sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Miguel Nicolelis: “O pesquisador precisa apenas pesquisar, não ser professor ou administrador’


Na primeira parte da entrevista, o cientista Miguel Nicolelis relata os problemas burocráticos que encontrou quando fez graduação e doutorado em Medicina na USP, nos anos 1980. Diz que o Brasil melhorou de lá para cá, mas a estrutura engessada da academia brasileira ainda é muito refratária à boa prática científica. Não há mais espaço para o mestrado, acredita. E critica o atual sistema do CNPq, que prioriza a quantidade e não qualidade dos trabalhos. “Einstein só teve cinco teses até 1905. Assim não seria considerado um pesquisador top no CNPq”, diz.

CartaCapital: Como era fazer ciência no Brasil na época em que o senhor estava na faculdade, nos anos 1980?

Miguel Nicolelis: Era muito difícil porque, no Brasil daquela época, tudo tinha que passar pelos chefes de departamento, que eram professores titulares (na Faculdade de Medicina da USP, onde se graduou). Não havia como fazer nada sem estar sob a tutela ou sob a proteção de algum dos catedráticos. E isso era muito difícil, porque a maioria deles era de médicos, alguns muitos bons médicos, mas sem formação cientifica. E o espírito era muito feudalista. Eu bati de frente com um dos professores, que foi o motivo de eu sair do Brasil. Tornei-me pessoa non grata do departamento. Tive a sorte de, no primeiro ano de pós-doc lá fora, ter um trabalho publicado na revista Science. E isso causou uma reação em cadeia oposta do que eu esperava…

C: Ciumeira?

MN: A mensagem era “nem volte, porque você não vai ter espaço nenhum aqui”. E então decidi ficar nos Estados Unidos. Se eu voltasse, ficaria no “closet” (gíria da academia para designar profissionais sem função).

CC: O que exatamente houve para sua saída da USP?

MN: Eu não vou entrar em detalhes porque não vale a pena, são disputas acadêmicas. Nós estávamos criando uma nova disciplina dentro da faculdade e claramente fomos considerados, eu e mais alguns, uma ameaça. Ameaça de progressão na carreira, estávamos fazendo algo muito novo, uso de computadores em medicina. Estou falando de vinte tantos anos atrás. Mas eu senti o peso que era você realmente conseguir fazer alguma coisa. Quando comecei a publicar alguma coisa de peso, na universidade que eu estava (a Hahnemann, da Filadélfia), meu orientador de pós-doutorado me disse: “Não te querem lá (no Brasil) mas nós te queremos”. Foi lá que desenvolvi o primeiro passo nessas interfaces cérebro-máquina. E seis meses depois eu recebi a oferta da Universidade de Duke (Carolina do Norte, EUA), onde eu estou até hoje.

CC: E o senhor entende que essas dificuldades eram específicas da USP ou do Brasil como um todo?

MN: Aquilo era muito específico do Brasil naquela época. Era muito difícil você ascender na carreira. Melhorou muito. Mas ainda não é o que a gente espera, eu acho.

Leia a entrevista completa em Carta Capital clicando aqui e ali.

Reproduzido de Carta Capital
10 nov 2011

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