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quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

A destruição da infância: Vicenç Navarro


A destruição da infância

Está acontecendo algo muito grave que não vem sendo debatido: uma grande deterioração do meio cultural no qual as crianças estão submersas.

Vicenç Navarro (*)

Está acontecendo algo sobre o qual não se comenta muito nos fóruns midiáticos e políticos do país (Espanha), e que está causando impacto enorme na qualidade de vida em nosso presente e em nosso futuro. Estou me referindo à grande deterioração do meio cultural no qual a criança está submersa. Um indicador disso, entre outros, é o mundo midiático ao qual as crianças estão expostas. E não me refiro somente ao número de horas que passam diante da televisão ou de outras mídias de entretenimento, o que continua sendo um problema grave (nos Estados Unidos, onde este tipo de estudo é sistematicamente realizado, o tempo de exposição subiu de uma hora e meia nos anos 1970 para cerca de quatro horas atualmente). Estou me referindo, além do tempo de exposição, à evidente deterioração dos conteúdos de produção midiática. A destruição no conteúdo educativo dos programas televisivos ou dos videogames tem sido eminente, com um aumento notável da promoção do consumismo, do individualismo, da violência, do narcisismo, do egocentrismo e do erotismo como instrumentos de manipulação.

A evidência de que isto se dá dessa maneira é assustadora. Estes conteúdos – que configuram de forma muito negativa os valores sociais – estão espalhados por toda a sociedade, incluindo os adultos. Mas o que é ainda mais preocupante é que muitos desses valores se apresentam com mais intensidade nos programas voltados para o público infantil. E a situação está piorando. Vou me explicar.

Em meados da década de 1970, foi feito um estudo sobre o conteúdo dos programas de televisão para meninos e meninas nos EUA. Foi realizado por pesquisadores da Johns Hopkins University. Nesta pesquisa, constatou-se que a violência, muito generalizada nos Estados Unidos, estava inclusive mais presente, paradoxalmente, na programação infantil. Tal estudo provocou uma revolta considerável naquele país. E fui eu a apresentá-lo no Congresso dos EUA, não enquanto professor realizador do estudo, mas como dirigente da Associação Americana de Saúde Pública (American Public Health - APH, segundo a sigla original), tendo sido escolhido entre o corpo diretivo pelos 50 mil membros dessa Associação.

O Comitê de Assuntos Sociais do Congresso dos EUA organizou uma série de depoimentos para analisar o que estava acontecendo nos programas de televisão orientados para crianças. E convocou uma sessão em que estavam, de um lado, os presidentes das três cadeias de televisão mais importantes do país (CBS, ABC e NBC) e, de outro, o representante da APHA (que era eu). Para sempre me lembrarei daquele momento. Ali estava eu, filho de La Sagrera, bairro popular por excelência de Barcelona, Espanha, com o enorme privilégio (em um país de imigrantes) de representar meus colegas da APHA e defender os interesses da população norte-americana diante de três das pessoas mais poderosas dos EUA, que durante seu depoimento tentavam ridicularizar o meu, alegando que eu estava exagerando quanto ao impacto desses programas nas crianças norte-americanas.

Como não podiam questionar os dados que documentavam a enorme violência dos programas infantis, centravam-se em negar que tiveram impacto nas crianças. Este argumento foi fácil de destruir, com a pergunta que lhes fiz diante do Congresso:

“Se vocês acreditam que seus programas não têm impacto entre as crianças, por que cada anúncio comercial que aparece nestes programas custa quase um milhão de dólares?”. Não responderam. Negar que tais programas tenham um impacto nos espectadores é absurdo. O Congresso dos EUA, por certo, não fez nada, pois não ousava contrariar estes grupos poderosos.

A situação está se deteriorando

E a situação está inclusive pior atualmente. Esta fixação infantil pela mídia audiovisual está amplamente estendida, agora por meio dos videogames, que estão substituindo a televisão. O grau de exposição das crianças aos videogames alcançou um nível que ultrapassa em muito o tempo à frente da televisão. A transmissão dos valores por meio dos jogos eletrônicos, citados anteriormente, é massiva. É o equivalente ao fast food no universo psicológico, cultural e intelectual.

