segunda-feira, 30 de abril de 2012

"O Facebook precisa ficar (...) esperto se não quiser correr o risco de envelhecer rapidamente"...


O pós-Facebook

Luli Radfahrer 
Folha Online
30 abr 2012

Com quase um bilhão de usuários, o Facebook parece inquebrável. Seus números são tão grandes que chegam a se confundir com os da própria Internet. Entrelaçado a praticamente tudo que é social no mundo eletrônico, ele se tornou uma plataforma de interação ampla, usada para fins tão variados quanto publicar fotos, trocar ideias, ler textos ou jogar games cada vez mais complexos. Empresas de todos os tipos usam o cadastro do Facebook como crachá de identificação e todo dia surgem novos produtos e serviços desenvolvidos exclusivamente para ele. Um dos pilares do ambiente digital, é difícil imaginar o futuro sem ele. Não é à toa que a expectativa pela oferta pública de suas ações em Wall Street venha causando tanto furor.

Mas o mundo digital evolui muito rápido, e quem pretende ficar na frente não pode se acomodar se não quiser ser ultrapassado. Até há pouco tempo ninguém imaginava que a Microsoft seria ameaçada em sua hegemonia. Sorrateiramente, o Google foi invadindo o espaço com produtos e serviços integrados, apoiados na nuvem, pois tinha compreendido que o modelo de venda de software estava com os dias contados.

Hoje é importante pensar no que virá depois das mídias sociais. Modelo de comunicação praticamente inexistente há dez anos, hoje essas plataformas de publicação e compartilhamento se tornaram tão populares e influentes a ponto de reconfigurar a visão que se tinha da Internet. Se no final do século passado "estar online" significava ter acesso a bibliotecas do mundo inteiro hoje a experiência é muito mais próxima, informal e restrita. Por mais que redes como o Facebook tenham abrangência global, os grupos de contato e interesse formados nela normalmente consistem de pessoas de uma mesma cidade, bairro, ambiente ou escola, trocando ideias a respeito do que foi publicado por alguns formadores de opinião. Seu uso não é tão diferente do compartilhamento de algo acontecido no jogo de futebol, novela, política, notícia ou publicidade nos papos informais cotidianos.

É curioso perceber que boa parte da interação via redes sociais é muito mais passiva do que a antiga ideia de "surfar" na Internet. Se no século passado a rede era uma experiência dinâmica de descoberta, em que novas opiniões e informações eram descobertos a cada link clicado ou digitado, hoje as redes já vem com a programação pronta. Seu usuário não vê mais uma tela em branco de um browser, aguardando comandos, mas uma lista interminável de conteúdo compartilhado, que raramente traz algo de surpreendente ou desagradável.

No Facebook a web 2.0 foi transformada em um canal personalizado de televisão. A interação, quando há, normalmente é pobre, feita através de ações simples de aprovação e compartilhamento, fácil de se realizar via controle remoto. É bem provável que os novos aparelhos de TV que acessem a Internet sejam utilizados para se assistir a esse grande "canal", com programação ininterrupta, às vezes previsível e repetitiva, entregando para seus telespectadores exatamente aquilo que gostariam de assistir. A evolução digital parece alternar momentos de evolução e retrocesso.

Em um ambiente que se transforma a cada instante, as redes sociais precisam se transformar se pretendem continuar relevantes, como o fez a MTV. Na década de 1980, sua popularidade era incontestável. Junto com a CNN e a ESPN, a MTV revolucionou o formato televisivo ao levar a linguagem do rádio para o vídeo. Seus apresentadores cheios de personalidade entregavam conteúdo ininterrupto, independente das grades de horário, chacoalhando um formato bastante comportado e acomodado. Nos anos oitenta, a experiência de assisti-la era o que havia de mais próximo do que seria mais tarde a Internet, com novas ideias, linguagens e conteúdos o tempo todo. Mas a glória durou pouco.

A Internet (e serviços como o MySpace, iTunes e YouTube) tornaram a ideia de uma TV que lançava artistas uma coisa velha e engessada. O problema não estava na MTV, mas na TV como um todo. Para se manter sintonizada, a emissora precisou mudar de linguagem e de programação, e apanhou um bocado até se transformar em uma emissora que estrutura e populariza novas formas de humor e entretenimento, fazendo uma bela curadoria de conteúdo de tudo que é produzido nas mídias sociais.

O Facebook precisa ficar igualmente esperto se não quiser correr o risco de envelhecer rapidamente. Por mais que ele seja a maior rede do mundo, sua experiência é fria, passiva, simplória. Usuários de videogames, MMORPGs e de outras redes mais intensas até estão nele, mas não conseguem entender como um ambiente tão sem graça cause fascínio. Suas queixas são parecidas com aquelas feitas pelos usuários de Internet sobre a TV na virada do século.

Dentre essas redes, o Club Penguin chama a atenção. Seus usuários são crianças e pré-adolescentes, que não conseguem imaginar uma relação completa sem a ajuda de telas ou botões. A interação ali começa com a definição da própria personalidade e apresentação para o mundo. Como todos ali são pingüins genéricos, as personalidades não são definidas por nomes de família, local de residência ou trabalho. Em uma verdadeira meritocracia, todos começam iguais e só ganham importância conforme sua participação e interação social.

Decorando seus iglus, participando de conversas privadas, vestindo cuidadosamente suas aves-avatares conforme a ocasião e cuidando de seus Puffles para que não fujam, muitos desses habitantes do Século 21 aprendem o que há de interessante (e de deprimente) no mundo adulto à medida que participam de festas, economizam suas moedas e produzem notícias para o jornalzinho local.

Se o Facebook não compreender (e incorporar) essas mudanças, pode perder importância tão rapidamente quanto a ganhou, já que é fácil imaginar essas que hoje são crianças migrando para uma nova rede, mais ativa, estimulante e debatedora, muito mais real, duradoura e interessante do que a passividade do asséptico mundo azul em que só é permitido "curtir" e "compartilhar".

...

Luli Radfahrer é professor-doutor de Comunicação Digital da ECA (Escola de Comunicações e Artes) da USP há 19 anos. Trabalha com internet desde 1994 e já foi diretor de algumas das maiores agências de publicidade do país. Hoje é consultor em inovação digital, com clientes no Brasil, EUA, Europa e Oriente Médio. Mantém o blog www.luli.com.br, em que discute e analisa as principais tendências da tecnologia. Escreve a cada duas semanas no caderno "Tec" e na Folha.com.

Reproduzido de Folha Online

Leia na Super Interessante, "Aplicativo permite postagens pós-morte no Facebook" (13/01/12), clicando aqui.

