Equador
rebate informe da SIP e defende regulação da mídia no país
Ana
Maria Passos
Opera
Mundi
23/10/2012
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Especialistas
em comunicação equatorianos disseram que o documento reflete apenas interesses
dos empresários
"No dia em que a
SIP (Sociedade Interamericana de Imprensa) me felicitar, aí sim me preocuparei.
Se os cachorros ladram, é sinal de que estamos avançando. Se a SIP questiona,
critica, quer dizer que (...) está sendo inaugurada a verdadeira liberdade de
expressão", disse neste fim de semana o presidente do Equador, Rafael
Correa.
O Equador -- ao lado de
Argentina e Venezuela -- está no “centro das preocupações” da SIP, que realizou
recentemente sua 68ª Assembleia Geral, em São Paulo. Segundo a resolução da entidade,
nesses países os presidentes "encabeçam uma ofensiva para silenciar os
meios independentes".
Uma reportagem veiculada
no programa semanal de prestação de contas de Correa mostrou outra versão para
os casos citados no encontro e apontou inconsistências. O documento menciona,
por exemplo, a morte de três jornalistas no país este ano, mas admite que
apenas uma pode estar relacionada à profissão. Segundo a reportagem, o informe
falha ainda ao não explicar que o caso não tem ligação com o governo.
A SIP disse que uma das
violações mais graves à liberdade de expressão no Equador foi uma ação judicial
contra quatro observadores da investigação sobre contratos ilegais firmados
entre o irmão do presidente, Fabrício Correa, e o governo. Eles foram
processados por falso testemunho ao concluírem que o presidente sabia dos
negócios do irmão. A Presidência reiterou que os observadores “fizeram um
relatório baseado em falsidades”.
Para a deputada Maria
Augusta Calle, do mesmo partido do presidente, o motivo do embate entre governo
e meios privados reside em uma concepção diferente de comunicação social.
"O problema fundamental para a SIP não é a liberdade de expressão. O
problema é que o governo equatoriano e as leis equatorianas consideram a
comunicação um serviço público e que os meios têm que trabalhar em função dos
direitos da maioria e não de uns poucos", afirmou a Opera Mundi.
Maria Augusta sustenta
ainda que o informe cita ameaças a jornalistas de meios privados, mas omite a
ofensiva contra meios públicos e estatais, que segundo a parlamentar, também
enfrentam processos e são muitas vezes impedidos de participar de entrevistas
coletivas organizadas pelos opositores do governo.
Quanto às ações na Justiça
que o governo move contra jornalistas e meios privados, Maria Augusta avaliou
que é necessário entender que, no Equador, é proibido atentar contra a
dignidade e a honra. "Qualquer pessoa pode expressar o que queira, mas tem
que expressar com respeito", lembrou.
Liberdade
de expressão
O informe da SIP sobre o
Equador afirma que no país "não existe plena liberdade de expressão e de
informação" e que "todos os poderes do Estado estão tomando decisões
que a deterioram."
O professor da Faculdade
de Comunicação da Universidade Andina Simon Bolívar, Hernan Reyes, classificou
como enganoso o ponto de partida do documento. "A pergunta é: "existe
plena liberdade de expressão -- e eu destaco a palavra plena --, em algum país
dos que formam ou dos que são avaliados pela SIP? Existe nos Estados Unidos
plena liberdade de expressão? No Chile?", questionou. "Nesses países
o que poderia eventualmente existir são sistemas de menor regulação da imprensa
privada e do funcionamento do mercado para o livre fluxo de informação. Nada
mais."
O professor acredita a
plena liberdade de expressão e informação é um horizonte que se busca. “Depois
de analisar uma série de fatores, é possível determinar, na forma de uma
escala, quanta liberdade de expressão, de informação, de opinião ou de imprensa
existe em cada país. Esse é um exame que a SIP não faz e creio que a maior
parte do informe, no caso do Equador, está baseada em suposições, em uma série
de mitos”, salientou a Opera Mundi.
