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segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Blog Filosomídia: 100 mil visitas dos 99%


Blog Filosomídia: 100 mil visitas dos 99%

“Nós precisamos libertar a mídia – e vamos fazê-lo”.
Amy Goodman . The exception to the rulers (2004)

Inspirado nos textos e conceitos socializados por Enrique Dussel e sua “Filosofia da Libertação”, o blog Filosomídia iniciou sua série de postagens e abertura à visitação pública em dezembro de 2010, depois da qualificação do projeto de mestrado “Telejornais e crianças no Brasil: a ponta do iceberg”, dissertação defendida no PPGE/UFSC, na linha de Educação e Comunicação no final de 2011. Quando criado no início de meus caminhos na pós-graduação em 2009, o blog se propôs a fazer um clipping de notícias, indicação de documentos, eventos, grupos, associações, centros de pesquisa, artigos e outras referências aos temas abordados no percurso do meu próprio texto. Assim, ao longo do tempo, ele acabou se tornando um verdadeiro mapa pelos lugares por onde passei nessa viagem que parece não ter fim.

Neste final de semana passado (24/25 nov 2012) o blog alcançou a marca de 100 mil visitas de navegadores talvez em busca das mesmas referências que foram importantes para mim, cuja origem pode ser conferida nos “pontos” do globo terrestre ao pé da "página", no "menu" da barra lateral direita.

Com muito orgulho, nesse meio tempo o blog foi considerado uma fonte de consultas aos temas estudados por mim, e colaborou para divulgar questões como a luta pela democratização dos meios de comunicação, as políticas públicas para o setor, os esforços de tantos outros insurgentes (críticos, blogueiros progressistas e blogueiros sujos) que defendem o marco regulatório para o setor e o reconhecimento da comunicação como um direito humano, temáticas debatidas hoje contidas no caderno de propostas da I CONFECOM (2009).

O blog Filosomídia também pontua questões recentes levantadas ao debate do setor por articulistas, pesquisadores, comunicadores, jornalistas, educadores e professores, notadamente por aqueles que defendem um "basta" à atual situação onde mega corporações e oligarquias querem defender a manutenção da ordem e da ideologia imperante, a lógica do mercado determinando tudo nesse capitalismo des-humanizador, ou seja, aprisionando consciências a uma ideia hegemônica, que disfarça de lazer, entretenimento e infotenimento, o que seja exploração do outro por uma elite encastelada nos poderes, legitimada pelo que chama de democracia, liberdade de expressão e da imprensa etc. Algo muitas vezes defendido até nas elites do meio acadêmico re-produzindo tal pensamento em seus discursos que passam ao largo das reivindicações dos movimentos sociais e populares. Regula, Dilma!

As mídias, entendidas como os aparatos e veículos de comunicação das corporações e famílias que controlam os meios de produção dessa cultura internalizada e naturalizada por muitos, estão concentradas nas mãos de pouquíssimas famílias e suas empresas pelo planeta, o que também acontece no Brasil, talvez de maneira mais acirrada nessa selva midiática, visto o grau de profunda dependência e colonização do pensamento característicos no país. Suas falsas caras, páginas e telas estão em toda parte.

Como Dussel que defende a libertação de todas as formas de exploração/opressão e também Amy Goodman, concordo que “precisamos libertar as mídias” desse estado de coisas, já que ao longo de minhas investigações percebi e defendo a tese de que é o “Mercado” e os mega-empresários quem mandam; a “Política” e os “polititicos” quem obedecem; a “Educação” e os professores quem “formatam” as pessoas para esse mundo capitalista determinado por uma “elite” e, a “Comunicação” e os formadores de opinião é quem fazem a propaganda desse mundo do livre mercado, literalmente cercando as pessoas por todos os lados, por (quase) todos os veículos de comunicação, (quase) todas as mídias, (quase) controlando o que cada um e a sociedade devem pensar, saber, obedecer.

Considerando o conhecimento “acumulado” pela humanidade nas esferas do pensamento religioso, filosófico e científico perfazendo uma pirâmide des-equilibrada na balança dos banqueiros e nas bancas acadêmicas que terminam por legitimar informações que fizeram uma versão unilateral da história, defendo que essa “libertação” dos meios de Educação e Comunicação se dará à medida que cada um e muitos forem se auto-conhecendo e auto-conscientizando, tomando conhecimento de sua dignidade humana, seguindo juntos nas fileiras que ganham as ruas e abraços em cada um dos quatros cantos do planeta, organizando-se para fazer o mundo que queremos, com Sabedoria e pela plenitude da cidadania e cosmocidadania do Bem Viver para todos.

Mil batalhas estão sendo vencidas dia a dia, e um Outro Tempo/Espaço de fazer/saber/poder/poder e amar se anuncia também pela libertação das vozes e rostos até então en-cobertos pelas mídias controladas e controladoras. Sorrisos de alegria se abrirão no Bem Con-viver por mil outrora anônimos cidadãos entristecidos...

Que venham às mídias as criancinhas...

Passo re-evolutivo nessa história sem fim de buscas e entregas à harmonia, cósmica...

O Blog Filosomídia está nessas fileiras que ajuntam gentes para libertas as mídias. E vamos conseguí-la. Em breve, seremos os 100%! E, temos um nome: Liberdade!

Leo Nogueira Paqonawta

domingo, 6 de maio de 2012

Mon félicitations Monsieur François Hollande et Peuple de France... Allons enfants de la Patrie, le jour de gloire est arrivé!


Mon félicitations Monsieur François Hollande et Peuple de France...
Allons enfants de la Patrie, le jour de gloire est arrivé!


La Marseillaise

Allons enfants de la Patrie
Le jour de gloire est arrivé
Contre nous de la tyrannie
L'étendard sanglant est levé
Entendez vous dans les campagnes
Mugir ces féroces soldats
Ils viennent jusque dans vos bras,
Egorger vos fils, vos compagnes

Aux armes citoyens! Formez vos bataillons!
Marchons, marchons,
Qu'un sang impur abreuve nos sillons
Français, en guerriers magnanimes,
Portez ou retenez vos coups!
Epargnez ces tristes victimes,
A regret s'armant contre nous.
Mais ces despotes sanguinaires,
Mais ces complices de Bouillé,
Tous ces tigres qui, sans pitié,
Déchirent le sein de leur mère!

Amour sacré de la Patrie
Conduis, soutiens nos bras vengeurs!
Liberté, Liberté chérie!
Combats avec tes défenseurs.
Sous nos drapeaux, que la victoire
Accoure à tes mâles accents,
Que tes ennemis expirant
Voient ton triomphe et notre gloire!



Leia também:


Milhares festejam nas ruas a vitória de François Hollande

Imensa, coletiva, assombrosamente jovem e liberadora, como uma lufada de um perfume renovador, como o fim de um pesadelo, barulhenta e comovedora até às tripas: a alegria que explodiu nesta noite de domingo em Paris, após a confirmação da vitória do socialista François Hollande, é indescritível. As pessoas cantam e dançam na Praça da Bastilha, correm pelas ruas com bandeiras francesas, garrafas de Champagne, retratos de Hollande e rosas na mão. Esta explosão coletiva tem o nome mais humano que se conhece: esperança. Sarkozy deixou atrás de si um país agredido. O artigo é de Eduardo Febbro, direto de Paris.

