quinta-feira, 17 de março de 2016

Democracia em Risco, por Mario Novello


Democracia em Risco

Mario Novello*

Os últimos acontecimentos estão levando a acreditar que no Brasil estamos assistindo à elaboração e execução de um golpe de estado pós-moderno: sem o exército nas ruas, mas com uma parte considerável da Justiça cooptada por políticos revanchistas que não aceitaram o desfecho das urnas e a vontade soberana da população brasileira na última eleição presidencial.

Imaginar que um juiz, que deveria estar subordinado às Leis da República, possa ter a ousadia de interferir, como um reles espião de folhetim, em conversas privadas da Presidência da República, constitui gravíssimo crime de lesa-pátria.

Com que então esse juiz se acha acima das Leis em conluio estreito com o perverso sistema midiático, com jornais e canais de televisão, colocando-se ao lado de setores retrógrados, iludindo a população através de uma sistemática e maciça enxurrada de notícias falsas e de orientação nitidamente golpista.

Anne-Cécile Robert, no número de fevereiro do Le Monde Diplomatique, refere-se ao sucesso midiático de certas mentiras travestidas de notícias e com muita propriedade chama esse procedimento de “A estratégia da Emoção”. Trata-se de retirar ou diminuir a reflexão racional sobre os fatos corriqueiros, substituindo-os por cenários onde a emoção e a ideologia predominam sobre qualquer reflexão racional.

O que a imprensa brasileira capitaneada pela Rede Globo, vem fazendo nos últimos meses, se insere perfeitamente nessa interpretação.

Senão, como entender que pessoas comuns, brasileiros, vivendo nesse país, possam aplaudir e demonstrar satisfação quando um juiz, indigno desse nome, investiga sub-repticiamente, escondido através de uma máquina policialesca, as comunicações privadas de nossa presidente? Como se orgulhar de um ato irregular, proibido pela constituição?


Estamos deixando de ser homens completos, razão e emoção, ao nos subjugarmos a instintos básicos, a ideologias ditatoriais, manipulados por um perverso e poderoso sistema de informação.

Quando não atentamos para o rigor ético e jurídico das ações de nossos juízes, é porque já fomos consumidos pelas práticas mais perversas e irracionais.

Esse procedimento tem nome: Fascismo.

É contra a ascensão do fascismo, com uma cara nova, que devemos terçar armas.

Quando a imprensa e a mídia em geral se associam a uma parcela, não-pequena do poder judiciário e policial, uma face nova do fascismo aparece. Ela não requer policiais às nossas portas, mas sim, a presença contínua e ininterrupta de informações falsas.

Triste o povo que não aprendeu com sua história. Pior do que os militares de 64, os fascistas de hoje, Jornal O Globo à mão, não querem permitir nenhuma forma de reflexão e de alternativa ao que consideram sua verdade, arrogante e poderosamente montada sobre um sistema de desinformação. Numa eficácia que deixaria Goebbels orgulhoso.

Reproduzido de Cosmo e Contexto
17 mar 2016

Créditos da imagem:
Manifestação do movimento Diretas Já, em 1984
Foto, parte da exposição “O Museu e a Cidade Sem Fim, em comemoração aos 70 anos do o Museu Histórico Abílio Barreto (MHAB) que aconteceu de 27/11 a 31/12.
https://www.flickr.com/photos/agenciasenado/12745266813


* Foi nomeado em setembro de 2012 Professor Emérito do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas por sua atuação como cientista e formador de cientistas durante os 40 anos que trabalhou como pesquisador no CBPF. Recebeu em 2004 o título de Doutor Honoris Causa pela Universidade de Lyon (França) por seus estudos sobre modelos cosmológicos sem singularidade. Recebeu em 2006 um prêmio do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas por ter sido o cientista que mais orientou Teses de mestrado e doutorado na história do CBPF. Elaborou em 1979 o primeiro modelo cosmológico com solução analítica que possui "bouncing" (ricochete), isto é, neste modelo o Universo possui uma fase anterior de colapso, onde o volume total do espaço diminuiu com o tempo, atingido um valor mínimo e, depois, passado a se expandir. Foi nomeado em 2008 "Cesare Lattes ICRANet Professor" pelo Comitê Científico do International Center for Relativistic Astrophysics (ICRANet), presidido pelo Prêmio Nobel da Física (2002) Riccardo Giacconi. Em novembro de 2010 foi homenageado pela Comunidade Científica Internacional com o I Symposium Mario Novello on Boucing Models. Em agosto de 2012 foi homenageado com o 70th Anniversary Symposium Mario Novello. Criou em 1976 o grupo de Cosmologia e Gravitação no CBPF, inaugurando em nosso país o estudo sistemático da Cosmologia. Em 2003 criou o Instituto de Cosmologia Relatividade e Astrofisica (ICRA) que foi alocado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia sob o guarda-chuva institucional do CBPF. Possui doutorado em Física - Université de Génève (1972) sob a orientação do Professor J. M. Jauch. Possui mestrado em Física pelo Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (1968) sob orientação do Professor José Leite Lopes. Escreveu, entre outros livros, "O que é Cosmologia?" pela Editora Jorge Zahar, onde identifica a função da Cosmologia como uma re-fundação da Física. Fonte: Lattes

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