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terça-feira, 10 de março de 2015

O estranho mundo dos midiotas


O estranho mundo dos midiotas

Por Luciano Martins Costa em 06/03/2015 na edição 840
Comentário para o programa radiofônico do Observatório, 6/3/2015

Se você lê jornais e assiste ao noticiário televisivo, e além disso leva em conta os comentários dos especialistas em generalidades que proliferam nas emissoras de rádio e acompanha sofregamente tudo que circula nas redes sociais digitais, pode estar certo de que você está incurso no arco de seres humanos que estão sendo estudados pelos especialistas em comunicação de algumas das melhores universidades do mundo. Esse espectro vai do indivíduo profundamente elaborado, que é capaz de filosofar sobre o mundo midiatizado, ao perfeito midiota.

O contexto teórico considerado por esses estudiosos tem como objeto o que em língua inglesa se chama “media literacy” e que, em português, é chamado, principalmente no núcleo de estudos específicos da Universidade de São Paulo, como Educomunicação. Trata, como se pode depreender, de uma educação especial que habilita o indivíduo a entender o conteúdo da mídia e formular sua própria opinião a respeito dos assuntos abordados. O pressuposto de tal disciplina é que a mídia tem uma função social que vai muito além da tecnologia e dos recursos financeiros usados para fazer com que aconteça a comunicação.

O professor Thomas Bauer, responsável pela cadeira de Cultura da Mídia e Educação pela Mídia na Universidade de Viena, observa que essa função dos meios deve extrapolar o conceito de troca de informações passando por um filtro (mediação), para o propósito de contribuir para a construção de uma ordem social baseada na diversidade. Além de balizar a organização da ordem social, juntamente com outras instituições e entidades formais ou informais, a mídia deve participar das negociações entre os indivíduos, isoladamente ou em grupos, e entre si, para que se obtenha uma sociedade sustentável.

Uma proposta de educação que considere o papel da mídia como tal deve, segundo Bauer, apontar para a conquista da competência de distinção do significado de diferentes situações, em termos de ética, estética e benefício potencial. Numa circunstância ideal, a sociedade sustentável conta com pessoas capazes e responsáveis pelo uso da mídia como meio de comunicação e conexão social, e não apenas como clientes a serem convencidos disto ou daquilo.

Uns e outros

Como no “vidiota” do romance de Jerzy Kosinski que inspirou o filme intitulado Muito além do jardim, a intensa exposição à mídia, sem o contraponto do senso crítico, pode ser uma prática perigosa. O indivíduo habilitado para interpretar a narrativa e o discurso propostos pela mídia nesse papel é também capaz de questionar o sentido que a mídia propõe para os acontecimentos do cotidiano.

Um grande contingente de cidadãos em condições de distinguir os vários significados das situações que a imprensa lhes apresenta será mais senhor de seu destino e se tornará menos vulnerável a discursos manipuladores e demagógicos.

O dilema está no fato de que esse benefício depende em grande parte de uma determinação da mídia hegemônica de usar seus recursos eticamente e com grande empenho estético. O problema se complica quando a própria imprensa faz escolhas contrárias à ética, esteticamente inadequadas e fora do propósito do bem, com o objetivo de usar a conectividade social que lhe é atribuída para arregimentar adeptos a um modo de vida simbólico que contraria o interesse coletivo.

Claro que tudo isso pressupõe a existência de interesses coletivos em meio a idiossincrasias individuais, mas o problema se resolve com a observação segundo a qual a sociedade se forma por meio da comunicação, produtora de sentido – portanto, criadora de cultura.

Uma maneira simples de avaliar se determinado meio contribui para este ou aquele tipo de sociedade é observar se suas mensagens estimulam, por exemplo, uma cultura de paz ou a violência; se propõe uma visão tolerante das diferenças ou se investe no confronto.

É da modernidade supor que o indivíduo se torna responsável por suas escolhas, ou, em outra acepção, no uso de suas vontades fortes ou fracas. Portanto, parte da responsabilidade pelo que se processa no ecossistema midiático compete à mídia, mas o arbítrio ainda é do cidadão.

Quando dizemos que “você nunca mais vai ler jornal do mesmo jeito”, estamos apostando que, exercitando a observação crítica da imprensa, o indivíduo se educa para a mídia. Essa distinção de habilidades é o que faz, de uns, midialiteratos e, de outros, no ponto extremo do que acreditam em tudo que leem, midiotas.