Eduardo Febbro - De Paris

Paris - 31 rosas depois e uma frase que marca um rumo: “a austeridade não pode ser mais uma fatalidade na Europa”. Três décadas e um ano separam a vitória do socialista François Miterrand à presidência da República (maio de 1981) do triunfo eleitoral obtido neste domingo por François Hollande por 51,70% contra 48,30% dos votos. O modelo mais refinado do anti-herói derrotou nas urnas a versão mais xenófoba e ultrajante do liberalismo europeu: Nicolas Sarkozy ficou sem o grande sonho de revalidar seu mandato ao cabo de uma década no poder na qual seus cinco anos de presidência ficaram marcados pela panóplia de seus excessos, as promessas não cumpridas, as reformas pela metade, o desemprego, o desmonte do Estado de Bem-estar, o personalismo às últimas consequências, a arrogância e a violência racial com a qual, de uma forma ou de outra, tratou os estrangeiros.

A França encerrou uma fase na noite deste domingo e resgatou do frondoso bosque liberal a socialdemocracia europeia. Paris treme com os buzinaços e os gritos e cantos de alegria que cobrem a Praça da Bastilha. “Sarkozy terminou”, “a França Forte é a França de Esquerda”, gritava à noite a numerosa juventude que se reuniu na sede parisiense do Partido Socialista, na rua Solferino. A grande maioria desses jovens só conheceu até hoje a ação política dos governos conservadores e a fulgurante agressividade de Nicolas Sarkozy. Agora estão diante de uma nova perspectiva: “a mudança começa agora”, disse o presidente eleito no primeiro discurso que pronunciou desde Tulle (na região de Corrèze, centro sul do país), cidade da qual foi prefeito.

Pela mão de um homem discreto, sem a mais longínqua sombra de suntuosidade, que jamais ocupou um cargo ministerial e por quem, há um ano, nem seus mais fieis partidários apostavam as fichas como presidente da República, o socialismo francês regressa ao poder 17 anos depois da última vitória de François Miterrand (1988). O triunfo de Hollande é o resultado de uma construção pessoal que se plasmou logo depois de ter passado 11 anos como primeiro secretário do PS e outros dois elaborando a plataforma com a qual, no ano passado e em meio ao marasmo provocado pela queda do ex-diretor geral do FMI, Dominique Strauss-Kahn (o candidato socialista até então campeão nas pesquisas). François Hollande saiu do nada. “Hollande? Não, impossível, é uma piada”, diziam seus opositores de direita e alguns elefantes do Partido Socialista. Ele os derrotou.

Logo depois de ser eleito em 2007, Nicolas Sarkozy havia dito que ao final de seu mandato queria ser julgado por duas variáveis: a taxa de desemprego e a redução da pobreza. O julgamento veio das urnas: há um milhão a mais de desempregados e vários milhões de pobres. François Hollande pediu à história outro julgamento, o dos “compromissos maiores, com a juventude e a justiça”.

O presidente eleito disse domingo à noite que cada uma de suas “decisões se baseará em dois critérios: por acaso é justo e beneficia verdadeiramente a juventude?” A vitória do socialista francês tem, além disso, outra conotação: sua chegada ao poder rompe a cúpula hegemônica que governou a Europa nos últimos anos e que ficou conhecida como Merkozy. A dupla composta pela chanceler alemã Angela Merkel e pelo presidente Nicolas Sarkozy impôs a Europa uma única via: a austeridade sem crescimento como método e disciplina. Até que François Hollande chegasse com sua candidatura, fora dos ajustes e da restrição dos gastos não havia outro caminho. A vida era isso ou nada. François Hollande foi o primeiro dirigente da UE que levantou outra bandeira e rechaçou a bíblia do rigor fiscal sem crescimento. Isso valeu a ele a afronta de um acordo secreto pactuado entre Merkel, o primeiro ministro britânico, David Cameron, o presidente do Conselho Italiano, Mario Monti, e o presidente do governo espanhol, Mariano Rajoy, para não receber Hollande. Há dois meses, fecharam-lhe as portas. Agora, deverão colocar o tapete vermelho.

A margem da vitória de François Hollande foi mais estreita que a anunciada pelas pesquisas. Mas isso não diminui o denso golpe da história. A direita francesa protagonizou durante a campanha eleitoral, em particular durante as duas últimas semanas, uma desesperada corrida na direção da extrema-direita: fronteiras, imigração, segurança, violento discurso contra os meios de comunicação e uma vasta verborragia ultradireitista ocuparam os longos discursos de Sarkozy. Até o último momento, o atual presidente defendeu uma França ameaçada pelo mundo, pelos intercâmbios comerciais desequilibrados, os fluxos migratórios, os sindicalistas e os muçulmanos.

O conceito de “fronteira” foi para Sarkozy o antídoto contra essa massa tóxica que era o resto do planeta. À noite, no discurso que pronunciou logo após a divulgação dos resultados, Sarkozy disse: “não consegui convencer a maioria dos franceses. Assumo a responsabilidade pela derrota”. A extrema-direita com a qual tanto flertou o espera agora na primeira emboscada para esmigalhar o partido UMP e converter-se na força dominante da direita. Os conservadores têm dois inimigos em seu caminho: as eleições legislativas de 10 e 17 de junho e a extrema-direita da Frente Nacional. O enfoque moderado de François Hollande quebrou a contundente aposta ultradireitista e populista do presidente. Com ela, Nicolas Sarkozy pensou sepultar a impopularidade que o perseguia (60%) e o evidente fracasso de sua gestão. O sussurro socialdemocrata do presidente eleito tapou a fúria liberal. Sarkozy perdeu, como em toda disputa eleitoral, mas perdeu sem honra.

Imensa, coletiva, assombrosamente jovem e liberadora, como uma lufada de um perfume renovador, como o fim de um pesadelo, barulhenta e comovedora até às tripas: a alegria que explodiu nesta noite de domingo em Paris é indescritível. Agora mesmo, quando ainda se sente o tremor da história que traga o que quase já não está mais aí, as pessoas cantam e dançam na Praça da Bastilha, correm pelas ruas com bandeiras francesas, garrafas de Champagne, retratos de François Hollande e rosas na mão. Esta explosão coletiva tem o nome mais humano que se conhece: esperança. Sarkozy deixa atrás de si um país agredido: “demasiadas fraturas, demasiadas feridas, demasiados cortes separaram nossos concidadãos entre si. Isso acabou. O primeiro dever de um presidente é unir”, disse Hollande em seu discurso. Suas palavras já foram plasmadas no seio da esquerda, e isso o conduziu ao poder presidencial: uniu as correntes socialistas, atraiu os votos dos ecologistas e, sobretudo, agrupou em torno de sua a leal esquerda radical liderada por Jean-Luc Mélenchon na Frente de Esquerda. Quando François Hollande terminou seu discurso , uma mulher que estava na Praça da Bastilha, tinha os olhos cheios de lágrimas. Só conseguiu dizer: “Quando o escuto, tenho a impressão de voltar a minha casa. Este é o meu país”.