Tanto que, em vários países europeus, se considera proibir a importação de videogames dos EUA (que são extraordinariamente mais violentos), que destroem massivamente meninos e meninas. Acredito que as autoridades públicas espanholas deveriam considerar sua proibição, como já acontece em vários países da Europa.

Porém, para além da destruição que muitos desses videogames provocam na infância, a exposição a essa cultura tira as crianças de outras atividades. Existe evidência de que, quanto maior o tempo dedicado aos videogames, menor é a capacidade de leitura e de compreensão de textos. A leitura de livros – dos clássicos da infância, de Heidi ao Pequeno Príncipe – está diminuindo muito rapidamente. Serei criticado sob a alegação de que este texto denota nostalgia, o que não é certo, pois minha crítica não é ao fato de não lerem esses textos, mas sim à ausência de leitura desse tipo de texto, em que a narrativa conecta o indivíduo com a realidade que o cerca, ajudando a desenvolver uma visão solidária, amável e coletiva da sociedade. Enfatizar a força, o ego, o “eu” e a satisfação rápida e imediata do desejado, sem freios, levará todos nós a um suicídio coletivo.

E me preocupa o fato de que isto já esteja acontecendo. Se desejam ver seu futuro, vão agora aos Estados Unidos e o verão. As mudanças sofridas desde a década de 1980, quando se iniciou o período neoliberal com Reagan e Thatcher, foram enormes. O neoliberalismo, a exaustação ao "êxito" sem freios, ao individualismo, ao narcisismo, ao darwinismo, inundaram todas as áreas da cultura da infância.

As meninas como objeto sexual

Outro elemento da deterioração da cultura infantojuvenil está na reprodução dos estereótipos, por trás da qual há uma relação de poder. Um dos mais marcados é o que reproduz a visão machista da sociedade, apresentando as mulheres como objetos eroticamente desejados, e que, notavelmente, afeta a infância. Essa visão já alcançou dimensões patológicas. Nos países mais machistas (e a Espanha está no topo da lista), a mulher está sempre muito decotada (e cada vez mais) e, se não, vejam os noticiários diários. Por que os homens não vão decotados à televisão quando dão as notícias, mas sim as mulheres?

A imagem erótica, com uma definição de beleza estabelecida pelo homem, está alcançando nível tamanho de exagero, que começa inclusive com as bonecas Barbie. Vários países europeus – como a França – estão pensando em proibir tais tipos de boneca. Está chegando a um nível que exige uma mobilização, protestando contra essa destruição por meio da promoção de valores que são prejudiciais à infância e à população em geral. Espero que o leitor se some a essas mobilizações. Se você ama seu país, sugiro que faça algo. Não deixe que manipulem nem a você, nem a seus filhos, filhas, netos e netas. Indigne-se! Faça algo!

...

(*) Professor de Políticas Públicas. Universidade Pompeu Fabra, em Barcelona, e professor da Johns Hopkins University. Site pessoal: www.vnavarro.org

Reproduzido de Carta Maior

26 jan 2014

Leia também:

"A TV psicotizante na globobocalização" (27/01/14) por Leo Nogueira Paqonawta, clicando aqui.

quinta-feira, 26 de julho de 2012

“Mãe, eu quero. Você compra?”


Publicidade para Crianças

“Mãe, eu quero. Você compra?”

Por Rosely Arantes em 24/07/2012 na edição 704

A frase do título, que muitas vezes culmina em uma discussão, tem feito parte do dia a dia da maioria das famílias brasileiras nos últimos tempos. Discutir os limites das crianças frente ao que é apresentado nas televisões, via publicidade, é algo que muitas vezes está além do alcance das mães, pais e até educadores. Não raro vemos matérias, baseadas em pesquisas ou estudos psicológicos, que desvendam os caminhos para a atuação, para não dizer manipulação e controle, sobre o público infantil numa tentativa de reforçar o apelo de compra.