06 mar 2015

Comentário de Filosomídia:

E,  pelas telinhas do mundo e no Brasil da globobocalização, postam-se os vidiotas...

sábado, 6 de dezembro de 2014

O novo sistema de poder


O novo sistema de poder

O Facebook não tem obrigação de revelar como manipula o sistema de notícias e tem se tornado um novo sistema de poder sem controle social.

Luciano Martins Costa

Observatório da Imprensa

As empresas de jornalismo estão perdendo o controle do que é notícia. O domínio de empresas de tecnologia na produção e distribuição de conteúdo informativo e opinativo está criando uma nova esfera pública, cujos controladores não estão especialmente preocupados com transparência e ética.


Esse é o tema de publicações recentes sobre a maneira como a mídia tradicional ajuda, por omissão, a consolidar no mundo contemporâneo o poder quase absoluto dos tecnólogos que inundam o planeta com uma enxurrada ininterrupta de aplicativos cujas possibilidades as pessoas desconhecem. Uma das análises mais interessantes é feita por Emily Bell, diretora do Centro Tow de Jornalismo Digital, instituto de pesquisas da Escola de Jornalismo da Universidade Columbia, e foi considerada pelo Fórum Mundial de Editores como o mais importante texto sobre o futuro do jornalismo divulgado neste ano (ver aqui, em inglês, a versão editada para o Instituto Reuters, de Oxford, publicada na terça-feira, 2/12). Sua principal qualidade está em marcar o esvaziamento do poder do jornalismo em definir sua própria natureza.

Emily Bell observa que as principais decisões que impactam o espaço público da comunicação estão sendo tomadas por engenheiros que raramente pensam em jornalismo, em impacto social da informação ou na responsabilidade sobre como notícias são geradas e disseminadas. “Jornalismo e liberdade de expressão se agregaram como parte de uma esfera comercial onde as atividades de notícias e jornalismo se tornaram marginais”, alerta a pesquisadora.

Apontada como responsável pelo renascimento do grupo britânico Guardian, do qual foi diretora de conteúdo digital, ela lembra também que nenhuma das principais iniciativas tecnológicas que dominam o serviço de relacionamentos e interações entre pessoas foi criado ou pertence a empresas jornalísticas.

Como as plataformas de mediação social não estão interessadas em contratar jornalistas ou criar estruturas para a tomada de “decisões editoriais”, atividade altamente complexa e custosa – conclui –, o espaço público fica à mercê dos interesses do mercado de tecnologia.

Onde mora o perigo

Emily Bell comenta que o Facebook usa um conjunto de complicadas fórmulas para decidir como as notícias vão para o alto das páginas pessoais dos usuários; esses mecanismos não apenas determinam o que o indivíduo vai ver, mas também definem, pela constância do uso, o modelo de negócio das plataformas sociais. Esses algoritmos são secretos, não são alcançados pelas regulações que asseguram as liberdades básicas inerentes ao direito à livre informação e à privacidade e, pior, podem ser alterados sem aviso prévio.

A diretora do Centro Tow lembra que nenhuma outra plataforma na história do jornalismo criou tal concentração de poder, o que faz do jovem Gregory Marra um dos mais poderosos executivos do mundo. Ele é diretor de produto do sistema de notícias do Facebook e tem apenas 26 anos de idade. Recentemente, Marra repetiu no New York Times o refrão dos tecnólogos segundo o qual a tecnologia é neutra, porque não faz julgamento editorial sobre o conteúdo postado nas redes sociais. Pois é justamente aí que mora o perigo, diz Emily Bell.

Ainda que os engenheiros acreditem que não estão tomando decisões editoriais, é isso que fazem suas fórmulas matemáticas. Por exemplo, ela lembra, em junho deste ano pesquisadores registraram que o Facebook manipulou as fontes de notícias de 700 mil usuários para observar como diferentes tipos de informação poderiam afetar o humor das pessoas. A resposta: boas notícias deixas as pessoas mais felizes. A questão dos pesquisadores: como o Facebook ousa brincar, literalmente, com as emoções das pessoas?