Tradução: Katarina Peixoto

Reproduzido de Carta Maior
06 mai 2012

terça-feira, 1 de maio de 2012

Alexandre Haubrich: O Trabalho como afirmação do ser


O Trabalho como afirmação do ser

Alexandre Haubrich
15 abril 2011

Desde o fim das sociedades primitivas, cujo trabalho era baseado na coleta e na troca, vimos a ascensão e a permanência de modos de produção que têm por base a exploração, a dominação, o autoritarismo. Os binômios explorador x explorado não deixam dúvidas: na sociedade escravista, amo x escravo; na sociedade feudal, proprietários de terra x vassalos; e hoje, capitalistas x trabalhadores assalariados. Na essência de todas essas composições está o empoderamento de alguns poucos indivíduos e o rebaixamento de muitos outros à condição de simples objeto.

No Brasil especificamente e no mundo ocidental de modo geral, o escravismo foi abolido a partir da conjunção de pressões sociais, esgotamento econômico e interesses políticos. Note que as pressões sociais, de caráter humanitário, formaram apenas uma pequena parte dos elementos desencadeadores da libertação dos escravos. A necessidade de abertura de novos mercados consumidores e de deslocamento do eixo econômico foram determinantes para que as elites econômicas e políticas cedessem e permitissem a troca gradual – ou nem tanto – do trabalho escravo pelo assalariado.

Alianças ou mesmo coincidências de fato entre elites econômicas e políticas, aliás, permeiam toda a atual lógica exploradora do trabalho. Com o domínio econômico, o grande empresariado controla também a política institucional, bancando campanhas milionárias, associando-se de formas nem sempre legais a determinados políticos e partidos ou sendo eles mesmos as pontes entre os dois setores. Dessa forma, o controle do Estado permite a utilização das instituições para a manutenção e reprodução da lógica opressora do Trabalho. O uso da Educação como forma de educar para a submissão, como já vimos em outro texto desta coluna, é um exemplo. As intervenções nos sindicatos e a utilização da polícia para conter greves são outros pilares estatais nos quais se apoiam as elites econômicas para manter o trabalhador sob seu jugo. Além disso, o controle ou a associação com a mídia hegemônica confere ao grande empresariado o monopólio da palavra e da publicidade.

O ser humano e as sociedades que constitui possuem sempre heranças variadas de momentos políticos e organizacionais anteriores. Nosso passado mantém-se presente em pequenas marcas, viciosas ou virtuosas, que nos acompanham indeléveis. Nossos maiores dramas podem ser convertidos, porém, em meras lembranças de algo detestável, desde que os fatos realmente sejam entendidos como detestáveis. Não parece ser o caso do escravismo. As marcas da escravidão, recentemente abolida, permanecem através das práticas de domínio do homem sobre o homem através do Trabalho. A aversão das elites ao trabalho manual, que cria na consciência coletiva a ideia do trabalho como humilhação, é uma dessas heranças sombrias, assim como o autoritarismo e a verticalidade da lógica de produção.

A lógica opressiva aplicada sobre o Trabalho é um dos grandes crimes cometidos ainda hoje contra a humanidade e contra os direitos básicos do ser humano. Em primeiro lugar, porque é no Trabalho que construímos a base sobre a qual irá se erguer nossa organização social. Não no sentido dos bens produzidos, mas no sentido da lógica que empregamos nessa prática. Os modos de produção são elementos fundantes da sociedade. E todo ser humano, como constitutivo e agente dessa sociedade, tem o direito básico de construí-la e optar pelos caminhos que levem a essa construção. O que quero dizer é que para mudar substancial e essencialmente a sociedade é impreterível a mudança intransigente do modo de produção. Com os meios de produção nas mãos dos empresários, o que resta ao trabalhador é submeter-se às condições impostas por aqueles – que, como vimos, atua em sintonia direta ou indireta com o Estado. Os trabalhadores, estejam nas fábricas, nas escolas ou no campo, se veem obrigados a seguir as regras do jogo, estabelecidas pelos patrões, caso queiram ter o que comer e onde morar.

Como já foi explicado, os grandes empresários e o Estado caminham juntos na opressão à esmagadora maioria da população. A intenção do trabalho é a falsa esperança de acumulação de capital pelo empregado, uma esperança introjetada por este a partir da publicidade capitalista, controlada exatamente pelos proprietários dos meios de produção. As conquistas que a classe trabalhadora tem alcançado nas últimas décadas nada mais são do que a reacomodação de valores monetários com vistas ao consumo – mesmo a questão da gradual redução das horas de atividade corresponde também ao uso do tempo de lazer como consumo compulsivo. São conquistas importantes, é claro, mas não são realmente modificadoras, já que não mexem na lógica do modo de produção capitalista, que faz do trabalhador pouco mais do que um instrumento nas mãos das elites econômicas nacionais e internacionais.

Explorado, oprimido, alienado, o trabalhador perde sua condição de sujeito social, pois apenas obedece regras e normas sem jamais ter qualquer poder de decisão. Transforma-se também em mercadoria, alugada pelo patrão para produzir novas mercadorias. Por sua vez, essas mercadorias serão vendidas, em muitos casos, para os próprios trabalhadores, ou seja, estes devolvem ao patrão parte do pagamento que receberam para produzir aquele mesmo bem. Nos outros casos, o salário do trabalhador não será suficiente para comprar a mercadoria que ele mesmo produz.

Se o modo de produção é fundante da sociedade, o Trabalho é fundante do ser. Marx já demonstrava o trabalho como diferenciação fundamental entre o ser social e o ser natural. Ou seja, o trabalho é o que nos torna humanos, seres dispostos a viverem em sociedade e atuarem sobre essa sociedade através de interações recíprocas e culturais. O trabalho, como produção racional, é o que nos desloca da pura ação instintiva, animalesca. Pois ali, na prática do trabalho, transformamos objetos ou conhecimento em outros objetos e outros conhecimentos. E fazemos isso racionalmente, intencionalmente, com um sentido cultural, social, não instintivo ou biológico. O trabalho é o que nos emancipa, é o que nos humaniza. Novamente Marx: “O trabalho liberta o homem”. Sim, mas não em uma sociedade escravocrata. E, como vimos, os resquícios da escravidão ainda perseguem os trabalhadores. Muda-se a superfície, mas a estrutura de exploração continua a mesma.

A estrutura que precisa nascer tem os trabalhadores no centro das decisões e de todas as etapas do Trabalho: organizacionais, manuais e de recompensa sobre o produzido. A desvinculação arbitrária entre trabalhadores e meios de produção é injusta e logicamente inconcebível. Sob que ponto de vista pode ser naturalizada uma prática na qual milhões de pessoas são obrigadas a disponibilizar sua força de trabalho para que algumas poucas lucrem? Sob que ponto de vista pode ser considerado “normal” o domínio de uns homens sobre os outros? É tolerável que, por ter mais pedaços de papel pintado, chamados arbitrariamente de “dinheiro”, uns poucos homens ganhem o direito de explorar uma grande quantidade de homens iguais a eles?