Os Mervais, Doras e Mirians da vida e o que constitui a opinião pública nacional


Os  Mervais, Doras e Mirians da vida e o que constitui a opinião pública nacional

Educação & Política
Glauco Cortez
30 abril 2012

Opinião pública nem sempre é um conceito fácil de exprimir, visualizar e localizar precisamente. Isso porque há nele algo de abstrato, afinal, qual é de fato a opinião pública brasileira, por exemplo, a opinião que traduz o que pensa a maioria dos brasileiros sobre diversos assuntos?

Sobre isso, um interessante texto de Mino Carta, publicado pela Carta Capital, expõe que nossa opinião pública certamente não seria aquela dos Mervais, Doras e Mirians da vida, referindo-se a Merval Pereira, Dora Kramer e Miriam Leitão. No máximo, eles representam os seus leitores ou aqueles que concordam com o que eles dizem, mas a opinião pública brasileira, para Mino, nem seria aquela que de fato tem contato com a mídia nativa e que, na ocasião de uma eleição, por exemplo, vota sem necessariamente sofrer influência desta última.

Poderíamos discurtir alguns pontos, pensando que a influência dessa mídia é sim expressiva em diversas camadas sociais, no entanto, muitos continuam dedidindo seus destinos políticos quase que por instinto, por uma preferência ou outra, não abalada pelos discursos de Mervais e Mirians…

Mino é preciso ao afirmar o tipo de opinião pública que tais discursos de Mervais e Mirians querem personificar. Justamente o discurso que foi e vai contra as mudanças importantes para o país, quem é adepto da democracia sem povo e de um país de 20 milhões de brasileiros, o discurso mais egocêntrico possível.

Radiografar a opinião pública brasileira é sem dúvida um desafio, mas não é difícil identificar qual é o perfil da opinião pública que responde à mídia nativa e seu “jornalismo onírico” (que faz dos seus sonhos verdade). Sobre este, restam poucas ou nenhuma dúvida.

Veja trecho do texto:

Opinião pública, o que é?

Por Mino Carta

Pergunto aos meus reflexivos botões qual seria no Brasil o significado de opinião pública. Logo garantem que não se chama Merval Pereira, ou Dora Kramer, ou Miriam Leitão. Etc. etc. São inúmeros os jornalistas nativos que falam em nome dela, a qual, no entanto, não deixa de ser misteriosa entidade, ou nem tão misteriosa, segundo os botões.

A questão se reveste de extraordinária complexidade. Até que ponto é pública a opinião de quem lê os editorialões, ou confia nas elucubrações de Veja? Digo, algo representativo do pensamento médio da nação em peso? Ocorre-me recordar Edmar Bacha, quando definia o País -como Belíndia, pouco de Bélgica, muito de Índia. À época, houve quem louvasse a inteligência do economista. Ao revisitá-la hoje, sinto a definição equivocada.

Os nossos privilegiados não se parecem com a maioria dos cidadãos belgas. A Bélgica vale-se da presença de uma burguesia autêntica, culta e naturalmente refinada. Trata-se de tetranetos da Revolução Francesa. Só para ser entendido pelos frequentadores do Shopping Cidade Jardim em São Paulo: não costumam levar garrafas de vinho célebre aos restaurantes, acondicionadas em bolsas de couro relampejante, para ter certeza de uma noite feliz. Até ontem, antes do jantar encharcavam-se em uísque.

Em contrapartida, a minoria indiana, sabe das coisas e leu os livros. Já a maioria, só se parece com a nossa apenas em certos índices de pobreza, relativa ou absoluta. No mais, é infelicitada por conflitos, até hoje insanáveis, étnicos e religiosos. Nada de Bélgica, tampouco de Índia. Nem por isso, a diferença, ainda brutal, existe entre brasileiros ricos e pobres, embora desde o governo Lula tenha aumentado o número de remediados.

Leia o texto completo de Mino Carta na Carta Capital clicando aqui.

Reproduzido de Educação e Política por Glauco Cortez
30 abr 2012

Vidas paralelas: Rupert Murdoch e Roberto Marinho


Vidas paralelas: Rupert Murdoch e Roberto Marinho

Murdoch e Marinho dividiram, acima de tudo, o amor pelo poder, pela influência, pela manipulação – por todas aquelas coisas, enfim, advindas da propriedade de um império de mídia

Paulo Nogueira

Rupert Murdoch e Roberto Marinho têm muito mais que as iniciais em comum. Ambos perderam o pai cedo, uma tragédia pessoal que, paradoxalmente, acabou por empurrá-los vigorosamente na indústria da mídia.

Os dois herdaram, jovens ainda, um jornal, Murdoch em sua Sidney, na Austrália, Marinho no Rio de Janeiro. Isso foi determinante para estabelecer nos dois um amor invencível pelos jornais. Mesmo quando já tinham construído, cada qual do seu jeito, um império de mídia diversificado, o jornal continuaria no centro da atenção dos dois.

A língua foi determinante para estabelecer a maior diferença. O inglês facilitou a Murdoch montar um grupo mundial: da Austrália foi para a Inglaterra, nos anos 1960, e acabaria depois incluindo espetacularmente os Estados Unidos no mapa de seus negócios. Sua News Corp, baseada em Nova York, onde Murdoch mora, é dona de marcas como a Fox e o Wall Street Journal. Roberto Marinho, até por não falar inglês, ficou essencialmente restrito ao Brasil até morrer, em 2003, aos 98 anos. Por isso a influência de Murdoch – ainda vivo e ativo, aos 81 anos — é global, e a de Marinho foi nacional.

Como típicos barões da imprensa, deixaram sempre evidente que a voz de seus jornais e demais mídias era a deles e de mais ninguém. “Se alguém quer saber minhas opiniões, basta ler os editoriais do Sun”, diz Murdoch. Sun é seu tablóide londrino, um campeão de vendas e de controvérsias. Marinho não disse isso, mas nem precisava: estava patente.

Cercaram-se de jornalistas que sabiam que jamais deveriam brilhar tanto a ponto de ofuscar o dono. Quando Murdoch comprou o lendário Times na década de 1960, um passo essencial no seu ganho de poder na Inglaterra, sabia-se que os dias do grande editor Harold Evans no jornal estavam contados. O editor Evandro Carlos de Andrade, que dirigiu o Globo por longos anos e depois o telejornalismo do grupo, fez questão desde o início de deixar claro a Roberto Marinho que era papista. Fazia o que o Papa mandava. Muito mais que o talento, foi esse traço de pragmática servilidade que explicou a duração da carreira de Evandro nas Organizações Globo.

Murdoch e Marinho sempre disseram ter em vista, acima de tudo, o interesse público. Mas jamais deixaram de ser objeto de suspeita de que, fora da retórica, colocaram invariavelmente seu interesse pessoal acima de quaisquer outros.