Contrariando um caminho trilhado, há anos, por diversos países com democracias consolidadas, como a Suécia, Alemanha, Austrália, Espanha (Catalunha), Chile, Estados Unidos, Holanda, Nova Zelândia, Portugal e Reino Unido, o Brasil continua permitindo que a publicidade seja direcionada ao público infantil. Mesmo que a criança e o adolescente sejam considerados públicos prioritários pela Constituição brasileira e reforçado no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), eles continuam sendo alvo das propagandas e do merchandising, instrumentos da publicidade,que os utilizam como mecanismo de “fidelização” de um futuro consumidor e, ultimamente, definidor de compras da família, numa estratégia de infantilizar o adulto e dar uma ideia de maturidade às crianças, numa troca de responsabilidades vil.

O que é mais estranho é que todas essas ações, que são consideradas violações de direitos, dão-se no espaço público do audiovisual, ou seja, nas rádios e televisões, que são concessões públicas. Para ser mais clara, é de propriedade do Estado o espectro eletromagnético que é temporariamente cedido a determinadas empresas de comunicação. E como parte das regras desta concessão está a atenção ao que já é estabelecida em lei, como informado no parágrafo acima. Como afirma o mestre em Ciência Política, pela Universidade de São Paulo, professor Guilherme Canela, “se o Estado (governo e sociedade) acorda institucionalmente que esse recorte etário merece prioridade absoluta, à mídia não é conferido nenhum salvo-conduto para se escusar de cumprir suas responsabilidades, especialmente porque radiodifusores são operadores de concessões públicas do Estado e da sociedade”.

Programação para todos os públicos

Esse “descumprimento” do acordo entre o Estado e o mercado ultrapassa também outras esferas, como a regulamentação do setor, defendida por organizações da sociedade civil e pesquisadores da área. No Brasil, o próprio mercado publicitário regulamenta toda a publicidade mercadológica por meio do Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar), que estabelece as normas e julga os casos que porventura sejam enviados por entidades representativas ou cidadãos comuns. Para o presidente da entidade, Gilberto Leifert, as tentativas de regulamentação revelam que o Estado não acredita no poder de discernimento do cidadão. “É um evidente paradoxo. Muitas vezes, o projeto de lei ou a intervenção do Estado sugere que o cidadão é considerado plenamente capaz apenas para constituir família, eleger representantes políticos, pagar impostos, mas seria incapaz de fazer escolhas a partir da publicidade”, afirma.

Outra prova da complexidade do que estamos falando se deu com a retirada do programa infantil diário TV Globinho, substituído por um voltado para o público adulto capitaneado pela jornalista Fátima Bernardes nas manhãs na TV Globo. A emissora, que já chegou a apresentar O Sítio do Pica-Pau Amarelo, Vila Sésamoe Xou da Xuxa, apresentou como argumentação que a grade infantil não dá nem audiência, nem receita publicitária, e diz seguir tendência internacional de deixar as crianças para a TV paga. Segundo a empresa, o canal fechado seria um espaço menos sujeito a controle externo, como classificação indicativa, sugerida pelo governo e proibições à publicidade infantil (como limite à propaganda de alimentos e ao uso de desenhos para seduzir o público-alvo). “O segmento infantil está na TV paga porque lá não tem censura nem restrição à propaganda”, diz Luís Erlanger, diretor da Central Globo de Comunicação. Importante questionar, neste caso, como ficam as crianças que não têm TV paga, já que o lazer e entretenimento também são direitos e a TV é uma concessão pública? Isso sem falar que como concessionária de um serviço público a empresa deve cumprir com o regulamento que prevê programação para todos os públicos.

Direito de ter brinquedo

Mas muitas pesquisas e estudos também são realizados para medir o impacto da publicidade no desenvolvimento psíquico e emocional, atual e futuro, das crianças e adolescentes. E os resultados são alarmantes. Segundo o Instituto Alana, organização não governamental de defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes em relação ao consumo em geral, bem como ao excessivo consumismo ao qual são expostas, as crianças são mais vulneráveis que os adultos e sofrem cada vez mais cedo com as graves consequências relacionadas aos excessos do consumismo, por estarem em pleno desenvolvimento. Para o Alana, são consequências danosas à exposição excessiva a obesidade infantil, a erotização precoce, o consumo precoce de tabaco e álcool, o estresse familiar, a banalização da agressividade e violência, entre outras.