Em 2010, a rede social fez outra experiência, para verificar como a inserção de notícias sobre eleição estimula pessoas a votar no sistema americano de voto facultativo. Um professor de Harvard pondera que o mesmo recurso pode convencer milhões de eleitores, por exemplo, a escolher determinado candidato.

Emily Bell conclui o artigo alertando que o Facebook não tem obrigação de revelar como manipula o sistema de notícias. Ela afirma também que a imprensa tradicional deveria parar de se deslumbrar com as filas para comprar o novo iPhone e olhar mais para a tecnologia como um novo sistema de poder sem controle social.

Reproduzido de Carta Maior . Via Conversa Afiada

03 de 2014

quinta-feira, 31 de maio de 2012

Os desafios do mercado de mídia brasileiro


Os desafios do mercado de mídia brasileiro

Luciano Martins Costa
30/05/2012 na edição 696

Nesta sexta-feira, 1º de junho, comemora-se o Dia da Imprensa. Em meio a desafios provocados por suas próprias decisões no cenário de grandes rupturas tecnológicas e importantes mudanças na sociedade brasileira, as empresas nacionais de comunicação enfrentam dificuldades para alcançar o desempenho registrado nos últimos anos por outros setores da economia.

As projeções dos profissionais de mídia para 2016 indicam que o mercado brasileiro do setor deve crescer R$ 10 bilhões a menos do que o previsto. Em março deste ano, a Associação Brasileira das Agências de Publicidade havia anunciado que o mercado apresentaria um salto para R$ 80 bilhões nos próximos quatro anos. Nesta quarta-feira, 30, revela-se que o valor será de R$ 70 bilhões.

Há apenas dois meses, esperava-se para 2012 um faturamento de R$ 39,9 bilhões, que, com um crescimento inédito estimulado pelos grandes eventos esportivos programados para 2014 e 2016, chegaria a dobrar nesse período. No entanto, segundo lembra a publicação especializada Adnews, o investimento das empresas em publicidade ficará em R$ 30 bilhões neste ano e já se constata uma previsão de crescimento mais modesta. Alguns fatores indicam que a Copa do Mundo e as Olimpíadas do Rio de Janeiro não irão produzir o milagre da multiplicação de anúncios que se esperava.

As informações citadas pela Adnews foram retiradas do Mídia Dados 2012, lançado terça-feira durante o 5º Congresso Brasileiro da Indústria da Comunicação, realizado em São Paulo entre os dias 28 e 30. O anuário do setor, que neste ano sai em um calhamaço de mais de 850 páginas, acompanha a evolução do mercado publicitário desde 1998, e permite observar o desenvolvimento do negócio que representa a principal fonte de receita das empresas de comunicação. Embora essa análise exija muita dedicação e tempo, um olhar sobre os gráficos revela que as chamadas mídias tradicionais estão travadas, muito provavelmente por causa de questionamentos em relação ao custo, diante da ampla oferta de meios representada pela tecnologia digital.

Como diz uma das profissionais entrevistadas para o Mídia Dados: “Mídia é dinheiro. A chance de um cliente questionar determinada ação é grande – e você precisa ter todos os argumentos, os técnicos, os estratégicos, os criativos”.

O lugar do lugar comum

A questão das escolhas sobre onde vai o dinheiro da comunicação das empresas anunciantes torna-se central num cenário que se mostra progressivamente mais diversificado e, portanto, mais competitivo. Como em todas as circunstâncias de mudança, aquilo que já está estabelecido precisa constantemente confrontar o novo. E, no caso da mídia, a tradição está com jornais, revistas e TV aberta. O rádio, que se caracteriza como um meio “líquido”, no conceito desenvolvido pelo sociólogo polonês Zygmunt Bauman, transita com mais facilidade pelas mudanças tecnológicas e de costumes.

O problema da transição presente é que as novas tecnologias provocam, pela primeira vez desde o surgimento da imprensa – forma primária de publicização –, o questionamento do próprio conceito de mediação. Como se pode observar em algumas das entrevistas apresentadas no anuário Mídia Dados, muitas empresas estão retomando para seus quadros o controle estratégico da decisão sobre onde colocar o dinheiro da comunicação.

Percebe-se uma tendência em agregar as funções antes destinadas separadamente à publicidade, marketing e aquilo que se convenciona chamar comunicação corporativa, ou relações com a imprensa. O alto custo da mídia faz com que muitas organizações estejam repensando seus investimentos em publicidade tradicional e passem a avaliar o potencial das mídias digitais.