Se o Trabalho é o que deveria separar o ser humano dos demais animais, temos, em sua dinâmica maior, exatamente o oposto disso. Temos a lei do mais forte como única norma. A racionalização da igualdade e da coletividade é substituída pelo selvagem instinto do leão que ataca a presa, sempre de outra raça. No modo de produção capitalista, a exploração do trabalhador pelo patrão representa exatamente o rebaixamento deste a uma raça inferior. As elites não identificam no trabalhador um igual, e a publicidade dá a este a noção de que só se tornará respeitável se consumir mais. E mais: só poderá consumir mais se trabalhar mais. Na verdade, o que ocorre é que, por mais que trabalhe, nunca será respeitado como outro sujeito, pois é construído socialmente como objeto desde sua educação formal até sua rotina de trabalho.

É preciso, então, construir autonomia, emancipação. E nada disso se alcança através de conquistas superficiais. Os trabalhadores, para constituírem verdadeiros sujeitos sociais, não podem estar apartados dos meios de produção. O Trabalho não deve visar lucro pessoal, mas a construção da sociedade. Com os meios sob controle de quem neles trabalha e com a produção destinada à sociedade, cria-se, paulatinamente, uma cultura de solidariedade em todos os setores sociais. O trabalho deixa de constituir um sacrifício necessário ao consumo, e torna-se uma necessidade como afirmação do ser, que se vê participante da sociedade, se vê sujeito, livre e emancipado.

Nesse sentido, grita alto um trecho de artigo escrito em 1965 por Ernesto Guevara, para o semanário Marcha, de Montevidéu, no Uruguai, e dirigido a seu diretor Aníbal Quijano. Escreve Che:

“Para que se desenvolva no primeiro caso (como experiência libertadora), o trabalho deve adquirir uma condição nova; a mercadoria-homem deixa de existir e instala-se um sistema que estabelece uma cota pelo cumprimento do dever social. Os meios de produção pertencem à sociedade e a máquina é apenas a trincheira onde se cumpre o dever. O homem começa a libertar seu pensamento do fato repugnante que pressupunha a necessidade de satisfazer suas necessidades animais por meio do trabalho. Começa a ver-se retratado em sua obra e a compreender sua grandeza humana por meio do objeto criado, do trabalho realizado. Isso já não implica deixar uma parte de seu ser em forma de força de trabalho vendida, que não mais lhe pertence, antes significa uma emanação de si mesmo, um contributo à vida comum em que se reflete: o cumprimento de seu dever social.

“Fazemos todo o possível por dar ao trabalho essa nova categoria de dever social e uni-lo ao desenvolvimento da técnica, por um lado, o que trará condições para maior liberdade, e ao trabalho voluntário, por outro, baseados na apreciação marxista de que o homem alcança realmente sua plena condição humana quando produz sem a compulsão da necessidade física de vender-se como mercadoria”.

Ainda que a mídia corporativa omita, existem experiências bem sucedidas de organização autônoma dos trabalhadores, mesmo considerando-se a enorme barreira que é, para uma indústria estruturada comunitariamente, competir em uma sociedade capitalista. O funcionamento da autogestão das indústrias – e de outras estruturas sociais – seria obviamente muito facilitado se em toda a sociedade tivéssemos aplicada essa outra lógica sobre o Trabalho. É o caso transposto de países que, através de governos de orientação anticapitalista e anti-imperialista, ficam isolados internacionalmente e, assim, têm dificultadas suas tarefas de aprofundamento revolucionário. Porém, ainda com as dificuldades impostas pelo isolamento e pelas agressões externas, fábricas como a Flaskô, no Brasil, e outras espalhadas por Argentina, Uruguai, Paraguai, México e Venezuela, crescem sob a gestão direta dos trabalhadores, que tomam todas as decisões coletivamente. Estas fábricas foram ocupadas pelos operários e passaram a ser geridas por eles. No Brasil, da experiência da Flaskô e de outras que acabaram sucumbindo às pressões do capital, nasceu o Movimento Fábricas Ocupadas, que, segundo reportagem da revista brasileira Caros Amigos, chegou a atuar em 35 fábricas na primeira década dos anos 2000.

O papel dos movimentos sociais e dos sindicatos é determinante na caminhada revolucionária. Essas organizações devem atuar no sentido não de doutrinar os trabalhadores, mas de, através do diálogo e da troca, construir juntos uma consciência de classe como percepção dos interesses comuns que devem ser buscados coletivamente. Deve-se partir da formação da crítica e da ação através de situações desencadeadoras de discussões coletivas. Isolado, o indivíduo tende a tornar-se acomodado, conformado, desesperançoso, mas ao compartilhar experiências, frustrações e contestações, sua atitude torna-se rebelde, e essa rebeldia pode desencadear atitudes revolucionárias. É producente, nesse sentido, a organização em sindicatos e associações que estimulem aprimoramento profissional, mas também pessoal, politizante, cultural.

São inúmeras as dificuldades que se impõe a alterações estruturais na lógica do Trabalho, a começar por uma velha questão: por onde começar a mudança? Em outras palavras: muda-se o Estado para mudar a cultura e as instituições ou muda-se a cultura e as instituições para mudar o Estado? Na verdade, essas mudanças precisam caminhar juntas. O Estado ou constitui-se em aliado ou será barreira possível mas extremamente difícil de ser superada na busca por criar autonomia nos e com os trabalhadores. Ao mesmo tempo, o Estado não será verdadeiramente democrático sem que se modifique estruturalmente o modo de produção dominante. Estado e modo de produção são, portanto, partes inseparáveis de um mesmo problema e de uma mesma solução revolucionária. Caia quem caia primeiro, modo de produção ou Estado (em seus moldes atuais), sem a alteração profunda na lógica do Trabalho e na organização estatal, a revolução não será completa, pois o empoderamento popular estará pela metade.

Reproduzido de Diário Liberdade
15 abr 2011

Leia também “Problemas da construção do socialismo”, por Alberto Anaya Gutiérrez, Alfonso Ríos Vázquez, Arturo López Cándido, José Roa Rosas na página de Rsistir.info (2006) clicando aqui.

domingo, 25 de março de 2012

O Cineasta Silvio Tendler convoca a população para o Ato Contra a Comemoração do Golpe de 64


Ato Contra a Comemoração do Golpe de 64 - 29/03/2012

O Cineasta Silvio Tendler convoca a população para o ato.