Em torno deles se construiu a imagem – exagerada — de homens capazes de fazer ou destruir governos. Ninguém acreditou mais nisso que os politicos no Brasil e na Inglaterra, e por isso adularam Murdoch e Marinho para além da abjeção. Buscavam sempre apoio, o que às vezes receberam – acompanhado, quase sempre, de uma merecida dose de desprezo. No código de etiqueta e de poder de Murdoch e Marinho, competiu sempre aos políticos ir atrás deles, e não o inverso.

Lutaram, como todos os barões da imprensa, por estabelecer uma dinastia. As chances de êxito de Murdoch, nisso, são pequenas. Três filhos seus – uma mulher e dois homens – já estiveram na condição de herdeiros aparentes. O último deles, James, 39 anos, renunciou a seu posto depois que sua reputação foi destruída no escândalo das escutas ilegais telefônica de um tablóide do grupo, o News of the World. Murdoch tem dois filhos pequenos de Wendi, sua bonita mulher chinesa, mas é difícil imaginar que Murdoch vá estar vivo quando os dois estiverem em condições de tocar uma empresa.

Roberto Marinho teve mais sorte aí. Seus três filhos, Roberto Irineu, João Roberto e José Roberto, conseguiram até aqui manter o vigor – econômico, pelo menos — da Globo. São discretos, têm noção de suas limitações e, juntos, estabeleceram uma maneira de trabalhar em conjunto com a qual a Globo se manteve competitiva sem Roberto Marinho. Diferentemente do pai, parecem menos interessados em influenciar presidentes e mais focados no negócio em si. Não inovaram, mas já mostraram entender que o futuro é digital e saber que, se a Globo não transferir sua potência para a internet, o declínio é inevitável. Todos os três estão na faixa dos 50 anos, o que significa que a Globo não enfrentará tão cedo um novo teste de troca de geração.

Pessoalmente, Murdoch e Marinho compartilharam uma vaidade que os fez claramente ficar incomodados com algumas características físicas. Murdoch durante boa parte da vida tentou esconder a calvície com um penteado em que fios longos eram estrategicamente dispostos de um lado ao outro da cabeça. Apenas recentemente desistiu do expediente. Roberto Marinho não se orgulhava de sua estatura, ampliada por saltos, e de sua tez mulata, na qual passava pó de arroz.

Em suas vidas paralelas, Murdoch e Marinho dividiram, acima de tudo, o amor pelo poder, pela influência, pela manipulação – por todas aquelas coisas, enfim, advindas da propriedade de um império de mídia.

Reproduzido de Diário do Centro do Mundo (27/04/12) via Brasil 247 (30/04/12)

Leia mais sobre Rupert Murdoch em Filosomídia clicando aqui.

Barões da Mídia fecham acordo contra a CPI


Barões da Mídia fecham acordo contra a CPI

Do 247

Há exatamente uma semana, o 247 revelou com exclusividade que o executivo Fábio Barbosa, presidente do grupo Abril e ex-presidente da Febraban, foi a Brasília com uma missão: impedir a convocação do chefe Roberto Civita pela CPI sobre as atividades de Carlos Cachoeira. Jeitoso e muito querido em Brasília, Barbosa foi bem-sucedido, até agora. Dos mais de 170 requerimentos já apresentados, não constam o nome de Civita nem do jornalista Policarpo Júnior, ponto de ligação entre a revista Veja e o contraventor Carlos Cachoeira. O silêncio do PT em relação ao tema também impressiona.

Surgem, aos poucos, novas informações sobre o engavetamento da chamada “CPI da Veja” ou “CPI da mídia”. João Roberto Marinho, da Globo, fez chegar ao Palácio do Planalto a mensagem de que o governo seria retaliado se fossem convocados jornalistas ou empresários de comunicação. Otávio Frias Filho, da Folha de S. Paulo, também aderiu ao pacto de não agressão. E este grupo já tem até um representante na CPI. Trata-se do deputado Miro Teixeira (PDT-RJ).

Na edição de hoje da Folha, há até uma nota emblemática na coluna Painel, da jornalista Vera Magalhães. Chama-se “Vacina” e diz o que segue abaixo:

“O deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) vai argumentar na CPI, com base no artigo 207 do Código de Processo Penal, que é vedado o depoimento de testemunha que por ofício tenha de manter sigilo, como jornalistas. O PT tenta levar parte da mídia para o foco da investigação”.

O argumento de Miro Teixeira é o de que jornalistas não poderão ser forçados a quebrar o sigilo da fonte, uma garantia constitucional. Ocorre que este sigilo já foi quebrado pelas investigações da Polícia Federal, que revelaram mais de 200 ligações entre Policarpo Júnior e Carlos Cachoeira. Além disso, vários países discutem se o sigilo da fonte pode ser usado como biombo para a proteção de crimes, como a realização de grampos ilegais.

Inglaterra, um país livre

Pessoas que acompanham o caso de perto estão convencidas de que Civita e Policarpo só serão convocados se algum veículo da mídia tradicional decidir publicar detalhes do relacionamento entre Veja e Cachoeira. Avalia-se, nos grandes veículos, que a chamada blogosfera ainda não tem força suficiente para mover a opinião pública e pressionar os parlamentares. Talvez seja verdade, mas, dias atrás, a hashtag #vejabandida se tornou o assunto mais comentado do Twitter no mundo.

Um indício do pacto de não agressão diz respeito à forma como veículos tradicionais de comunicação noticiaram nesta manhã o depoimento de Rupert Murdoch, no parlamento inglês. Sim, Murdoch foi forçado a depor numa CPI na Inglaterra – não na Venezuela – para se explicar sobre a prática de grampos ilegais publicados pelo jornal News of the World. Nenhum jornalista, nem mesmo funcionário de Murdoch, levantou argumentos de um possível cerceamento à liberdade de expressão. Afinal, como todos sabem, a Inglaterra é um país livre.

O Brasil se vê hoje diante de uma encruzilhada: ou opta pela liberdade ou se submete ao coronelismo midiático.

Reproduzido de O Escrevinhador (27/04/12) via Brasil 247

domingo, 29 de abril de 2012

"A boa energia que se irradia do cuidado corrobora na cura"...


Quem cuida do cuidador?

Leonardo Boff
29/04/2012

As primeiras e mais ancestrais cuidadoras são nossas mães e avós que desde o início da humanidade cuidaram de sua prole. Caso contrário, não estaríamos  aqui escrevendo  sobre o cuidado. E lembremos as mães-crecheiras com todo o seu zelo.

Neste contexto queremos mencionar duas figuras, verdadeiros arquétipos do cuidado: o médico suiço Albert Schweitzer (1875-1965) e a enfermeira inglesa Florence Nightingale (1820-1910).

