a liberdade e o
pluralismo; (3) a total neutralidade de rede na internet; (4) a provisão de
fundos estatais para o financiamento da mídia alternativa que seja inviável
comercialmente, mas essencial ao pluralismo; (5) a existência de mecanismos que
garantam a identificação dos responsáveis por calúnias e a garantia da resposta
e da retratação de acusações indevidas.
Pelo histórico de feroz
resistência que encontra entre nós, vale o registro uma proposta específica.
Após considerações sobre o reiterado fracasso de agências autorreguladoras, o
relatório propõe:
“Todos os países da
União Europeia deveriam ter conselhos de mídia independentes, cujos membros
tenham origem política e cultural equilibrada, assim como sejam socialmente
diversificados. Esses organismos teriam competência para investigar reclamações
(…), mas também se certificariam de que as organizações de mídia publicaram
seus códigos de conduta e revelaram detalhes sobre propriedade, declarações de
conflito de interesse etc. Os conselhos de mídia devem ter poderes legais, tais
como a imposição de multas, determinar a publicação de justificativas
[apologies] em veículos impressos ou eletrônicos, e cassação do status
jornalístico.”
E no Brasil?
A publicação de mais um
estudo oficial sobre regulamentação da mídia, desta vez pela União Europeia,
menos de dois meses depois do relatório Leveson na Inglaterra, revela que o
tema é pauta obrigatória nas sociedades democráticas e não apenas em vizinhos
latino-americanos como a Argentina, o Uruguai e o Equador, mas, sobretudo, na
Europa.
No Brasil, como se sabe,
“faz-se de conta” que não é bem assim e o tema permanece “esquecido” pelo
governo, além de demonizado publicamente pela grande mídia como ameaça à
liberdade de expressão.
Quem se beneficia com
essa situação? Até quando seguiremos na contramão da história?
* Venício A. de Lima é jornalista e sociólogo, pesquisador visitante no Departamento de Ciência Política da UFMG (2012-2013), professor de Ciência Política e Comunicação da UnB (aposentado) e autor de Política de Comunicações: um Balanço dos Governos Lula (2003-2010), Editora Publisher Brasil, 2012, entre outros livros. Este artigo foi publicado originalmente no Observatório da Imprensa.
Reproduzido
de Observatório da Imprensa
29
jan 2013 via clipping FNDC
Leia também:
"A free and pluralistic media to sustain European democracy" (“Uma mídia livre e pluralista para sustentar a democracia europeia”), clicando aqui.
“EU Publishes Report – “A free and pluralistic media to sustain
European Democracy”, clicando aqui.
"The Leveson Inquiry", clicando aqui.
Comentário de Filosomídia:
“Uma mídia livre e pluralista para sustentar a democracia europeia”? Deus está vendo...
Tsc... tsc...
Comentário de Filosomídia:
“Uma mídia livre e pluralista para sustentar a democracia europeia”? Deus está vendo...
Tsc... tsc...
Nenhum comentário:
Postar um comentário