Nesse sentido, hipoteticamente, alguns meios tradicionais como jornais e revistas poderiam se apresentar como elementos de ancoragem das mensagens institucionais, usando o prestígio de suas marcas para propor ações combinadas entre campanhas publicitárias do tipo tradicional e interações diretas com o público, através das redes sociais da internet.

Mas, para isso, as empresas de comunicação jornalística precisariam estar dispostas a abrir mão de seu discurso centralizador e verticalizado, o que exigiria mudanças na configuração das redações, em processos decisórios e até mesmo na linguagem. Além disso, é preciso, como sempre, surpreender o público. Mas, presos a modelos conservadores, os meios tradicionais de comunicação se tornaram o lugar do lugar comum.

30 mai 2012

segunda-feira, 14 de maio de 2012

O risco da obsessão pela audiência


O risco da obsessão pela audiência

Luciano Martins Costa
Observatório da Imprensa
14/05/2012

O leitor de jornais pela internet pode notar que há alguma mudança nos títulos de reportagens e blogs, com textos mais chamativos e uma evidente predileção em usar expressões ambíguas. Também se pode observar que na maioria dos sites jornalísticos aumentou o espaço destinado a fofocas sobre celebridades, que agora aparecem misturadas a notícias sobre os acontecimentos urbanos e mais próximas do noticiário sobre futebol. Por outro lado, os jornais passaram a prestar mais atenção aos assuntos que surgem nas redes sociais digitais, o que pode dar a impressão de mais agilidade.

O motivo para essas mudanças mais ou menos sutis, que podem ser notadas nas últimas semanas, pode não ter relação direta com jornalismo, mas com um debate em curso em outro campo da comunicação – o da publicidade.

Discute-se mais precisamente o valor das métricas de audiência na internet e especialmente nas redes sociais. A questão está presente em eventos internacionais sobre mídia, nos quais alguns anunciantes questionam o preço cobrado por estratégias integradas que procuram manter o valor das mídias tradicionais e acrescentar o custo das ações nas novas redes digitais.

Supostamente, quando um produto é exposto ao mesmo tempo na televisão, em anúncios estáticos nos jornais e revistas e percorrem ações nas redes sociais digitais, sua exibição deverá ser notada por mais pessoas e, portanto, essa estratégia haverá de produzir mais resultados.

Como produzir receitas?

Acontece que essa visão linear, muito utilizada nos tempos da mídia unívoca, na qual o receptor tinha menos condições de interagir com a mensagem, não pode ser simplesmente replicada no ambiente hipermediado no qual o antigo leitor ou telespectador há muito deixou de ser um receptor passivo.

O que alguns anunciantes estão contestando é a garantia de resultado versus o preço cobrado.

Todo processo de comunicação precisa levar em conta que a disputa é pelo tempo e pela qualidade da atenção do sujeito que se quer alcançar. E se, atualmente, um número crescente de pessoas costuma colocar sua atenção simultaneamente em duas ou mais mídias, qual é o valor de cada uma delas?

Além disso, questiona-se a própria métrica, uma vez que as mensurações meramente demográficas, que informam quantas pessoas são expostas a determinados conteúdos, não asseguram com que disposição ou humor as mensagens estão sendo recebidas.

Eventualmente, uma campanha pode saturar o público e, em determinado momento, provocar uma reversão na intenção da mensagem, passando a produzir reações negativas capazes de se propagar instantaneamente pelas redes digitais.

As estratégias tradicionais de bombardeamento podem, portanto, gerar um efeito desastroso, se milhões de indivíduos ativos nas redes resolverem questionar algum aspecto da mensagem e se colocarem em posição antagônica com relação à proposta da comunicação.

Mas esse é um problema de quem produz publicidade ou ações de marketing. O que pode afetar a mídia jornalística é o engajamento do campo editorial nesse esforço para produzir receita nas versões digitais das empresas tradicionais.

Alhos e bugalhos

A busca incessante por audiência por parte das empresas pode alterar o conceito de valor da informação jornalística?

Esse é um risco permanente, uma vez que essas empresas precisam continuar se apresentando ao mercado como portadoras de relações valiosas com seus públicos. E sempre haverá os consultores “criativos” com ideias mirabolantes sobre o empacotamento do conteúdo noticioso em formatos mais atraentes e, portanto, mais interessantes para o anunciante.