Albert Schweitzer era exímio exegeta bíblico e um dos maiores concertistas de Bach de seu tempo.  Aos trinta anos já com fama em toda a Europa, largou tudo, estudou medicina para, no espírito das benaventuranças de Jesus, cuidar dos mais pobres dos pobres (os hansenianos) em Lambarene no Gabão. Numa de suas cartas  confessa explicitamente: ”o que precisamos não é de missionários que queiram converter os africanos, mas de pessoas dispostas a fazer aos pobres o que deve ser feito, se é que o Sermão da Montanha e as palavras de Jesus possuem algum valor. Minha vida não está nem na arte nem na ciência mas em ser um simples ser humano que no espírito de Jesus faz algo por insignificante que seja”. Foi dos primeiros a ganhar o Prêmio Nobel da Paz.

Por cerca de quarenta anos viveu e trabalhou num hospital por ele construido com o dinheiro de tournés de concertos de Bach. Nas poucas horas vagas, teve tempo para escrever vasta obra centrada na ética do cuidado e do respeito pela vida. Formulou assim seu lema: “a ética é a responsabilidade ilimitada por tudo o que existe e vive”. Numa outra obra  assevera:”a idéia chave do bem consiste em conservar a vida, desenvolvê-la e elevá-la ao mais alto valor; o mal consiste em destruir a vida, prejudicá-la e impedir que se desenvolva plenamente; este é o princípio necessário, universal e absoluto da ética”.

Outro arquétipo do cuidado foi a enfermeira inglesa Florence Nightingale. Humanista e profundamente religiosa, decidiu melhorar os padrões da enfermagem em seu país.

Em 1854 com outras 39 companheiras Florence se deslocou para  campo de guerra na Criméia da Turquia, onde se empregavam bombas de fragmentação que produziam muitos feridos. Aplicando no hospital militar,  a prática do rigoroso cuidado, em seis meses reduziu de 42% para 2% o número de mortos. Esse sucesso granjeou-lhe notoriedade universal.

De volta a seu pais e depois nos EUA, criou uma rede hospitalar que aplicava o cuidado como eixo  norteador da enfermagem e como sua ética natural. Florence Nightingale continua  a ser  uma referência inspiradora.

O operador da saúde é por essência um curador. Cuida dos outros como missão e como opção de vida. Mas quem cuida do cuidador, título de um belo livro do médico Dr. Eugênio Paes Campos (Vozes 2005)?

Partimos do fato de que o ser humano é, por sua natureza e essência, um ser de cuidado. Sente a predisposição de cuidar e a necessidade de ser ele também cuidado. Cuidar e ser cuidado são existenciais (estruturas permanentes) e indissociáveis.


É notório que o cuidar é muito exigente e pode levar o cuidador ao estresse. Especialmente se o cuidado constitui, como deve ser, não um ato esporádico mas uma atitude permanente e consciente. Somos limitados, sujeitos ao cansaço e à vivência de pequenos fracasos e decepções. Sentimo-nos sós. Precisamos ser cuidados, caso contrário, nossa vontade de cuidar se enfraquece. Que fazer então?


Logicamente, cada pessoa precisa enfrentar com sentido de resiliência (saber dar a volta por cima) esta situação dolorosa. Mas esse esforço não substitui o desejo de ser cuidado. É então que a comunidade  do cuidado, os demais operadores de saúde, médicos e o corpo de enfermagem devem entrar em ação.

O enfermeiro ou a enfermeira, o médico e a médica sentem necessidade de serem também cuidados. Precisam se sentir acolhidos e revitalizados, exatamente, como as mães fazem com seus filhos e filhas. Outras vezes sentem necessidade do cuidado como suporte, sustentação e proteção, coisa que o pai proporciona a seus filhos e filhas.

Cria-se então o que o renomado  pediatra  R. Winnicott chamava de “holding”, quer dizer, aquele conjunto de cuidados e fatores de animação que reforçam  o estímulo para continuarem no cuidado para com pacientes.

Quando este espírito de cuidado reina, surgem relações horizontais de confiança e de mútua cooperação, se superam os constrangimentos,  nascidos da necessidade de ser cuidado...

Feliz é o hospital  e mais felizes  são ainda aqueles pacientes que podem contar com um grupo de cuidadores. Já não haverá “prescrevedores” de receitas e aplicadores de fórmulas mas “cuidadores” de vidas enfermas que buscam saúde.

A boa energia que se irradia do cuidado corrobora na cura.

Reproduzido de Leonardo Boff
28 abr 2012

Saiba mais sobre os Terapeutas da Alegria UFSC clicando aqui.

Projeto de extensão da UFSC desde março de 2008, os Terapeutas da Alegria tem como princípio fundamental a utilização da arte e da cultura como ferramentas terapêuticas para minorar o sofrimento das pessoas em hospitais.

Materializa-se por meio da aplicação de técnicas artísticas com o protagonismo do ator-palhaço.

O projeto é aberto a acadêmicos de todas as áreas e pessoas da comunidade. Essas, após dois semestres de preparação e capacitação, recebem um certificado e estão aptos para levar o seu personagem ao ambiente hospitalar e proporcionar momentos de descontração e alegria aos pacientes, seus familiares, acompanhantes e profissionais.

terça-feira, 24 de abril de 2012

Classificação Indicativa: Revistapontocom entrevista Diretora do DEJUS/MJ


Classificação indicativa

Por Marcus Tavares
23 abril de 2012

De novembro de 2010 a março de 2011, o Ministério da Justiça, por meio do Departamento deJustiça, Classificação, Títulos e Qualificação (Dejus), promoveu ampla consulta pública online sobre o processo de classificação indicativa. Na ocasião, o próprio Dejus anunciou que a consulta serviria de base, inclusive, para a elaboração da redação de uma nova Portaria sobre o tema. Dias depois do início da consulta, o Supremo Tribunal Federal (STF) começou a julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 2404), ajuizada pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), contra o dispositivo do Estatuto da Criança e do Adolescente(ECA) – artigo 254 – , que classifica como infração administrativa a transmissão de programa de rádio ou televisão em horário diverso do autorizado pelo governo. O julgamento foi suspenso no dia 30 de novembro. O ministroJoaquim Barbosa fez pedido de vista do processo.

Passados cinco meses, o tema não voltou à pauta do STF. Fato que vem adiando a publicação da nova Portaria, como informa a diretora do Dejus, Fernanda Alves dos Anjos. Em entrevista à revistapontocom, Fernanda, no entanto, garante que nada muda com o novo documento.”Fundamental destacar aqui que mesmo com uma nova Portaria, as bases da política pública da classificação indicativa permanecem as mesmas”, afirma.

Na entrevista que se segue, Fernanda também fala do diálogo entre o Dejus e as emissoras comerciais de tevê e responde aos questionamentos de que a classificação indicativa é um dos empecilhos à produção audiovisual para crianças e adolescentes.