Dia 29/03/2012 . quinta feira
Local: Em frente ao Clube Militar, na Cinelândia.
Av. Rio Branco, 251 - Rio de Janeiro
Horário: 14 horas




Exibir mapa ampliado


Foto: Evandro Teixeira


Leia matéria com entrevista ao fotógrafo Evandro Teixeira na página do Cotidiano/UFSC clicando aqui.

domingo, 15 de janeiro de 2012

Sumak Kawsay - Bem Viver - Bem Conviver: Agenda Latino-Americana Mundial 2012


A Comissão Dominicana de Justiça e Paz do Brasil, em parceria com diversas instituições e movimentos pastorais e sociais, lançou a Agenda Latino Americana Mundial, além de um apoio para registro de compromissos, é um instrumento de formação e reflexão, com textos selecionados de acordo com a temática de cada ano. Em 2012, o tema da agenda é “Bem Viver – Bem Conviver: Sumak Kawsay”. A Casa da Juventude Pe. Burnier integra a rede de parcerias da agenda.

Mais informações podem ser obtidas pelo telefone (62) 3229-3014 ou pelo e-mail: justpaz@dominicanos.org.br

Leia mais sobre a agenda, prefácio de Pedro Casaldáliga, índice e faça seu pedido, clicando aqui.

A Agenda Latino-Americana Mundial, com a edição de 2012, faz 21 anos. Desde seu primeiro número, "esta obra tem assumido o desafio de contribuir, modestamente, mas com muita paixão, na análise e no compromisso das grandes causas de nossa América. Mas, alargando horizontes veio a assumir uma perspectiva latino-americana mundial. As grandes causas são inevitavelmente mundiais, sobretudo agora em tempos de globalização. E são causas grandes porque abraçam nossas vidas, a Sociedade, o Planeta, o Universo... As nossas causas ‘valem’ mais que a nossa vida, porque são elas as que à vida dão sentido. Somos o que amamos, o que fazemos, o que sonhamos" (Pedro Casaldáliga. Latino-americana 2012, p. 10).

A "Agenda Latino-americana Mundial" foi e continua sendo: "Sinal de comunhão continental e mundial entre as pessoas e as comunidades que vibram e se comprometem com as grandes causas da Pátria Grande, como resposta aos desafios da Pátria Maior. Um anuário da esperança dos pobres do mundo a partir da perspectiva latino-americana. Um manual companheiro para ir criando a ‘outra mundialidade’. Uma síntese da memória histórica da militância e do martírio da Nossa América. Uma antologia de solidariedade e criatividade. Uma ferramenta pedagógica para a educação, a comunicação, a ação social ou a pastoral popular" (Latino-americana 2012, 1ª página).

A "Latino-americana 2012" dedica suas páginas à utopia indígena do Bem Viver (em quéchua: Sumak Kawsay). "Não se trata de um tema realmente novo, mas sim de uma riqueza de sabedoria que só nos últimos anos os povos indígenas estão trazendo à luz e oferecendo-a ao mundo como sua contribuição à aventura humana. Ouvir esta proposta, acolhê-la, levá-la a conhecer no nosso Continente e fora dele, meditá-la, é o que queremos fazer nesta Agenda, somando-nos na reflexão coletiva que está se realizando dentro e fora do Continente sobre este Bem Viver" (José Maria Vigil. Ib., p. 8).

A palavra libertadora, o Bem Viver, "nos sai ao encontro como um evangelho de vida possível, digna e para todas as pessoas e todos os povos. Boa nova do Bem Viver frente ao mau viver da imensa maioria e contra ‘a boa vida’, insultante, blasfema, de uma minoria que pretende ser e estar ela sozinha na casa comum da Humanidade" (Pedro Casaldáliga. Ib.).

O Bem Viver é, pois, o Bem Conviver e o Bem Conviver é o Bem viver. Não há uma boa vida humana que não seja uma boa convivência humana e vice-versa. "Somos relação, sociabilidade, comunhão, amor. Já se subentenderia que uma boa vida pessoal tem que ser também comunitária; mas é melhor destacar isso explicitamente para não cairmos em subentendidos que ignoram o que se deve entender e assumir, vitalmente, radicalmente. Eu sou eu e a Humanidade inteira. Dois são os problemas e duas as soluções: as demais pessoas e eu. Isto não se pode ‘subentender’ apenas; deve-se gritar" (Ib., p. 11).

O Bem Viver - Bem Conviver é o "Sonho Real", que era o nome da ex-Ocupação do Parque Oeste Industrial em Goiânia (cujos moradores foram barbaramente despejados por causa da ganância dos donos das imobiliárias e da conivência criminosa do Poder Público, Estadual e Municipal).

Jesus de Nazaré, profeta do maior Sonho Real ou "profeta da maior Utopia (‘que sejamos bons como Deus é bom, que nos amemos como Ele nos amou, que demos a vida pelas pessoas que amamos’) promulgou, com sua vida e sua morte e sua vitória sobre a morte, o Bem Viver do Reino de Deus. Ele é pessoalmente um paradigma, perene e universal, do Bem Viver, do Bem Conviver" (Ib., p. 11).

Nós da Comissão Dominicana de Justiça e Paz do Brasil - empenhados em lançamentos da obra país afora - queremos espalhar a Agenda e sua causa. Como diz Pedro Casaldáliga, queremos aumentar a "Tribo dos lançadores da Agenda" (Cf. Ib., página inicial).

Reproduzido de Adital
15 jan 2012

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

15 de outubro: a voz e a hora d@s indignad@s do Brasil e do mundo



Praças pelo mundo afora despertaram. Milhões de pessoas cansadas de autoritarismo, de democracias voltadas para os ricos, da farra do capital financeiro.

Há 500 anos, o Brasil é um país saqueado por políticos corruptos, ruralistas e empreiteiros gananciosos. O governo brasileiro segue dominado pela mesma elite que levou nosso país a um dos primeiros lugares em desigualdade social.

Temos muita coisa para mudar!

Precisamos construir uma nova forma de fazer política, queremos decidir os rumos em assembleias livres, amplas e democráticas. Queremos levar o debate a todas as praças do país.

Somos contra a política suja das negociatas, de um sistema que concentra o poder nas mãos de uma minoria que não nos representa, corruptos cuja dignidade está a serviço do sistema financeiro; queremos uma Democracia Real com participação do povo nas decisões fundamentais do país, muito além das eleições, essa falsa democracia convocada a cada quatro anos.

Transparência!

Não somos palhaços. A Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016 do jeito como estão sendo organizados servem apenas para os interesses dos ricos e de seus governantes. Estamos vendo uma verdadeira “faxina social” em nosso país, com a remoção de milhares de famílias das regiões onde serão os megaeventos esportivos. Os benefícios atingiram uma pequena parte da população. O sigilo do orçamento das obras da Copa, a flexibilização das licitações e a postura submissa do Brasil à Fifa e à CBF são um banquete farto aos corruptos.

Quem disse que queremos crescer assim?

Queremos um Brasil ecologicamente sustentável. Atualmente a política de desenvolvimento da matriz energética segue a devastação do meio-ambiente e do desrespeito aos povos originários, como a construção de Belo Monte, um atentado aos povos do Xingu. Não concordamos com o caminho que o governo federal está propondo - que prevê a construção de pelo menos mais quatro usinas nucleares até 2030 - no desenvolvimento de uma energia cara e não segura: Enquanto o Brasil segue com as usinas nucleares de Angra dos Reis, mesmo após a calamidade nuclear de Fukushima, há pouco incentivo às novas tecnologias energéticas sustentáveis, como a solar, eólica, de marés, para as quais o país possui enormes potenciais.