Certas ações no ambiente digital lembram as edições de domingo dos diários, ainda muito comuns, nas quais uma capa publicitária produz um simulacro de jornal, com a intenção de chamar a atenção do leitor para determinado produto ou marca.

No jornal de papel, a consequência é o eventual aborrecimento de ter que separar a capa falsa para ter acesso ao conteúdo que interessa. Mas no caso das mídias digitais, um aborrecimento eventual pode se transformar em antipatia renovada. E uma antipatia nas redes sociais digitais pode produzir um desastre em termos de imagem e reputação.

A mídia jornalística precisa encontrar meios de se valorizar no ambiente da internet, mas pode ser perigoso fazer isso à custa da banalização do conteúdo, como ocorre quando se misturam questões de interesse variado como desafios da vida urbana e fofocas sobre celebridades.

Se há uma velha lição que ainda vale para o jornalismo é: não misturar alhos com bugalhos.

14/05/2012 na edição 693
Via Clipping FNDC

quarta-feira, 15 de junho de 2011

A mídia como freio social


A mídia como freio social

Na semana passada, durante debate na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, estudantes questionavam por que razão a imprensa tradicional funciona como um freio na sociedade, embora se esforce por parecer moderna e vanguardista.

Os participantes do evento não avançaram na discussão, mas o tema merece alguma reflexão.

De fato, se observarmos os movimentos sociais, iremos constatar que, de modo geral, a imprensa, como instituição, não atua de modo constante como força mobilizadora de mudanças. Quase sempre faz conjunto com as forças mais conservadoras da sociedade.

Há exceções, condizentes com os papéis que assume este ou aquele veículo de comunicação, principalmente no temas comportamentais ou mundanos.

Mas, no que se refere aos assuntos centrais do noticiário, como a política e a economia, pode-se perceber que a primeira resposta de jornais, revistas e meios eletrônicos associados às empresas dominantes de comunicação é sempre a mais conservadora.

Continuidade

Mesmo quando algum evento extremo ou escandaloso evidencia a necessidade de reformas, por exemplo, a imprensa se omite no aprofundamento dos debates e deixa esfriar o ânimo da mudança. Nesse sentido, pode-se alinhar uma série de acontecimentos que nunca merecem continuidade ou destaque no noticiário.

Por exemplo, as propostas legislativas de iniciativa popular, as consultas públicas e outras formas de suprir deficiências do sistema representativo são apenas pontualmente noticiadas mas nunca merecem o tratamento de alternativas válidas para as omissões do Parlamento.

Da mesma forma, os crimes na fronteira agrícola da Amazônia saem nos jornais mas logo desaparecem e nunca se discute o conflito agrário e as possíveis relações entre mandantes de assassinatos.

Instituição a serviço da imobilidade

Mesmo que rotineiramente se dedique a expor as mazelas do sistema, a imprensa se nega a colocar em debate público a possibilidade de mudanças estruturais, ainda que cabíveis no regime democrático e republicano.

Uma das causas pode ser o fato de que a mídia, em sua natureza, seleciona e oferece padrões, dita modas e modos, incorporando novos comportamentos às estruturas sociais e culturais já consolidadas, domesticando a novidade para que caiba nos padrões convencionais. Trata-se de uma instituição a serviço da imobilidade, ou de uma mobilidade relativa e sempre sob controle.

Como todas as instituições que fiscaliza e critica, a mídia tem ojeriza a rupturas. Por essa razão, é vista mais como freio do que como acelerador de mudanças na sociedade.

Por Luciano Martins Costa em 14/06/2011 na edição 646
Comentário para o programa radiofônico do OI, 14/6/2011

Reproduzido do Observatório da Imprensa

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Cobertura jornalística de tragédias vs. Publicidade para criminosos vs. Manifestações de leitores e telespectadores


COBRINDO TRAGÉDIAS

Publicidade para criminosos

Por Luciano Martins Costa em 15/4/2011

Comentário para o programa radiofônico do OI, 15/4/2011

A imprensa de modo geral deu publicidade a manifestações antissociais que pipocam desde o início desta semana em comunidades da internet, relacionadas ao assassinato coletivo ocorrido numa escola do Rio de Janeiro.