Acompanhe:

revistapontocom – O Dejus promoveu – de novembro de 2010 a março de 2011 – uma ampla consulta pública sobre a classificação indicativa da programação da tevê. Os resultados ainda não foram divulgados. A sociedade tomou conhecimento de alguns retornos, apenas, por meio da imprensa. Na ocasião, foi divulgado pelo Dejus que o resultado da consulta serviria de base para redação de uma nova Portaria de Classificação Indicativa. Por que o resultado ainda não foi divulgado? O que de fato ficou constatado? A consulta foi válida ou não?

Fernanda Anjos - Sim, a consulta foi e é extremamente válida. Os resultados da participação social no debate público online sobre a classificação indicativa (http://culturadigital.br/classind/) foram bastante expressivos: recebemos mais de 60 mil acessos; cerca de 2.200 comentários e sugestões de cidadãos; além de cerca de 20 contribuições de instituições representativas, como o Ministério Público, emissoras de TV, como o SBT, a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), programadores de TV por Assinatura, como a Associação Brasileira deProgramadores de Televisão por Assinatura (APBTA) e a Associação Brasileira deTV por Assinatura (ABTA). O objetivo do debate público foi a atualização da política da classificação indicativa por meio da participação da sociedade. Parte do resultado disso foi o lançamento, no dia 19 de março, da última edição do Guia Prático da Classificação Indicativa (clique aqui e acesso o documento), que deixam mais claros os objetivos, critérios e métodos de análise para se atribuir a classificação indicativa. A nova Portaria, resultado da consulta, já foi construída e está em fase de finalização.

revistapontocom – Mas quando, de fato, a nova Portaria será publicada?

Fernanda Anjos - A nova Portaria já foi construída e está em fase de aprovação. O Ministério da Justiça aguarda a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) acerca da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 2404) que questiona a vinculação horária da programação de TV aberta à classificação indicativa. Isso [este aguardo se dá] para que essa nova regulação se dê de forma integral e perene. Fundamental destacar aqui que mesmo com uma nova Portaria, as bases da política pública da classificação indicativa permanecem as mesmas. No debate público online não houve sugestões de mudanças substanciais, até mesmo porque a classificação indicativa e o trabalho realizado pelo Ministério da Justiça são baseados tanto na Constituição Federal quanto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

revistapontocom – Pode-se dizer, portanto, que a atuação do Dejus está de certa forma aguardando a resolução do STF que ainda julgará a inconstitucionalidade da classificação indicativa, tal como está posta?

Fernanda Anjos - O que está sendo questionado no STF não é constitucionalidade da classificação indicativa. Não há qualquer dúvida de que a classificação indicativa seja constitucional. O que a ADI 2404 questiona é parte do artigo 254 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) que prevê possibilidade de penalização pelo não atendimento da recomendação de horário da classificação indicativa pela TV aberta. A atuação do Dejus independe do julgamento do STF. Qualquer que seja a decisão, o Ministério da Justiça continua com a competência de monitorar a programação de TV, analisar obras audiovisuais e indicar a classificação etária e a respectiva recomendação de horário para sua exibição, no caso da TV aberta. As penalidades do artigo 254 do Estatuto da Criança e do Adolescente (sejam de multa ou suspensão das transmissões, em caso de reincidência da emissora de TV) já não são hoje aplicadas pelo Ministério da Justiça. São medidas determinadas somente por decisão judicial, com ampla possibilidade de contraditório, e o ministério sequer tem o poder de ingressar com essa ação judicial.

Lembrando o caso:

O julgamento de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 2404), ajuizada pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) contra dispositivo do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) que classifica como infração administrativa a transmissão de programa de rádio ou televisão em horário diverso do autorizado pelo governo federal, foi interrompido no dia 30 de novembro de 2011. O ministro Joaquim Barbosa fez pedido de vista do processo. O dispositivo em questão prevê pena de multa e suspensão da programação da emissora por até dois dias, no caso de reincidência (clique aqui e saiba mais sobre o tema).

revistapontocom – De que forma o Dejus, por meio do Ministério da Justiça, está trabalhando internamente para tentar reverter a possibilidade de o STF ser contrário à constitucionalidade do artigo 254 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)?

Fernanda Anjos - Não cabe ao Ministério da Justiça ou a seus departamentos interferir nesta ou em qualquer decisão do STF. O Ministério da Justiça tem recebido manifestações da sociedade, especialmente de históricos defensores dos direitos de crianças e adolescentes, em favor da confirmação da constitucionalidade do artigo 254 do ECA (que é o ponto questionado no STF). É possível que esta manifestação da sociedade ganhe corpo e possa influenciar uma reversão da tendência até aqui manifestada.

revistapontocom – Caso o STF julgue inconstitucional o artigo 254 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que caminho o DEJUS, por meio do Ministério da Justiça, vai seguir? Há alguma saída legal/jurídica para retomar o processo? Qual a orientação que o Dejus vai tomar na perspectiva positiva ou negativa do STF?

Fernanda Anjos – Ao Dejus e ao Ministério da Justiça não cabe questionar uma decisão do Supremo e o trabalho do Departamento permanecerá, seja qual for a decisão do STF. O Ministério da Justiça continuará com a competência de monitorar a programação de TV, analisar obras audiovisuais e indicar a classificação etária, com a respectiva recomendação de horário de exibição e, ainda, informar às autoridades competentes, sempre que verificar o desatendimento destas recomendações.

revistapontocom – Em relação à classificação indicativa, o Ministério da Justiça/ Dejus recebe alguma orientação específica de trabalho do Governo da Presidente Dilma Rouseff?

Fernanda Anjos – Não. A política pública de classificação indicativa já está consolidada, com sua dinâmica de trabalho estabelecida.

revistapontocom – Como anda o diálogo entre o Dejus e os canais de televisão? A incompreensão e as discussões ainda são grandes?

Fernanda Anjos – O Ministério da Justiça tem um bom diálogo com as emissoras de TV. Houve uma grande aproximação desde a realização de oficinas da classificação indicativa, a partir de 2009, e da objetivação dos métodos e critérios da classificação indicativa, consolidados no Guia Prático da Classificação Indicativa (o primeiro lançado em 2009 e o segundo, ainda mais claro e objetivo, lançado em março deste ano). Hoje há critérios e métodos claros para se atribuir a classificação, elaborados com a participação da sociedade. Todo o processo de classificação é público e transparente. Tanto que, no ano de 2011, de cerca de 5.500 filmes, episódios e capítulos autoclassificadas pelas emissoras e posteriormente analisados pelo monitoramento do Ministério da Justiça, resultaram apenas 48 advertências por irregularidades. Isso representa algo inferior a 1%. Também o número de reclassificações (indeferimento da autoclassificação) é inferior a 10%, ou seja, em mais de 90% das vezes há concordância entre emissoras e Ministério da Justiça.

revistapontocom – Canais de TV aberta culpam, em parte, a política de classificação indicativa por inviabilizar a criação/produção de programas voltados para crianças, devido aos critérios utilizados para a classificação. Como o Dejus responde a este questionamento?