Regulação
da mídia
Para Reyes, o verdadeiro
motivo do protesto dos meios privados não é a liberdade de expressão, mas o
fato de que o governo equatoriano limitou o alcance da propriedade midiática.
Correa aprovou leis que impedem os bancos de terem empresas de comunicação e
proíbem que os donos dos meios de comunicação tenham negócios em outras áreas.
Além disso, foram
criados meios públicos, que reduzem a penetração dos veículos privados.
"Isso é o miolo do assunto. Parece que a reação tão visceral, crescente e
permanente por parte desses meios privados, em conjunto com os políticos de
oposição, é porque os bolsos estão sendo afetados", defendeu.
Outro aspecto da reação
da SIP, para o professor, é que a credibilidade dos meios vem sendo afetada
pelo confronto com o governo. Em redes nacionais obrigatórias e no programa
semanal de televisão, o presidente contesta as reportagens negativas veiculadas
na imprensa.
Nesse ponto Reyes faz
críticas ao governo, que construiu um "aparato enorme de vigilância e
monitoramento. Por um lado “é útil porque revela uma quantidade de falhas e
distorções que cometem os meios de comunicação”, mas por outro "é
indevidamente centralizado num aparato estatal”. Para o professor, os cidadãos
deveriam ser convidados a participar de observatórios de imprensa.
Reyes também discordou
do “tom de virulência verbal” de Correa contra determinados meios privados e
jornalistas. “Parecem excessivos certos gestos, como o de rasgar publicamente
um jornal numa transmissão de prestação de contas aos sábados”, disse.
O professor observou
ainda que apesar de certos avanços, como páginas de órgãos públicos na
internet, ainda “há muito descumprimento por parte de autoridades não só desse
governo, de todos os governos anteriores, do (direito ao) acesso que tem todo
cidadão à informação."
Recentemente o presidente
decidiu que vai responder apenas aos pedidos de informação de parlamentares que
forem enviados por meio do presidente da Assembleia Nacional. A medida é
considerada pela SIP como mais uma restrição.
Fernando Checa, diretor
do Centro Internacional de Estudos Superiores para a América Latina (Ciespal)
afirmou que a lei de acesso à informação pública não é cumprida cabalmente nas
instituições do Estado. "Mas isso acontece em todas as partes do
mundo", contemporizou. Para Checa, não se trata de uma evidência de que a
liberdade de expressão está ameaçada no Equador, como faz parecer o informe.
O diretor do Ciespal
também considera um erro a proibição do presidente de que ministros deem
entrevistas a canais privados considerados "mercantilistas" por Correa.
“Mas isso ameaça a liberdade de expressão? Não, porque esses funcionários estão
dando declarações a outros meios. Por outro lado, os meios privados que
reclamam disso são plurais? Não, porque há restrições também, não há
pluralidade de vozes. Eles não gostam que o presidente proíba os funcionários
do Estado falar, mas não que hajam listas negras nas redações, que certas
pessoas sejam vetadas.”
Para o diretor do
Ciespal, o informe esconde alguns atores que ameaçam a liberdade de expressão:
“diretores, donos de meios de comunicação e anunciantes, que pressionam,
limitam, fazem censura e promovem a autocensura.”
Não há elementos para
afirmar que a liberdade de expressão está se deteriorando, defendeu Checa a
Opera Mundi. "No Equador todo mundo pode dizer qualquer coisa. É uma
questão de ver a imprensa privada, por exemplo. Há duríssimas críticas, às
vezes, inclusive grosseiras não só contra o presidente, mas contra os
funcionários do Estado e parlamentares, com absoluta liberdade.”
E conclui: “Sou contra a
penalização da opinião. A liberdade de expressão é um direito universal e não
só de jornalistas e meios. Mas também é uma obrigação. A obrigação de assumir
esse direito com responsabilidade."
Reproduzido
de Opera
Mundi
23
out 2012
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