Equilibrado e para todos.

O agronegócio segue como um risco ao futuro. O desmatamento desenfreado, anistiado e estimulado pelo novo Código Florestal, segue transformando o Brasil numa grande fazenda de soja. Não há uma política séria de reforma agrária, de soberania alimentar e de preservação do meio-ambiente. Segue a destruição da Amazônia, o uso abusivo de agrotóxicos e a propriedade da terra cada vez mais concentrada.

Educar ou manipular?

Estamos fartos de que os meios de comunicação, que deveriam servir a população como ferramenta de educação, informação e entretenimento, sejam usados como armas de manipulação de massas, trabalhando para os mesmos políticos corruptos que deflagram o país em benefício próprio.

Vamos colorir as praças com diversidade!

Ainda sofremos discriminação pela cor da nossa pele, por nosso sexo ou orientação sexual, por nossa nacionalidade, por nossa condição econômica. Queremos colorir as praças brasileiras com a diversidade do nosso país, que precisa ser livre, digno e para todos. Devemos ocupar, resistir e produzir decisões e encaminhamentos democráticos, onde a colaboração esmague a competição e a socialização destrua a capitalização. Não temos a ilusão de resolver todos os problemas em poucos dias, semanas, meses. Mas teremos dado o primeiro passo.

Chegou o momento em que todas as nações, todas as pessoas se unem e tomam as ruas para dizer: Basta! É hora de assumir a nossa responsabilidade e o nosso direito a uma vida livre e justa. 15 de outubro: um só planeta, uma só voz.

Reproduzido de Democracia Real Brasil


Eduardo Galeano: "Ojalá que estemos todos celebrando el sagrado derecho a la indignación, la prueba de que estamos vivos y de que somos dignos"


Eduardo Galeano es periodista y escritor, ganador del premio Stig Dagerman. Es considerado como uno de los más destacados escritores de la literatura latinoamericana.

Veja outros depoimentos no Youtube User SecretOlivo

E que as crianças cantem livres sobre os muros...


Que as Crianças Cantem Livres

Taiguara

O tempo passa e atravessa as avenidas
E o fruto cresce, pesa e enverga o velho pé
E o vento forte quebra as telhas e vidraças
E o livro sábio deixa em branco o que não é
Pode não ser essa mulher o que te falta
Pode não ser esse calor o que faz mal
Pode não ser essa gravata o que sufoca
Ou essa falta de dinheiro que é fatal
Vê como um fogo brando funde um ferro duro
Vê como o asfalto é teu jardim se você crê
Que há sol nascente avermelhando o céu escuro
Chamando os homens pro seu tempo de viver
E que as crianças cantem livres sobre os muros
E ensinem sonho ao que não pode amar sem dor
E que o passado abra os presentes pro futuro
Que não dormiu e preparou o amanhecer...



Foto: Graffiti on the Separation Wall - Photo: Wall in Palestine - Flickr
E, dedico essa canção - hoje - às crianças palestinas em especial, e a todas que sonham com a liberdade e soberania!

domingo, 9 de outubro de 2011

Para libertar o mundo: O melhor discurso de todos os tempos...




O melhor discurso de todos os tempos

Sinto muito, mas não pretendo ser um imperador. Não é esse o meu ofício. Não pretendo governar ou conquistar quem quer que seja. Gostaria de ajudar - se possível - judeus, o gentio... negros... brancos.

Todos nós desejamos ajudar uns aos outros. Os seres humanos são assim. Desejamos viver para a felicidade do próximo - não para o seu infortúnio. Por que havemos de odiar ou desprezar uns aos outros? Neste mundo há espaço para todos. A terra, que é boa e rica, pode prover todas as nossas necessidades.

O caminho da vida pode ser o da liberdade e da beleza, porém nos extraviamos. A cobiça envenenou a alma do homem ... levantou no mundo as muralhas do ódio ... e tem-nos feito marchar a passo de ganso para a miséria e os morticínios. Criamos a época da velocidade, mas nos sentimos enclausurados dentro dela. A máquina, que produz abundância, tem-nos deixado em penúria. Nossos conhecimentos fizeram-nos céticos; nossa inteligência, emperdenidos e cruéis. Pensamos em demasia e sentimos bem pouco. Mais do que máquinas, precisamos de humanidade. Mais do que de inteligência, precisamos de afeição e doçura. Sem essas duas virtudes, a vida será de violência e tudo será perdido.

A aviação e o rádio aproximaram-se muito mais. A próxima natureza dessas coisas é um apelo eloqüente à bondade do homem ... um apelo à fraternidade universal ... à união de todos nós. Neste mesmo instante a minha voz chega a milhões de pessoas pelo mundo afora ... milhões de desesperados, homens, mulheres, criancinhas ... vítimas de um sistema que tortura seres humanos e encarcera inocentes. Aos que me podem ouvir eu digo: "Não desespereis!" A desgraça que tem caído sobre nós não é mais do que o produto da cobiça em agonia ... da amargura de homens que temem o avanço do progresso humano. Os homens que odeiam desaparecerão, os ditadores sucumbem e o poder que do povo arrebataram há de retornar ao povo. E assim, enquanto morrem os homens, a liberdade nunca perecerá.

Soldados! Não vos entregueis a esses brutais ... que vos desprezam ... que vos escravizam ... que arregimentam as vossas vidas ... que ditam os vossos atos, as vossas idéias e os vossos sentimentos! Que vos fazem marchar no mesmo passo, que vos submetem a uma alimentação regrada, que vos tratam como um gado humano e que vos utilizam como carne para canhão! Não sois máquina!

Homens é que sois! E com o amor da humanidade em vossas almas! Não odieis! Só odeiam os que não se fazem amar ... os que não se fazem amar e os inumanos.

Soldados! Não batalheis pela escravidão! lutai pela liberdade! No décimo sétimo capítulo de São Lucas é escrito que o Reino de Deus está dentro do homem - não de um só homem ou um grupo de homens, mas dos homens todos! Estás em vós! Vós, o povo, tendes o poder - o poder de criar máquinas. O poder de criar felicidade! Vós, o povo, tendes o poder de tornar esta vida livre e bela ... de fazê-la uma aventura maravilhosa. Portanto - em nome da democracia - usemos desse poder, unamo-nos todos nós. Lutemos por um mundo novo ... um mundo bom que a todos assegure o ensejo de trabalho, que dê futuro à mocidade e segurança à velhice.

É pela promessa de tais coisas que desalmados têm subido ao poder. Mas, só mistificam! Não cumprem o que prometem. Jamais o cumprirão! Os ditadores liberam-se, porém escravizam o povo. Lutemos agora para libertar o mundo, abater as fronteiras nacionais, dar fim à ganância, ao ódio e à prepotência. Lutemos por um mundo de razão, um mundo em que a ciência e o progresso conduzam à ventura de todos nós. Soldados, em nome da democracia, unamo-nos.