Do Cratonotícias, no Ceará, à redação da Folha Online, em São Paulo, editores decidem que é bom jornalismo dar repercussão a criminosos que se expressam no anonimato da rede.

Desde pelo menos o dia 10 deste mês, portanto apenas três dias após o massacre que deixou 12 crianças mortas, tais notícias se reproduzem na internet, para glorificação de seus autores.

Na quinta-feira, dia 14, quando se completava uma semana do crime hediondo, as manifestações de desequilibrados em apoio ao assassino ganharam espaço em sites de grande reputação.

Ainda que os textos, de modo geral, condenem liminarmente tais manifestações, informando que a polícia especializada está investigando sua autoria, a questão permanece: a imprensa, seja através de seus sites, blogs, seus diários de papel ou revistas semanais, deve dar platéia a esses indivíduos?

Delicadeza e bom senso

Há muito se discute o que deve fazer o jornalista diante de pessoas ou grupos que têm comportamentos claramente patológicos associados à necessidade de publicidade.

Aprende-se nas escolas de jornalismo que notícias sobre suicídio, quando publicadas com destaque, podem estimular ações semelhantes.

Da mesma forma que não se deve divulgar nomes completos de crianças e adolescentes quando envolvidos em episódios degradantes, também é ponto comum ao bom jornalismo que não se reproduz o nome de vítimas de ações deletérias quando a notícia, em si, representa um agravamento da injúria.

Os casos de estupro, por exemplo, exigem extrema delicadeza por parte dos jornalistas.

No caso desse episódio que ainda choca a opinião pública, a publicação do nome do criminoso não poderia estimular outras mentes doentias a repetir o gesto insano? Não seria o caso de um pacto entre os jornalistas para omitir, daqui para a frente, o nome ignominioso?

Esse é um assunto para reflexões cuidadosas nas redações e nas diretorias das empresas de comunicação.

Reproduzido do Observatório da Imprensa

Leia também no Blog "Notícias da TV brasileira": "Fantástico e Domingo Espetacular perdem a mão ao disputar detalhes escrabosos da chacina", e outros textos  clicando aqui.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

A pressa que desinforma


"A rapidez com que "envelhecem" as revistas semanais de informação é um dos sintomas de como os novos meios, reestruturados pelas redes sociais virtuais, afetam o jornalismo tradicional. Observe-se, por exemplo, como, já na segunda-feira desta semana, as reportagens publicadas nas revistas brasileiras sobre a revolução contra a ditadura no Egito pareciam superadas em relação ao que traziam os jornais.

O fenômeno ainda merece estudos mais aprofundados, mas é de se questionar que recursos precisarão inventar as publicações de periodicidade semanal para manter a atenção de seus leitores diante da dinâmica dos fatos.

Já se disse, nos anos 1990, quando começou a era da Internet, que jornais e revistas seriam obrigados a oferecer mais reflexão do que informação, mas não se pode afirmar que a profusão de colunas, artigos e outros penduricalhos esteja ajudando o leitor a entender melhor o contexto do noticiário. Persiste ainda, nos meios impressos, certa afobação em definir e explicar os acontecimentos, quando na verdade talvez esteja em curso a valorização gradual e segura do significado em lugar do opiniário puro e simples.

(...) As notícias de um retrocesso não combinavam com o relato do "front", transmitido dos telefones celulares de manifestantes para as redes da internet, dando conta de que Mubarak havia sido alijado da cúpula do governo. Só mais tarde, quando o comando militar divulgou o comunicado oficial informando sobre a destituição do ditador, a imprensa ocidental assumiu que o tirano havia caído.

Entretanto, desde a manhã as redes sociais refletiam o clima de festa no Cairo, porque os manifestantes haviam entendido que, ao ser deixado de fora da reunião da cúpula de governo, Mubarak estava claramente destituído. A imprensa tradicional só assumiu esse fato como verdadeiro após a divulgação de uma nota oficial do comando militar.

Quando a pressa em interpretar os fatos se sobrepõe ao cuidado na apuração e na análise, corre-se o risco de antepor a opinião do jornalista ao verdadeiro significado do acontecimento".

Por Luciano Martins Costa em 15/2/2011
Comentário para o programa radiofônico do OI, 15/2/2011

leia o texto completo no Observatório da Imprensa clicando aqui.