Fernanda Anjos - Crianças podem ser influenciadas pelo que experienciam na TV ou em outros meios audiovisuais e, ao longo de seu desenvolvimento, as crianças passam por diferentes estágios de amadurecimento mental e emocional. A exposição a alguns conteúdos audiovisuais como violência, sexo, e uso de drogas (que são os critérios da classificação indicativa), podem, por exemplo, causar medo, imitação, dessensibilização ou naturalização da violência, sexualização precoce e despertar para o uso de drogas. Por isso, é necessário que existam parâmetros claros para agregar esta informação à obra audiovisual. Para que os pais possam fazer a escolha do melhor divertimento para os seus filhos, é preciso informação. E é isso que faz a classificação indicativa: informa. Os pais e responsáveis por crianças e adolescentes – e só eles – é que devem fazer as restrições e proibições. A classificação indicativa certamente representa restrições bem menores à criação e produção de programas do que algumas imposições comerciais, tais como o interesse dos patrocinadores, o merchandising e o apelo dos índices de audiência. O problema e a dificuldade das emissoras não é a produção de programas voltados para criança – aí estão canais como a TV Ra Tim Bum, Futura, e mais alguns da TV por assinatura – que têm programação de qualidade voltada exclusivamente para esse público, mostrando que isso não é impossível ou extremamente difícil. O desafio das grandes emissoras de TV aberta, na realidade é a intenção de fazer programas para todos os públicos. Para atrair o público adulto, a demanda de realismo engloba o trinômio sexo, drogas e violência, que não é conciliável com uma formação saudável de crianças e adolescentes.

Reproduzido de Revistapontocom
23 abr 2012


Para acessa o Guia Prático da Classificação Indicativa e outros documentos do DEJUS/MJ clique aqui.

sexta-feira, 20 de abril de 2012

"um gigante invisível: a literatura para os pequenos é considerada como algo menor"...


O gigante invisível
José Roberto Torero
Carta Maior
18/04/2012

A imprensa brasileira não cumpre a função de fornecer pontos de vista, análises, críticas e referências a partir das quais possamos escolher livros para nossos filhos e formar uma massa crítica em relação a uma área da literatura que é o primeiro passo para a criação do leitor.
Jovial leitora, juvenil leitor, vamos supor que você queira comprar um livro para uma bela criança ou para um espinhento adolescente. Como você o escolheria?
Talvez sua primeira ideia fosse dar uma olhada nos cadernos literários dos grandes jornais e revistas semanais para ver o que há de novo e interessante na área.
Mas seria um trabalho inútil. A grande imprensa não fala de literatura infantojuvenil.
Quereis provas? Dou-vos.
Na Folha de S.Paulo, a Ilustrada de sábado (dia em que o caderno traz mais textos sobre literatura) falava sobre nove livros. Todos adultos. A única menção a obras para crianças e jovens era a lista dos mais vendidos na categoria infanto-juvenil. E na Folhinha, onde às vezes há resenhas de livros, nesta semana não havia nada.
O Estado de S.Paulo não foi muito diferente. Em seu caderno Sabático também falou sobre nove livros. Mas nenhum deles era direcionado para crianças ou jovens. O consolo é que o Estadinho veio com uma página sobre Monteiro Lobato. Porém, o motivo é uma efeméride, os 130 anos do nascimento do autor em 18 de abril.
Quanto às revistas semanais, Veja, Isto é e Época não falaram sobre nenhum livro que não fosse para adultos. Nem unzinho. Pelo menos a Isto é, como a Folha, publicou uma lista dos mais vendidos na categoria.
O aparecimento destas listas em alguns órgãos mostra que a imprensa começa a perceber o valor comercial deste nicho. E não é à toa: 35% do mercado global de livros são dos infantojuvenis. E, segundo dados da Câmara Brasileira do Livro, o número de exemplares de títulos infantis produzidos no país cresceu 87% entre 2005 e 2010, saltando de 14,2 milhões para 26,5 milhões.
Fábio Victor, repórter da Ilustrada dedicado principalmente à cobertura de livros e literatura, acredita em três razões para a ausência de críticas sobre obras para crianças e jovens:
“1) Cadernização: os jornais têm seções para crianças (Folhinha, Estadinho...) e para adolescentes (Folhateen, no caso da Folha), o que pode levar as editorias ‘adultas’ a se desobrigarem de lançamentos voltados para estas faixas etárias”;
“2) Pouco espaço: são centenas de lançamentos de livros adultos todo mês, dos quais dezenas são interessantes, e o espaço que temos para reportagens e resenhas não permite falar nem de um terço do que valeria a pena. Se fôssemos incluir nessa cobertura infanto-juvenis, o alcance seria ainda menor”;
“3) A falta de cobertura do segmento leva, consequentemente, à falta de expertise: entre os repórteres e resenhistas que costumam escrever para os cadernos culturais, há poucos familiarizados com o universo infantojuvenil.”
Os três motivos são reais, mas Dolores Prades, coordenadora da área de literatura para crianças e jovens da revista eletrônica Emília, lembra que “jornais dos Estados Unidos, Espanha e Inglaterra reservam seções regulares para o segmento em seus cadernos literários. Algumas delas com destaques, análises e rankings importantes para os leitores e o mercado.”
E eu acrescentaria mais um motivo: preconceito.
É que a literatura para os pequenos é considerada como algo menor. Sem trocadilho.
O reduzido número de páginas, as ilustrações e a fantasia exuberante fazem com que muitos considerem a literatura infantojuvenil como algo pouco sério.
Porém, talvez nossa literatura infantojuvenil seja, hoje, melhor que a adulta.
Por exemplo, os escritores brasileiros jamais ganharam um Nobel de literatura, mas já venceram duas vezes (com Lygia Bojunga e Ana Maria Machado) o prêmio Hans Christian Andersen, considerado o Nobel da literatura infantil.
Enfim, mesmo que haja boas desculpas, o fato é que a imprensa brasileira não cumpre a função de fornecer pontos de vista, análises, críticas e referências a partir das quais possamos escolher livros para nossos filhos e formar uma massa crítica em relação a uma área da literatura que é o primeiro passo para a criação do leitor.
Sem essa cobertura jornalística, a literatura infantojuvenil será sempre um gigante invisível.
José Roberto Torero é formado em Letras e Jornalismo pela USP, publicou 24 livros, entre eles O Chalaça (Prêmio Jabuti e Livro do ano em 1995), Pequenos Amores (Prêmio Jabuti 2004) e, mais recentemente, O Evangelho de Barrabás. É colunista de futebol na Folha de S.Paulo desde 1998. Escreveu também para o Jornal da Tarde e para a revista Placar. Dirigiu alguns curtas-metragens e o longa Como fazer um filme de amor. É roteirista de cinema e tevê, onde por oito anos escreveu o Retrato Falado.
Reproduzido de Carta Maior


Conheça o blog do "Programa Jornal e Educação" da Associação Nacional de Jornais, com Coordenação Executiva por Cristiane Parente de Sá Barreto, clicando aqui.

terça-feira, 17 de abril de 2012

Internet: restrições e Marco Civil



Internet: restrições e Marco Civil

Sociólogo Sergio Amadeu fala sobre as leis que tentam restringir usos da internet e do projeto Marco Civil que regula o setor no Brasil.