Mas como não se mudam leis e costumes num passe de mágica, algumas tentativas de minar o poderio do mercado e proteger as crianças têm sido realizadas. Cabe registrar que está em tramitação no Congresso Nacional, há mais de dez anos, um projeto de lei que proíbe a publicidade de produtos infantis (PL 5921/01). O texto, de autoria do deputado Salvador Zimbaldi (PDT-SP), que faz parte da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática, já foi alterado nas comissões de Defesa do Consumidor e de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio. Para o relator, “é necessária uma lei sobre publicidade infantil porque o Conselho de Autorregulamentação Publicitária (Conar) não tem sido eficaz”. Depois que Zimbaldi apresentar o parecer, a proposta seguirá para a Comissão de Constituição e Justiça em caráter conclusivo.

O anteprojeto encontra bastante resistência por parte do setor empresarial, especialmente o de brinquedos. Para o presidente da Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos (Abrinq), que também é presidente da Fundação Abrinq, Synésio Batista, a publicidade infantil é fundamental já que toda criança tem o direito de ter brinquedo e a publicidade ajuda a aumentar a produção, despertando o interesse e deixando a criança informada, “não se oferece um produto dizendo o que ele não tem”, afirma Batista.

Discurso mágico

Outra forma de quebrar o bloqueio empresarial está na capacidade de organização da sociedade. Já é possível perceber que há intervenção de diversos setores desta na defesa pela regulamentação e isso tem mexido na estrutura de poder e aberto diversas frentes de debates sobre o tema criança e consumismo, especialmente nas redes sociais. Por conta disso, algumas campanhas publicitárias foram tiradas do ar. A mais recente foi o parque Mundo da Xuxa, que foi notificada pelo Procon/SP, e não pelo Conar, que apresentou como justificativa “o potencial de induzir o público infantil a atitudes que gerem risco à segurança e a saúde”. Importante registrar que esta campanha só saiu do ar depois que o coletivo Infância Livre de Consumismo (ILC), junto com outros movimentos e organizações, registrou queixas contra a propaganda. Este é outro exemplo de organização. Já as empresas Nestlé, Mattel, Habib’s, Dunga Produtos Alimentícios Ltda. (Biscoito Spuleta) e Roma Jensen (Roma Brinquedos) receberam as multas, também do Procon/SP, na semana passada, num total de mais de R$ 3 milhões, por campanhas publicitárias abusivas dirigidas ao público infantil. Estas últimas também foram resultado de mobilização de organizações da sociedade civil.

O Infância Livre de Consumismo (ILC) é um coletivo de pais, mães e cidadãos inconformados com a publicidade dirigida às crianças que nasceu como contraponto a campanha “Somos todos responsáveis”, promovido pela Associação Brasileira das Agências de Publicidade (ABAP). “Por mais informadas e conscientes que sejam as famílias, os pais não têm como combater um discurso mágico e atraente feito por adultos pertencentes a grandes e poderosos conglomerados empresariais, com alto poder econômico, que detêm pesquisas psicossociais, de mercado e até mesmo neurológicas”, avalia Marina Machado de Sá, publicitária e mestre em Políticas Públicas, uma das fundadoras do coletivo Infância Livre de Consumismo (ILC).

“Atentado à liberdade de expressão comercial”

Já a campanha “Somos todos responsáveis” defende que apenas os pais seriam os responsáveis pela proteção das crianças diante dos estímulos abusivos das propagandas ao consumismo. Para eles é importante, necessária e sadia submeter às crianças à informação. “Se a ideia é proteger as crianças da mídia, não adianta mais desligar a televisão, abaixar o volume do rádio e ficar longe das bancas de jornais”, diz Dalton Pastore, presidente do Conselho Superior da Abap. “A questão é mais complexa e merece uma discussão mais profunda, baseada em educação, e não em proibição”, complementa.

No entanto, atitudes como esta isentam o Estado e o mercado (empresas e publicitários) de quaisquer responsabilidades sobre a publicidade dirigida às crianças. “Nesta relação, fica patente a vulnerabilidade das famílias, da comunidade e da própria criança diante do discurso mercadológico”, alerta Mariana Sá.

Um alerta interessante feito por essas organizações diz respeito aos problemas causados ao meio ambiente. Segundo o ILC, o excesso de propagandas e conteúdo manipulatório dirigidos ao público infantil dificulta a educação cidadã e sustentável e vai contra a formação de um consumidor consciente, justo num momento em que o mundo repensa formas de consumo sustentáveis.