Charles Chaplin
O último discurso (O Grande ditador – 1940)

domingo, 7 de agosto de 2011

O Tao da Libertação: Mark Hathaway e Leonardo Boff


Fritjof Capra: o Tao da Libertação de M. Hathaway e L. Boff

por Leonardo Boff

30/07/2011

Em 2010 Mark Hathaway e eu publicamos em inglês um livro que nos tomou cerca de 12 anos de pesquisa: ”The Tao of Liberation:exploring the Ecology of Transformation” (Orbis Books, N.Y.) Ele americano-canadense, pedagogo, com vários anos de trabalho no Peru e esperto em astrofísico e cosmologia e eu ecoteólogo. Foram muitos encontros seja no Canadá seja no Brasil. O livro ganhou a medalha de ouro da Fundação Nautilus que premia livros inovadoras em várias áreas do saber. Nosso prêmio foi em “Cosmologia e Nova Ciência”.

Ao ler o manuscrito, Fritjof Capra se entusiasmou tanto que se ofereceu para fazer o prefácio que, como verão, é uma bela peça de reflexão.


O livro sairá nos inícios de 2012 em portugues pela Editora Vozes de Petrópolis. LB

O Tao da Libertação
Explorando a Ecologia da Transformação

Prefácio

(...) "Porque levou tanto tempo para se reconhecer a seriedade do risco à sobrevivência humana? Porque somos tão devagar em mudar as nossas percepções, idéias, modos de vida e instituições, as quais continuam a perpetuar injustiças e a destruir a capacidade do planeta Terra em sustentar a vida? Como impulsionar o movimento pela justiça social e pela sustentabilidade ecológica?

Estas questões são centrais para este livro. Os autores, Leonardo Boff e Mark Hathaway – um do Grande Sul, o outro do Grande Norte – tem refletido muito sobre questões teológicas, de justiça e de ecologia. A resposta deles às questões acima delineadas é que o desafio maior vai além da disseminação de conhecimento e mudança de hábitos.

Todas as ameaças que enfrentamos, na visão deles, são sintomas de uma doença cultural e espiritual afetando a humanidade. Eles afirmam que: “Há uma patologia aguda inerente ao sistema que atualmente domina e explora o mundo”. Eles identificam a pobreza e a desigualdade, o esgotamento da Terra e o envenenamento da vida como os três principais sintomas desta patologia e eles observam que “as mesmas forças e ideologias que exploram e excluem os pobres estão também devastando toda a comunidade de vida do planeta Terra”.

Para superar este estado patológico, os autores argumentam, será necessária uma mudança fundamental da consciência humana. Eles escrevem que “de uma maneira muito real, nós somos chamados a nos reinventar como espécie”. Eles se referem a este processo de profunda transformação como ‘libertação’, na mesma maneira em que este termo é usado na tradição de Teologia da Libertação; quer dizer, no nível pessoal como forma de realização ou iluminação espiritual e no nível coletivo como a procura de um povo de se libertar de opressões.

No meu entendimento, este duplo uso do conceito de ‘libertação’ é o que dá a este livro seu caráter único, permitindo aos autores integrar as dimensões sociais, políticas, econômicas, ecológicas, emocionais e espirituais da atual crise global.

Como Hathaway e Boff dizem no prólogo, O Tao da Libertação é a procura pela necessária sabedoria para efetuar profundas transformações liberadoras no nosso mundo. Se dando conta que esta sabedoria não pode ser encapsulada por palavras, eles decidiram descrevê-la através do uso do antigo conceito Chinês Tao (‘o Caminho’) significando tanto o caminho espiritual do individuo como a maneira de ser do próprio universo. De acordo com a tradição Taoista a realização espiritual acontece quando agimos em harmonia com a natureza. Nas palavras do clássico texto Chinês Huai Nan Tzu: “Aqueles que seguem o fluxo da natureza na corrente do Tao”.

Fritjof Capra

Extraído da página de Leonardo Boff. Leia o prefácio completo clicando aqui.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

A filosofia e a libertação das crianças



Pensemos nas seguintes palavras : investigação, conhecimento/conhecer, fatos, linguagem (literal e figurada), metáforas, símiles, analogias, mente/corpo, mesmo/outro, sociedade, democracia, real, pensar/sentir, pensar sobre o pensar, amigo, amor, inimigo, direitos, justiça, verdade, beleza, deus, natureza, pessoa, arte, tempo/espaço, causa/efeito, mal, medo, emoções, razão, critérios.

Quais destas palavras, ou outras semelhantes, não fariam parte do vocabulário de uma criança de 5 anos de idade? Alguém poderia sugerir que não utilizaria palavras como "critérios" ou "razão". Vamos analisar alguns exemplos.

Uma mãe diz para sua filha de 5 anos que ela não pode jogar com sua amiginha. O que a menina vai fazer? Vai perguntar "por quê?". Que é que ela está perguntando? A razão da proibição de sua mãe. Vamos supor outro exemplo. Um menino briga com outro e diz para ele que não quer jogar mais, que não quer mais ser seu amigo. O seu amigo vai perguntar-lhe "por quê?".

Está perguntando-lhe a razão da sua decisão. Vamos supor outro exemplo. Uma criança adorou um programa de televisão, encontra-se com um amigo e pergunta se ele gostou desse programa. O amigo diz que não, que odiou o programa. O que o menino vai lhe perguntar? Vai perguntar-lhe por que ele odiou o programa. Neste caso está perguntando por critérios, porque quando alguém afirma que uma coisa é boa ou chata e outro pergunta por que, está perguntando pelos critérios desse julgamento. Poderão ser critérios bons ou ruins, mas serão critérios.

O que eu quero dizer é que mesmo que as crianças não utilizem as palavras citadas acima, elas utilizariam outras para dar conta dos conceitos que estão envolvidos nesses termos. Certamente, talvez uma criança de 5 anos não utilize a palavra justiça, mas com certeza percebe que muitas coisas que acontecem em sua vida não são justas. Outro exemplo. Uma criança foi com sua mãe comprar um brinquedo para o dia das crianças numa loja cheia de brinquedos, com bonecos de todas as formas e cores. A criança pergunta para sua mãe como escolher o boneco e a mãe responde "só pegue um". A criança quer saber como fazer para escolher e a mãe responde que deve pegar aquele que gosta. A criança diz então que gosta de todos e a mãe começa a ficar nervosa e diz que só pode escolher uma. A criança já sabe isso, mas precisa ajuda para escolher. Geralmente as crianças ficam em dúvida sobre o que quer dizer a palavra "escolher"...

Talvez as crianças também não utilizem a palavra "investigação". Porém, as crianças não compreendem muitas coisas. E elas se empenham em descobrir como é que as coisas acontecem no mundo; em particular, buscam compreender o significado dessas palavras que as pessoas maiores utilizam permanentemente, palavras como bem, tempo, verdade. Quando as crianças perguntam aos adultos o significado dessas palavras, geralmente não recebem respostas. As crianças são socializadas através da linguagem e aprendem a utilizar as palavras de uma determinada maneira, sem pensar muito nelas.

