Por
um marco regulatório das comunicações
Rafael
Patto
06/12/12
Existe
no Brasil uma contradição muito hipócrita: a mentalidade liberal, ou
neoliberal, é contra os monopólios do Estado, e, com base nesse argumento, se
justificaram as PRIVATARIAS da década de 1990 (que são injustificáveis do ponto
de vista ético, moral, legal e até mesmo lógico). Mas curiosamente os
monopólios privados dos meios de comunicação não são alvos de questionamentos.
Apenas seis famílias
neste país, representantes da minoria das minorias da nossa sociedade, se
arvoram ao direito de falar por TODOS, e consideram que esse direito é um
direito natural, divino, absoluto e que não pode ser contestado. O Marco
Regulatório das Comunicações é um instrumento necessário à quebra da
concentração de poder das empresas de comunicação. Diluir essa concentração é
condição necessária à democratização desse setor. Uma mesma empresa não pode
ser dona de tevê, rádio, jornal, revista, portal de internet, tudo ao mesmo
tempo. Essas propriedades cruzadas retidas nas mãos dos mesmos donos
representam uma ameaça à diversidade e à pluralidade. Afinal, são sempre as
mesmas vozes, as mesmas idéias, as mesmas opiniões circulando em diferentes
meios e canais. É preciso distribuir melhor, repartir esse latifúndio
midiático, para que mais vozes, mais idéias, mais opiniões também possam
circular, a bem da diversidade e da democracia.
Nos EUA, por exemplo, é
terminantemente proibido que uma única empresa tenha, num mesmo estado, canal
de tevê, de rádio e jornal impresso. Por quê? Porque isso é elementar para a
democracia! Quando, num mesmo domínio territorial, circula apenas a visão de
mundo impregnada dos interesses de um único grupo, todos os que ali vivem
estarão submetidos a um filtro, e terão seu contato com o mundo sempre mediado
por essa filtragem, que pode ser tendenciosa, enviesada e que pode também
manipular, bloquear ou censurar informações, sem que haja contraponto. E é
exatamente isso o que acontece aqui no Brasil. A Rede Globo, por exemplo, é um
império que engordou com o dinheiro dos governos ditatoriais, e hoje detém o
controle de um verdadeiro conglomerado multimidiático. Se fossem uma empresa
estadunidense, as Organizações Globo JAMAIS poderiam possuir emissoras de tevê,
rádio, jornais, revistas, portais de internet, tevê a cabo, como ocorre aqui.
Porque isso é sabidamente atentatório à democracia e à liberdade de expressão.
Porque enquanto somente os Marinho falam por todos esses canais, e em nome de
uma minoria ínfima da nossa sociedade que compartilha dos mesmos interesses que
eles e comunga da visão de mundo deles, outros milhões e milhões de brasileiros
com outras visões de mundo são silenciados e têm castrado o seu direito de
expressão porque não dispõem de acesso aos meios sociais de comunicação
necessários ao exercício da liberdade de expressão. Isso é justo?
Na Argentina, a
presidenta Cristina Kirchner está enfrentando com muita coragem essa realidade
injusta. O Grupo Clarín, uma espécie de Globo argentina, terá até o dia 08 de
dezembro para se desfazer de seu império oligopólico. Absurdamente, esse Grupo
detém o domínio de 254 canais de tevê no país. Com a nova lei, só poderá ter
24. Se antes 254 canais expressavam as mesmas idéias e as mesmas opiniões e
visões de mundo, com a nova lei, estarão abertas 230 vagas para que outras 230
visões de mundo também se expressem. Isso não é maravilhoso para a diversidade
cultural e para a pluralidade política de uma nação? É disso que precisamos
aqui no Brasil! Na Argentina, o governo não está estatizando as empresas de comunicação.
Apenas está exigindo que os oligopólios se desfaçam, a fim de que os meios de
comunicação não estejam mais concentrados nas mãos de tão pouca gente. Se isso
fosse feito aqui no Brasil, toda a sociedade ganharia. Afinal, a gente sabe que
os veículos de comunicação submetidos a esse controle tão restrito não
representam nem a maioria do nosso povo, quanto mais a sua totalidade. O Brasil
da tevê se resume ao sudeste do Brasil, e, mesmo assim, um sudeste fake,
“higienizado”, sem os traços e as marcas da diversidade, que são tratadas como
sujidades pela estética televisiva.