Assim cabe uma reflexão sobre o que está por trás dessa resistência do mercado no diálogo sobre a regulamentação do setor. É importante e urgente entender que isso é uma das pontas do iceberg chamado democratização da comunicação. Tema este que merece ser aprofundado, especialmente para entender o porquê de o discurso mercadológico estar baseado na censura e na defesa da liberdade de expressão. Como bem afirma Gilberto Leifert, a proibição de propaganda infantil é um “atentado à liberdade de expressão comercial”. Num país que acabou de sair de um processo de ditadura onde o calar foi um dos recursos mais (bem) utilizados, qualquer aceno que relembre esse momento é evidentemente danoso, significativo e causa aversão. Segundo o coordenador executivo da organização Andi Comunicação e Direitos, Veet Vivart, “associar a regulação, que é um instrumento democrático, interdita o debate”.

Cúmplices de violações

Daí surge outro debate sobre o porquê da importância dos pais, mães e demais responsáveis pelo cuidado direto de crianças e adolescentes, dizerem “não” aos constantes pedidos de “compra” emitidos por eles. Dizer não além de ser educativo, ajuda a criançada a entender que a vida não é o “céu de brigadeiro” que a TV mostra. Dito isso, é salutar compreender que um dos recursos da publicidade é o de se aproveitar do (grande) tempo que as crianças ficam exposta a programas televisivos, longe da presença de adultos, para impor uma lógica de consumo desenfreado, por meio de técnicas de aborrecimento (onde vencem pelo cansaço), aumento do volume no momento dos comerciais, o uso constante de merchandising, entre outras. Para se ter uma ideia do que estamos falando, as crianças brasileiras ficam até cinco horas na frente da TV, diferentemente de outros países, inclusive os Estados Unidos. No final, temos crianças obesas, sedentárias, doentes e mal informadas, para não aprofundar mais neste debate.

No final, a maioria dos pais e mães que trabalham fora de casa e, portanto, ficam longe de seus filhos, vê-se obrigado a comprar, atendendo aos pedidos insistentes do filho, na tentativa de suprir o tempo perdido. Mas é preciso entender que não se compra tempo, atenção e afeto, especialmente das crianças. Faz-se necessário e urgente refletir e criar estratégias de recompensa desse tempo a partir de momentos de aproximação, conversa, troca e atenção, onde os pais e mães fiquem com suas crianças e promovam momentos de interação com eles. Isso vale muito mais do que um brinquedo, na maioria das vezes caro, que será deixado de lado, em breve. Sem contar que é fundamental avaliar o pedido de compra. Afinal, é algo que vai ser realmente utilizado pela criança, é adequado para a idade, vai ajudá-lo de alguma forma, que habilidades serão desenvolvidas? Porquedo contrário, a velha resposta do “porque agora não tenho dinheiro”, atrapalha por não acrescentar, por não ajudar a pensar de forma sustentável e educativa. O “não” tem de estar embasado em outras motivações.

Importante resgatar que o processo de debate e regulação proposto pela sociedade civil é algo que deve inclusive acontecer dentro da esfera pública do Estado. Afinal,cabe a este ente promover e induzir os processos de garantia de direitos, uma vez que ele é o representante formal, referendado noutro processo democrático de consulta pública.

Por fim, quero lembrar que este é mais um ano de eleições e que estaremos escolhendo a/os nossa/os futura/os representantes à Prefeitura e Câmara de Vereadores. Em dois anos, escolheremos a/o presidente, governadores, senadores e deputados. E quantas vezes procuramos saber qual o plano de governo que eles propõem, nossas demandas de focar as crianças estão contempladas ou mesmo se acompanhamos esses compromissos pleiteados durante a campanha? Acredito que não. Normalmente preferimos nos omitir sob a desculpa de que política é lugar de corrupção, privilégios e impunidade. No entanto, essa postura nos coloca como cúmplice das inúmeras violações direcionadas a população infanto-juvenil brasileira.