Leia outros textos sobre a questão clicando aquiali e acolá.

“Projeto de lei reproduz no Brasil dispositivos do SOPA americano”, por Luís Osvaldo Grossmann no Convergência Digital (09/03/2012) clicando aqui.

"O Ai-5 digital", na Carta Capital (20/07/2011), também com comentários de Sergio Amadeu sobre o Marco Civil da Internet, clicando aqui.

As redes sociais e os jornalistas


As redes sociais e os jornalistas

Ana Paula Bessa
Observatório Mídia & Política

Uma pesquisa realizada pela PR Oriella Network revelou que muitos jornalistas brasileiros buscam mais informações nas mídias sociais do que nas assessorias de imprensa. Cerca de 66,67% dos entrevistados disseram utilizar o Twitter como fonte de informação. Os outros 40% disseram utilizar o Facebook.

Apesar de a notícia ser positiva para as redes sociais, a pesquisa também mostrou que os jornalistas costumam ter o hábito de confirmar as informações recebidas nessas redes com a assessoria de fontes oficiais, ou até mesmo, com as próprias fontes. Pode-se concluir que, mesmo que os jornalistas acessem com frequência as redes sociais para buscar informações, são as fontes oficiais ou assessorias que ditam a veracidade das informações.

Diante dos números, pode-se perceber que as rotinas das redações de jornais mudaram no que tange à busca de fonte de informações e seu relacionamento com elas. Houve uma ressignificação do campo de atuação do jornalista. O acesso direto a fontes alterou o processo de apuração para a maioria dos jornalistas brasileiros, como mostra a pesquisa. O trabalho de apuração em si não mudou, ainda é necessário analisar as fontes de informações, porém foram acrescentadas novas ferramentas que modificam e reconfiguram a rotina de busca por fontes.

Neste cenário, onde o fluxo de informação é maior e a produção do conteúdo não é feita somente pelo jornal, é cada vez mais pertinente a pergunta que há anos vem sido feita pelos pesquisadores do jornalismo no ciberespaço: toda pessoa é uma fonte de informação, que atende aos critérios de confiabilidade? Com a descentralização da informação há uma inversão no fluxo de notícias que antes eram muito dependentes de fontes oficiais (MACHADO, 2002). Isso não significa que se tenha perdido a preferência pelas fontes oficiais e oficiosas, mas ampliou o leque de informações e o acesso a elas.

O advento das informações produzidas e repercutidas nos sites de redes sociais acabou dando maior acesso a um sem número de fontes espalhadas em todo o mundo. Mas como será o relacionamento do jornalista com esse número de fontes disponíveis nessa rede? Como é feita a seleção das fontes? Usam-se as antigas ferramentas de valores-notícia e escolha de fontes da época do surgimento da teoria construcionista (TRAQUINA, 1999) ou essas redes alteraram o processo de escolha do “gatekeeper”?

As fontes no ciberespaço

A principal ferramenta de trabalho do jornalista é a fonte e tudo o que ela representa para certificar que um ato aconteceu, não aconteceu, está para acontecer ou como ele irá acontecer. Sem o testemunho, as aspas ou a denúncia de sua fonte de informação, o jornalista não tem notícia, não tem trabalho. Com disse Wolf (1999) “as fontes são um fator determinante para a qualidade da informação produzida pelo mass mídia”.

Lembrando os ensinamentos de Traquina (2003) há critérios que são utilizados no jornalismo para avaliar a “fiabilidade da informação”. Sabe-se que se uma informação veio de uma autoridade e se seu cargo for prestigiado, maior é a confiança dos leitores na informação cedida. Esses critérios foram criados numa tentativa de rotinizar o trabalho, sem que haja falhas na notícia divulgada.

No tempo do ciberespaço, algumas dessas rotinas foram modificadas ou até mesmo adequadas (MACHADO 2002). Com a disposição de novas tecnologias para o trabalho dos jornalistas, vieram consequências no que tange a pesquisa de apuração, produção e difusão da informação. No ciberespaço são feitas todas as etapas de produção da notícia, desde a pesquisa e apuração até a circulação. Neste modelo, há uma estrutura mais descentralizada da informação o que acaba multiplicando fontes de informação.

A construção de conexões nos sites de rede sociais tomou proporções mundiais, acarretando um grande leque de informações geradas, publicadas e difundidas neste meio. É neste cenário que o jornalista está inserido atualmente. Há uma porção de informações que atendem grupos sociais distintos com todo o tipo de fonte– desde a menos preparada até grandes especialistas e pesquisadores do assunto – e com o mesmo tempo de deadline disponibilizado há anos atrás na formulação da rotina básica de uma redação de jornal.

Segundo Recuero (2009) há três tipos de relações das redes sociais formadas na Internet com a produção jornalística:

a) as redes sociais como fontes produtoras de informação;
b) redes sociais como filtros de informação;
c) redes sociais como espaços de reverberação dessas informações.

No primeiro tipo, fica claro que o acesso aos sites de redes sociais por pessoas de várias idades e distintos grupos sociais, é capaz de tecer pequenos relatos sobre o seu cotidiano ou acontecimentos importantes do grupo a que pertence que, dependendo da quantidade e qualidade de suas conexões, podem difundir a informação de forma que se chegue a grandes canais formais de veiculação de notícia. Logo, essas redes sociais são grandes produtoras de informação.

Em pesquisa que realizei na editoria “Super Esportes” do jornal Correio Braziliense, principal jornal do Distrito Federal, em 2011, levantei algumas dessas questões para avaliar o quanto as redes sociais alteraram a produção da notícia e o relacionamento com fonte. Adotando métodos de etnografia (CABRERA ET AL 2008) foi realizada entrevista com sete jornalistas da editoria, metade da equipe devido ao rodízio de jornalistas de plantão. Mesmo com equipe reduzida, foi visível o método e a rotina adotados no uso das redes sociais para buscar fontes de informação e como ferramenta de relacionamento com a fonte.

No início da rotina de trabalho, todos os jornalistas acessaram seus perfis pessoais nos sites de redes sociais – preferencialmente Twitter e Facebook – e também os perfis da própria editoria, cuja presença está mais concentra no Twitter. Três profissionais possuíam a opção de carregamento automático desses perfis em seus browsers de navegação. Para esses profissionais, ao acessar o computador e clicar no link de navegação da internet, as redes sociais carregavam automaticamente.