Para que tenham fim
esses mecanismos de exclusão, de apagamento das diferenças, que produzem a
invisibilidade de grupos étnicos e suas formas de ser e viver, e o
silenciamento de formas de falar e pensar da maioria do povo deste país, é que
precisamos com urgência de um Marco Regulatório das Comunicações, a exemplo dos
que já existem nas principais democracias do planeta.
Na França, que é um país
de dimensão inúmeras vezes menor do que o Brasil, o sinal de uma mesma emissora
de tevê não pode ter um alcance superior a 30% de seu território. Aqui no
Brasil, o sinal da Globo chega a quase 100% dos lares brasileiros, do Oiapoque
ao Chuí, sem nenhum tipo de restrição. Isso é um fator de empobrecimento para o
próprio país, que não tem a oportunidade de ser apresentado à sua
grandiosidade, diversidade e diferenças locais e regionais. Sempre é só o
sudeste: uma só paisagem, um só sotaque, um só estilo de vida. O Brasil não é
uma coisa só. É preciso que as concessões públicas para emissoras de tevê sejam
mais democráticas, para que mais pessoas tenham acesso e oportunidade de
produzir conteúdos no Brasil e difundi-los, irradiá-los, pelos meios de
radiodifusão. Isso contemplaria a demanda social por liberdade de expressão e,
ao mesmo tempo, atenderia ao direito do consumidor de contar com uma oferta
diversificada desse serviço de radiodifusão que lhe asseguraria uma efetiva
liberdade de escolha, com opções realmente diferentes, e não mais essa situação
que ocorre hoje em que mudar o canal da tevê não significa absolutamente nada.
Qual a diferença entre Gugu e Faustão? É a mesma idiotia! Qual a diferença
entre Arnaldo Jabor, Alexandre Garcia, Nêumanne Pinto e Boris Casoy? É a mesma
depravação reacionária! É preciso diversificar!!!
Por isso, é preciso um
Marco Regulatório das Comunicações!
REGULA, DILMA!!!!
Se quem não deve não
teme, porque querem impedir que mais vozes falem??? Quem teme a pluralidade de
idéias??? Tem gente que quando vai falar contra o Marco Regulatório não diz
nada mais do que um fraseado vazio e do tipo "pro-forma". A pessoa
nem se contextualiza no debate para dar uma opinião, nem procura aprofundar
seus conhecimentos sobre o tema. Apenas joga o PRE-conceito PRE-concebido
PRE-fabricado na conversa, empurrando esse lero-lero de “liberdade de
imprensa”, como se regulamentação da mídia se confundisse com censura. Aonde é
que a regulamentação do setor midiático se choca com os princípios de liberdade
de expressão???
É o desregramento do
setor que frustra o direito de expressão da ampla maioria da sociedade. A
questão é essa: as pessoas confundem liberdade de expressão com liberdade de
imprensa (e essa é uma confusão provocada pela desinformação que a própria
imprensa produz). Esses conceitos são muito diferentes. E liberdade de
expressão é muito mais amplo e abrangente. Não podemos achar que só a imprensa
pode se expressar. A liberdade de expressão é para todos, é um direito
universal e não de apenas meia dúzia de EMPRESAS.
O espectro
eletromagnético por meio do qual vibram as ondas de rádio e tevê, cada uma na
sua frequência, é limitado, não é infinito não. E está praticamente todo tomado
pelos conglomerados que se formaram em torno de propriedades que têm sempre os
mesmos donos. São redes de emissoras de rádio e televisão de pouquíssimos
proprietários que ocupam praticamente a totalidade desse espectro
eletromagnético, que é um bem público. Não dá pra um "novato" se
inserir nesse "mercado" se ele não for regulamentado e submetido a
reformulações. Não existe livre concorrência nesse segmento absolutamente monopolizado,
dominado por empresas que se fizeram verdadeiros impérios às custas do Estado e
do Erário (empréstimos, financiamentos de bancos públicos, camaradagens de
sucessivos governos, perdões de dividas, isenções fiscais, etc. etc. etc.) Não
dá!!! Tem que regular. Ou seja, tem que pôr regulamento, regra. O campo das
comunicações no Brasil é absurdamente desregrado, como em nenhum outro lugar do
mundo civilizado.
Não podemos continuar
admitindo que exista uma "casta" na sociedade que paire acima do bem
e do mal e acima das leis. Se há leis para todo mundo, porque as empresas de
comunicação não vão se submeter a elas também???
Não há argumento que
consiga justificar de modo racional a não regulamentação desse setor. Quem se
opõe a isso deve recorrer a preconceitos, inverdades ou simplismos.
Reproduzido
de Facebook de Rafael Patto
06
dez 2012
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