***

[Rosely Arantes é jornalista, educadora popular e especialista em Gestão Estratégica Pública]

24 jul 2012

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Folha de São Paulo: Audiência e falta de anunciantes reduzem os infantis globais


Audiência e falta de anunciantes reduzem os infantis globais

Anna Virginia Balloussier*
Folha de S. Paulo
De São Paulo
08/04/2012

Querida, encolheram as crianças. Na TV aberta, ao menos, a programação para essa faixa etária ficará em breve mais "baixinha".

A Globo, que já colocou em sua linha de frente programas como "Vila Sésamo" e "Xou da Xuxa", argumenta agora que a grade infantil não dá nem audiência, nem receita publicitária. E decidiu acabar com os 60 minutos diários dedicados à criançada.

Com os desenhos "Homem de Ferro" e "Bob Esponja", a "TV Globinho" sairá das manhãs de segunda a sexta -continua aos sábados, com "Sítio do Picapau Amarelo" e "Turma da Mônica".

Abre espaço para o programa de Fátima Bernardes, que deve estrear no segundo semestre, vizinho ao Ana Maria Braga. É comum que "Globinho" empate com "Hoje em Dia", feminino da Record.

A Globo diz seguir tendência internacional: deixar os pequenos para a TV paga. Seria um espaço menos sujeito a controle externo, como classificação indicativa, sugerida pelo governo, e proibições à publicidade infantil (como limite à propaganda de alimentos e ao uso de desenhos para "seduzir" o público-alvo).

Dos dez canais por assinatura mais assistidos em fevereiro, quatro eram para menores -campeão (Discovery Kids) e vice (Cartoon) inclusos.

"O segmento infantil está na TV paga porque lá não tem censura nem restrição à propaganda", diz à Folha Luis Erlanger, diretor da Central Globo de Comunicação.

CADA UM NO SEU GALHO

As crianças ainda veem TV, como prova o "boom" de canais pagos. A Globosat se prepara o lançamento do canal Gloob. Na "Globo mãe", afirma Erlanger, "não estamos deixando de fazer programação que interesse à criança, mas que interesse apenas à criança".

Para especialistas, a Globo largou o osso justamente por falar a um público genérico demais. Ex-secretário do Audiovisual (em 2010), Newton Cannito diz que "a programação precisa ser muito segmentada dentro do próprio segmento". Pais com filhos de várias idades sabem direitinho do que ele está falando.

"São diversas faixas etárias que concorrem entre si. Até os seis anos é uma. Dos sete aos dez, é outra. E ainda começa uma subdivisão entre gêneros: o que agrada ao menino não agrada à menina."

Para piorar, na TV aberta, o modelo é baseado na venda de anúncios, com pouco "branding" - basicamente, a gestão de uma marca de modo que ela grude como chiclete na cabeça do consumidor.

Exemplo: se você quer vender uma Barbie, cria um universo em volta dela (de desenhos temáticos a virais na internet), em vez de comerciais tradicionais de 30 segundos.

Outra brecha: os canais pagos avançam a passo largo, mas ainda atingem menos de 25% da população. E o resto da garotada, assiste a o quê?

A tendência é que as emissoras abertas foquem em seus pontos fortes. Em março, o diretor-geral da Globo, Octávio Florisbal, já disse que o SBT faz "muito bem" a grade infantil. O canal dedica sete horas diárias ao gênero e detém o pacote Disney/Warner.

Em sua autobiografia, o ex-executivo global José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, questiona: "Com tantos canais [...] transmitindo toneladas de lixo estrangeiro, não seria a hora de as redes abertas deixarem esse tipo de produto apenas para o sábado, quando não há aula?".

Indaga, por fim, se "deu curto-circuito na babá eletrônica". O apagão já começou.


*Colaborou Elisangela Roxo


Reproduzido de Clipping FNDC
08 abr 2012

Grifos de Filosomídia

Comentários de Filosomídia:

Pois então, se para a Globo os canais de TV aberta estão mais sujeitos ao controle externo "como classificação indicativa, sugerida pelo governo, e proibições à publicidade infantil (como limite à propaganda de alimentos e ao uso de desenhos para "seduzir" o público-alvo)", e seus "investimentos" em programação infantil se farão em seu canal fechado - Gloob a inaugurar - resta saber se a rede de televisão estará respeitando os princípios éticos e determinados em lei em relação à classificação indicativa e publicidade infantil.