As palavras que coloquei no começo desta apresentação são palavras especiais. Elas têm três características. A primeira é que são conceitos centrais, conceitos que utilizamos no dia-a-dia, que estão na base de nossa experiência cotidiana, e se não usamos exatamente essas palavras, provavelmente utilizamos um sinônimo delas. A segunda característica é que elas são conceitos comuns, que todos utilizamos, não só algumas pessoas ou algumas culturas. A terceira característica é que esses conceitos são controversos, contestáveis, não temos resposta definitiva acerca do que eles significam. E no Ocidente, pelo menos nos últimos vinte e cinco séculos, as pessoas têm tentado descobrir possíveis significados. Muitas respostas se propõem, mas, o mais importante em relação à libertação das crianças é que devem saber que se trata de conceitos contestáveis, controversos. Porque, se as crianças não sabem que esses conceitos são controversos e contestáveis, elas ficam presas à cultura na qual são socializadas.

Mais ainda, muitas vezes as crianças tornam-se infelizes quando descobrem que seu melhor amigo considera que um amigo é algo totalmente diferente daquilo que elas consideram. Palavras como amigo, amor, liberdade são centrais para o modo como uma criança constrói e percebe seu mundo. Se uma criança não sabe que essas palavras são controversas e que existem muitas maneiras de compreendê-las, corre o risco de ser transformada num depósito de significados prontos e estanques.

Se me perguntassem por que eu me envolvi na idéia de que as crianças façam filosofia, diria que é porque me sinto ofendida com a idéia de que tratamos as crianças como se fossem depósitos e as mutilamos até que sejam maiores de idade. Elas fazem dezoito anos e continuam utilizando palavras como amor e amizade sem saber de que estão falando.

Neste sentido, uma das maneiras de perceber a filosofia é como um processo educacional de libertação da criança. Trata-se de libertar as crianças para que possam pensar por elas mesmas acerca do significado dessas palavras. Não é justo que não se permita às crianças saber que existem muitas maneiras de pensar acerca dessas palavras. A história da filosofia ocidental, que contém diferentes maneiras de conceber esses conceitos, é um legado de todas as crianças, sejam elas conscientes disso ou não. Todas as crianças têm direito de conhecer as opções antes de escolher que significado darão a essas palavras. Neste sentido, a filosofia pode ser compreendida como um processo de libertação.

Mas a filosofia é muito mais que isso, porque é uma disciplina normativa, além de descritiva. Quero dizer, ocupa-se não só de como as coisas são, mas também de como deveriam ser. Quando observamos o mundo, percebemos muita injustiça, muita falta de liberdade, muito ódio em vez do amor, e nós gostaríamos de conceber e criar um mundo mais justo, mais belo, mais verdadeiro. Para isso é necessário sabedoria e bom julgamento, precisa-se saber pensar e saber pensar bem, saber quais são aquelas opções e também cultivar a imaginação para talvez propor outras opções; precisa-se também ser crítico, ser capaz de olhar as instituições da sociedade e perguntar se elas cumprem aquilo que deveriam fazer. E é indispensável ser criativo, colocando algumas sugestões sobre como as coisas poderiam ser melhores. Finalmente, é fundamental também pensar de um modo ético, atencioso. Como pessoas, não nascemos dessa maneira, mas podemos ser educados desta forma.

Por isso é que estamos propondo um novo paradigma em educação, que busque, não só no Brasil mas no mundo inteiro, transformar cada sala de aula numa comunidade de investigação. Nessas comunidades seriam desenvolvidas as inteligências emocional, cognitiva e social das crianças. Exploraríamos não só o que pensamos e como pensamos mas também o que sentimos e como sentimos, e exploraríamos o que pensamos que a sociedade deveria ser e como deveríamos nos relacionar nessa sociedade. 

Como se trata de fazer isso com crianças, o currículo de filosofia para crianças foi criado para fazer acessíveis a elas as idéias filosóficas trabalhadas durante os 2.500 anos de história da filosofia ocidental. Nessas histórias, não são utilizados os nomes reais dos filósofos, mas as suas palavras, e seus pontos de vista são apresentados na fala das personagens-crianças. São as crianças das histórias que dizem aquilo que Aristóteles, Santo Tomás, Spinoza, Marx, Dewey ou Freire têm colocado. É como se os filósofos tivessem uma longa conversação, mesmo que tenham morrido há muito tempo atrás. Platão teve algumas idéias e logo Aristóteles gostou de algumas, mas rechaçou outras e criou novas idéias. O mesmo aconteceu com todos os filósofos. Quando as crianças lêem estas histórias, descobrem estas idéias e exploram essas palavras com seus amigos, é como si elas estivessem participando dessa conversação. Embora esses filósofos tenham morrido há tanto tempo atrás, existe um sentido no qual eles ainda estão vivos, na medida em que se expressam nas vozes das crianças.

De tal modo que, através da filosofia, as crianças podem investigar o que significam essas palavras que utilizamos no dia a dia. A decisão de como utilizar estas palavras tem muito a ver com o modo como criamos nossa visão do mundo, nossa cosmovisão. Como o mundo em que vivemos hoje tem muitos problemas, necessitamos cada vez mais pensar não só naquilo que é, mas naquilo que deveria ser. Para isso, a imaginação é necessária. É preciso aprender a criar e inventar novos sentidos e significados. Quando o processo filosófico dá certo, as pessoas podem chegar a ser pessoas que fazem bons julgamentos.

Talvez não proporcionemos muita informação (os computadores vão preocupar-se com isso), mas devemos nos ocuparmos de educar pessoas com bom julgamento. Para isso, não podemos esperar até que as crianças façam dezoito anos. Temos que começar muito antes, quando aprendem a falar. Não se trata só de introduzir uma disciplina no currículo escolar, como a ciência foi introduzida no século XIX. Trata-se de pedir aos professores e administradores escolares que repensem aquilo que entendem por educação, que parem de pensar tanto na informação e que comecem a pensar em bons pensamentos, sentimentos apropriados e boas relações sociais, pois, dessa maneira, estaremos proporcionando às crianças uma oportunidade de fazer julgamentos inteligentes em suas vidas, estaremos apresentando-lhes opções para escolher, e as ferramentas que precisam para pensar novas opções, novos sentidos e significados, novas relações. Nesse sentido seriamos agentes de uma revolução educativa. Isso não é uma responsabilidade pequena. Para todos que aceitam essa responsabilidade, falo em nome das crianças do futuro: muito obrigada.

Ann Margaret Sharp*


Reproduzido de
Linhas Críticas . Revista da Faculdade de Educação/UnB



Leia mais sobre a autora em Filosofia para crianças clicando aqui, e assista ao vídeo "Prof. Ann Margaret Sharp's lecture" em Vimeo (em inglês) clicando aqui. Entrevista (em inglês) clicando aqui.

* Ann Margaret Sharp (1942-2010) Foi diretora do Institute for the Advancement of Philosophy for Children, na Universidade de Montclair, NJ, Presidente do International Council for Philosophical Inquiry with Children e co-autora dos manuais do Programa de Filosofia para Crianças.