Neste dia de observação, um dos jornalistas teve um problema de comunicação com um ginasta olímpico que não possuía o celular em funcionamento e estava com uma série de problemas para conseguir dar a entrevista. Por sugestão da própria assessoria do atleta, a jornalista adicionou o ginasta no Facebook para uma tentativa de entrevista por meio de mensagem. Em questão de minutos o atleta já havia aceitado a jornalista como “amigo” e logo a entrevista foi feita. Ao passar para o seu editor as circunstâncias em que a entrevista aconteceu, não houve nenhum tipo de retaliação ou repreensão pela prática, muito pelo contrário, o próprio editor chegou a comentar com a jornalista que se a assessora não tivesse sugerido esta opção, ele mesmo o iria fazer.

Após entrevistar os profissionais e observar suas rotinas de trabalho foi possível concluir que há, sim, o uso de redes sociais para buscar fontes de informação, e isso é feito de forma frequente uma ou mais vezes ao dia, de acordo com a demanda de matéria que deve ser entregue no dia. Há também o uso das redes sociais para manter contato e relacionamento com fontes, mas normalmente não são fontes “usuários comuns”, mas atletas, técnicos e produtores de eventos de esportes que, geralmente, conhecem o jornalista pessoalmente e aprecia o trabalho realizado por ele. A busca e o uso de fontes de informação que são de usuários comuns acontecem na editoria, porém são menos constantes.

Também por meio da entrevista e utilizando perguntas referentes ao uso preferencial das redes sociais e não das assessorias de imprensa, todos os sete profissionais responderam que, se há o contato direto da assessoria ou do próprio telefone ou celular do atleta, a apuração é feita desta forma.

Caso não haja conhecimento de fontes, muito menos do contato de cada uma delas, é utilizado sites das redes sociais. Porém, durante a observação não foi esse o comportamento: quatro, dos sete jornalistas, ao receberem uma matéria para apurar, consultavam informações sobre o tema ou a pessoa nas redes sociais, caso houvesse uma fonte em potencial o contato era feito de imediato. Essa dissonância de informação pode ser devida à rotina específica do dia, visto que era feriado e poucas assessorias de imprensa estavam trabalhando normalmente.

Conversando com cada repórter, foi possível compreender que há sim critérios que são utilizados para a seleção de fontes de informação nas redes sociais. Todos os profissionais responderam que os atletas são as fontes privilegiadas, ou seja, todas as informações relevantes postadas por eles possuem credibilidade e não há restrições quanto ao uso dessas fontes nas matérias. Em segundo lugar vêm as organizações como clubes, assessorias, associação e entidades desportivas. Apenas para um jornalista a preferência de informação é para usuários comuns que postam notícias relevantes sobre o esporte local. Este jornalista é responsável pelo blog de basquete e precisa desse tipo de interatividade e relacionamento para postar no blog. Em último lugar, para os seis jornalistas estão os usuários comuns que são usados, mas não com tanta frequência. Dessa forma, podemos concluir que houve a migração dos critérios do jornalismo clássico para o jornalismo feito no ciberespaço e principalmente na utilização dos sites de redes sociais.

Novas fontes velhos critérios?

Este cenário de multiplicação de difusores de informação altera a relação do jornalista com a fonte, visto que quaisquer usuários do ciberespaço e de sites de rede socais podem ser potenciais fontes de informação. Esta mesma multiplicação ajuda os jornalistas a rastrear dados importantes e significativos para a elaboração de matérias, pois tudo o que é postado no ciberespaço e nos sites de redes sociais ficam armazenados. Logo, este novo cenário beneficia a produção jornalista ao mesmo tempo em que complicam o seu trabalho devido ao maior número de informações, podendo prejudicar o tempo de apuração.

Se antes existia uma série de critérios na hora da escolha da fonte, agora não se tem nenhum que diga respeito à escolha dessas fontes nas redes sociais. E é por conta desta falta de critérios que, em alguns casos, passam a valer os antigos critérios nas novas ferramentas de busca de fontes de informação, o que faz com que tornemos à estaca zero. São os velhos métodos em um novo cenário.

Independente deste cenário, ainda pouco estudado e cercado de dúvidas, a rotina de trabalho do jornalista está sendo montada e é preciso documentar como ela está acontecendo e quais são os critérios que tem sido adotado para minimizar as falhas e melhorar a apuração. Realmente hoje qualquer pessoa pode ser fonte potencial para o jornalista, mas as redações ainda não têm confiança nem critérios de escolha que viabilizem o uso dessas fontes em matérias, exceto em casos fortemente repercutidos nesses espaços. Porém, o uso dessas redes sociais na Internet é ainda muito recente e há ainda muito para os jornalistas e suas redações evoluírem com a exploração dessa ferramenta. O que não se pode deixar acontecer é adotar os mesmos critérios e mesmo tipos de relacionamento num cenário completamente mais aberto e flexível que é o ciberespaço. E esta opção parece que está sendo a mais comumente aceita nas redações de jornais.

Referências

CAVRERA et al. “Métodos y técnicas de investigación para el estúdio de la profesión em las rutinas productivas em ciberperiodismo”. In: Metodologia para o Estudo dos Cibermeios: Estado da arte e perspectiva, Org. NOCI, J.G; PALACIOS. Salvador: EDUFBA, 2008.
MACHADO, Elias. O ciberespaço como fonte para os jornalistas. Biblioteca Online de Ciências da Comunicação, Universidade Beira Interior, 2002. Disponível aqui, acesso em: 26/06/2011.
RECUERO, Raquel. “Redes Sociais na Internet, Difusão de Informação e Jornalismo: Elementos para discussão”. In: SOSTER, Demétrio de Azeredo; FIRMINO, Fernando.(Org.). Metamorfoses jornalísticas 2: a reconfiguração da forma. Santa Cruz do Sul: UNISC, 2009.
TRAQUINA, Nelson. 2ª Parte: As Teorias. IN: TRAQUINA, Nelson (org.). Jornalismo: Questões, Teorias e “Estórias”. 2ª Ed. Lisboa: Ed. Vega, 1999.
TRAQUINA, Nelson. O estudo do jornalismo no século XX. São Leopoldo: Ed. Unisinus, 2003.
WOLF, Mauro. Teorias da Comunicação. 5ª Ed. Lisboa: Ed. Editorial Presença, 1999.

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[Ana Paula Bessa é jornalista e trabalha como Consultora em Mídias Sociais no Grupo Máquina da Notícia. Esta pesquisa foi realizada enquanto cursava como aluno-especial a disciplina Jornalismo Digital do Mestrado em Comunicação Social na Universidade de Brasília (UnB)]

Via clipping FNDC