Se a estratégia da Globo passa por seguir essa tendência mundial (onde há controle externo e legislação específica de proteção aos direitos das crianças em relação à programação de TV e publicidade), e sabendo que no Brasil a completa desregulação em relação a isso favorece que na TV aberta ou  fechada é ainda possível de desrespeitar ostensivamente aqueles princípios éticos, não seria de se supor que as crianças ainda sejam vistas apenas como mera consumidoras de produtos anunciados no decorrer da programação?

O debate está posto sobre o controle social nos meios de comunicação e, o que não se pode "apagar" é a luta pela dignidade e repeito aos direitos humanos das crianças e adolescentes em relação aos meios de comunicação. 

Como estamos no Brasil, país da desregulação dos meios de comunicação e da falta de compromisso de seus políticos em defender os direitos das crianças e adolescentes, país onde a própria Justiça se faz de cega aos desrespeitos da legislação internacional e nacional e abre os olhos para as determinações do mercado, creio que muita luta será ainda necessária para se ter que seja o mínimo compromisso ético dos homens e mulheres em cargos públicos a defender e promover a dignidade dos direitos.

Sabidamente, não é a criança na dignidade de seus direitos que é esquecida pela programação infantil na TV, aberta ou fechada. Muito pelo contrário, o pequeno, mas grande e ávido consumidor é que é visado pelas redes de comunicação que no final das contas quer lucrar em cima de uma programação infantil que atenda aos interesses do mercado.

A questão é de estratégia para o lucro, e de aumentar esse lucro através de cooptar mais assinantes na TV paga. Ora, a Rede Globo, Fox, Net, Sky não são farinha do mesmo saco, empresas de um mesmo dono?

Que as crianças não se "afoguem" nesse maremoto de publicidade infantil que virá disfarçada de programação destinada especificamente para elas. Glub... glub... glub...

Pela classificação indicativa dos telejornais, pela não erotização precoce, pelo fim da violência na TV, já!


sábado, 1 de outubro de 2011

Prix Jeunesse Internacional abre inscrições 2012: “Assista, aprenda e cresça com a TV infantil”


Encontro de TV Infantil abre o seu período de inscrições

O Prix Jeunesse Internacional convida produtores de programas televisivos infanto-juvenis ou de conteúdos interativos diversos a inscrever-se em sua programação, que vai muito além da competição. Dentro da semana em que ocorrerá este importante evento, haverá mostras, grupos de discussão compostos por profissionais de vários países e a divulgação científica das mais novas pesquisas sobre infância e mídia. Tudo isso de 1 a 6 de junho em Munique (Alemanha).

O tema da edição 2012 é: Watch, learn and grow with children’s television (“Assista, aprenda e cresça com a TV infantil”), com a ideia de investigar quais são os modos com os que os produtores podem incentivar a curiosidade das crianças pela vida. Não é necessário que os programas inscritos tenham esse tema

Para mais informações e para ver o regulamento da competição, visite:

Prazo para o envio de materiais para a competição: 12 de dezembro de 2011

Prazo para inscrição de participantes: 30 de abril de 2012

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

O estranho mundo que se mostra às crianças: Fanny Abramovich


O estranho mundo que se mostra às crianças

Fanny Abramovich

No artigo sobre a televisão a autora traz uma discussão realizada com diversas crianças sobre os programas televisivos destinados a elas. O objetivo era mostrar àqueles que fazem televisão a necessidade de considerar a opinião das crianças, antes de produzir algo para elas. Ainda sobre esse tema, Fanny propõe um teste para que os adultos pensem sobre a programação dirigida às crianças. Segundo ela, tais programas apresentam uma visão deformada de infância e não estimulam em nada seus espectadores.

Nesse livro, a autora reúne alguns de seus artigos publicados, em diferentes momentos, a respeito do amplo universo dos produtos culturais dirigidos ao público infantil, como a literatura, a música, o teatro, a televisão e os brinquedos, convidando-nos a uma leitura crítica de tais produtos. Inicia sua análise pela literatura infantil, descrevendo os modelos seguidos pelas principais editoras da época, revelando os diversos conceitos, valores, padrões éticos e culturais difundidos por essas entre as crianças.

