Democracia em Risco
Mario Novello*
Os últimos
acontecimentos estão levando a acreditar que no Brasil estamos assistindo à
elaboração e execução de um golpe de estado pós-moderno: sem o exército nas
ruas, mas com uma parte considerável da Justiça cooptada por políticos
revanchistas que não aceitaram o desfecho das urnas e a vontade soberana da
população brasileira na última eleição presidencial.
Imaginar que um
juiz, que deveria estar subordinado às Leis da República, possa ter a ousadia
de interferir, como um reles espião de folhetim, em conversas privadas da
Presidência da República, constitui gravíssimo crime de lesa-pátria.
Com que então
esse juiz se acha acima das Leis em conluio estreito com o perverso sistema
midiático, com jornais e canais de televisão, colocando-se ao lado de setores retrógrados,
iludindo a população através de uma sistemática e maciça enxurrada de notícias
falsas e de orientação nitidamente golpista.
Anne-Cécile
Robert, no número de fevereiro do Le Monde Diplomatique, refere-se ao sucesso
midiático de certas mentiras travestidas de notícias e com muita propriedade
chama esse procedimento de “A estratégia da
Emoção”. Trata-se de retirar ou diminuir a reflexão racional sobre os fatos
corriqueiros, substituindo-os por cenários onde a emoção e a ideologia
predominam sobre qualquer reflexão racional.
O que a
imprensa brasileira capitaneada pela Rede Globo, vem fazendo nos últimos meses,
se insere perfeitamente nessa interpretação.
Senão, como
entender que pessoas comuns, brasileiros, vivendo nesse país, possam aplaudir e
demonstrar satisfação quando um juiz, indigno desse nome, investiga
sub-repticiamente, escondido através de uma máquina policialesca, as
comunicações privadas de nossa presidente? Como se orgulhar de um ato
irregular, proibido pela constituição?
Dizia o literato
famoso: “Os
macacos escolhem os fins, só os meios são do homem”.
Estamos
deixando de ser homens completos, razão e emoção, ao nos subjugarmos a
instintos básicos, a ideologias ditatoriais, manipulados por um perverso e
poderoso sistema de informação.
Quando não
atentamos para o rigor ético e jurídico das ações de nossos juízes, é porque já
fomos consumidos pelas práticas mais perversas e irracionais.
Esse
procedimento tem nome: Fascismo.
É contra a
ascensão do fascismo, com uma cara nova, que devemos terçar armas.
Quando a
imprensa e a mídia em geral se associam a uma parcela, não-pequena do poder
judiciário e policial, uma face nova do fascismo aparece. Ela não requer
policiais às nossas portas, mas sim, a presença contínua e ininterrupta de
informações falsas.
Triste o povo
que não aprendeu com sua história. Pior do que os militares de 64, os fascistas
de hoje, Jornal O Globo à mão, não querem permitir nenhuma forma de reflexão e
de alternativa ao que consideram sua verdade, arrogante e poderosamente montada
sobre um sistema de desinformação. Numa eficácia que deixaria Goebbels
orgulhoso.
Reproduzido de Cosmo e Contexto
17 mar 2016
Créditos da
imagem:
Manifestação do
movimento Diretas Já, em 1984
Foto, parte da
exposição “O Museu e a Cidade Sem Fim, em comemoração aos 70 anos do o Museu
Histórico Abílio Barreto (MHAB) que aconteceu de 27/11 a 31/12.
https://www.flickr.com/photos/agenciasenado/12745266813
* Foi
nomeado em setembro de 2012 Professor Emérito do Centro Brasileiro de Pesquisas
Físicas por sua atuação como cientista e formador de cientistas durante os 40
anos que trabalhou como pesquisador no CBPF. Recebeu em 2004 o título de Doutor
Honoris Causa pela Universidade de Lyon (França) por seus estudos sobre modelos
cosmológicos sem singularidade. Recebeu em 2006 um prêmio do Centro Brasileiro
de Pesquisas Físicas por ter sido o cientista que mais orientou Teses de
mestrado e doutorado na história do CBPF. Elaborou em 1979 o primeiro modelo
cosmológico com solução analítica que possui "bouncing" (ricochete),
isto é, neste modelo o Universo possui uma fase anterior de colapso, onde o
volume total do espaço diminuiu com o tempo, atingido um valor mínimo e,
depois, passado a se expandir. Foi nomeado em 2008 "Cesare Lattes ICRANet
Professor" pelo Comitê Científico do International Center for Relativistic
Astrophysics (ICRANet), presidido pelo Prêmio Nobel da Física (2002) Riccardo
Giacconi. Em novembro de 2010 foi homenageado pela Comunidade Científica
Internacional com o I Symposium Mario Novello on Boucing Models. Em agosto de
2012 foi homenageado com o 70th Anniversary Symposium Mario Novello. Criou em
1976 o grupo de Cosmologia e Gravitação no CBPF, inaugurando em nosso país o
estudo sistemático da Cosmologia. Em 2003 criou o Instituto de Cosmologia
Relatividade e Astrofisica (ICRA) que foi alocado pelo Ministério da Ciência e
Tecnologia sob o guarda-chuva institucional do CBPF. Possui doutorado em Física
- Université de Génève (1972) sob a orientação do Professor J. M. Jauch. Possui
mestrado em Física pelo Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (1968) sob
orientação do Professor José Leite Lopes. Escreveu, entre outros livros,
"O que é Cosmologia?" pela Editora Jorge Zahar, onde identifica a
função da Cosmologia como uma re-fundação da Física. Fonte: Lattes
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