Uma das propostas literárias mais focadas e discutidas pela autora no livro é a de Monteiro Lobato, publicada pela editora Brasiliense. Esta parece ser uma das únicas obras que não critica negativamente, pelo contrário, em suas descrições Fanny se revela uma grande fã de seus pensamentos e produções, inclusive escreve um artigo exclusivamente sobre o autor, apontando diversas opiniões encantadas de leitores a respeito de Lobato.

Apresenta um artigo sobre o que as crianças sabem sobre os livros escritos para elas, trazendo um registro de depoimentos realizados com várias crianças sobre os livros já lidos por elas e um outro artigo sobre literatura juvenil, baseado também numa seleção de entrevistas e depoimentos sobre essa literatura.

Nesse livro ainda, comenta criticamente sobre os discos e as músicas destinadas às crianças, demonstrando um panorama desolador, pois diz que as produções musicais infantis não apresentam renovação e nem criatividade, prevalecendo produções da década de 40. Assinala também, através de depoimentos, o que as crianças pensam sobre as músicas destinadas a elas.

No artigo sobre teatro infantil, Fanny analisa várias peças, descrevendo-as, literalmente, como tragédia para o público infantil. Fala sobre a falta de imaginação dos autores do gênero e pesquisa várias opiniões sobre o mesmo. Insiste que seria necessária uma grande melhora dessa produção, para realmente interessar as crianças.

No artigo sobre a televisão a autora traz uma discussão realizada com diversas crianças sobre os programas televisivos destinados a elas. O objetivo era mostrar àqueles que fazem televisão a necessidade de considerar a opinião das crianças, antes de produzir algo para elas. Ainda sobre esse tema, Fanny propõe um teste para que os adultos pensem sobre a programação dirigida às crianças. Segundo ela, tais programas apresentam uma visão deformada de infância e não estimulam em nada seus espectadores.

O último capítulo do livro é destinado à análise dos brinquedos: de que materiais são feitos e com qual finalidade. Para a autora, cada vez estes objetos conseguem “brincar sozinhos”, pois não incentivam a criatividade das crianças. Fanny ressalta que os brinquedos devem ser de materiais resistentes e convidativos, devem encantar, despertar experiências, permitir que a criança invente.

De acordo com ela, aqueles que mais se aproximam desse ideal são os brinquedos da cultura popular. Assim como na análise da televisão, Fanny apresenta as críticas e sugestões do público infantil sobre os brinquedos.

Na parte final, também analisa os brinquedos situados no espaço externo, verificando praças de diversas cidades e consultando arquitetos e crianças, bem como as possibilidades que propõem.

Deixamos a todos o convite que a leitura de Fanny Abramovich nos fez: desenvolver um olhar crítico sobre esse “estranho mundo que se mostra às crianças”, buscando transformá-lo para melhor. E isso demanda, sempre, ouvir o que elas têm a nos dizer.

Resenha extraída de Roda de Leitura Virtual (2009) 

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Televisão e crianças íbero-americanas


III Muestra Iberoamericana de Televisión Infantil

La Comisión Nacional de Televisión (CNTV), en cumplimiento de la obligación de estimular las actividades nacionales de producción vinculadas al servicio de la televisión pública, realizó durante los días 11, 12 y 13 de mayo de 2011 la III Muestra Iberoamericana de Televisión Infantil, con el propósito de articular esfuerzos en la creación y consolidación de contenidos audiovisuales de calidad, vinculados a las audiencias infantiles de la región.

Con este esfuerzo, la CNTV fortalece la generación de contenidos audiovisuales colombianos e impulsa la búsqueda de oportunidades de negocio para diferentes agentes del mercado regional de la televisión infantil.

La participación de cerca de 600 productores, la proyección de 60 productos audiovisuales, la presentación de 45 proyectos en busca de productores, la intervención de colegios públicos y privados, y la exhibición de quince estands para canales de televisión y productores, hacen de la III Muestra Iberoamericana de Televisión Infantil, la feria de productos audiovisuales más importante de Latinoamérica, ya que muestra lo mejor de la programación infantil desde la Patagonia hasta México, con escala especial en España.

Leia mais sobre o evento realizado de 11-13 de maio de 2011, em Bogotá/Colômbia, clicando aquiali.