Sociedade deve rejeitar o AI-5 Digital
Antonio Carlos Ribeiro*
Instituto Humanitas Unisinos
16/08/2011
O Projeto de Lei (PL) 84/99, proposto pelo senador mineiro Eduardo Azeredo, do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB/MG), com o objetivo de tipificar crimes na internet, tramita em regime de urgência em cinco comissões do Congresso Nacional.
Apresentado à Câmara Federal em 1999 e aprovado quatro anos depois, o PL seguiu para o Senado, casa onde recebeu um texto substitutivo do próprio autor, então senador, foi aprovado mais uma vez e reencaminhado à Câmara.
O que parecia ágil está completando agora 12 anos e tramita em regime de urgência nas comissões de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática, Constituição, Justiça e Cidadania, Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, de onde se espera siga para votação no plenário.
Se os parlamentares e partidos contrários ao substitutivo conseguirem aprovar emendas que suprimem propostas aprovadas no Senado poderão conseguir um resultado menos sofrível, já que o setor fez tantos avanços e a sociedade tantas conquistas que os próprios parlamentares mancomunados com os meios de comunicação se sentem ameaçados.
O choque se dá pela contradição entre as conquistas e os interesses cada vez mais retrógrados dos que desejam controlar a informação e lucrar sem medida, sem a vigilância da sociedade civil.
Mas se o Senado, por força desses parlamentares que usam o Estado para assegurar vantagens comerciais e corporativas, conseguirem a rejeição na íntegra, perdem-se as conquistas já feitas.
Por outro lado, setores como a sociedade civil e a academia – diretamente afetados pela legislação, foram alijados do debate no mesmo período em que cresceram politicamente – precisam contribuir para o debate agora, do qual estiveram foram nesses 12 anos.
A proposta foi baseada na Convenção de Budapeste, que tratou sobre o tema do cibercrime, e foi assinada poucos meses após os atentados ao Pentágono e World Trade Center em 2001. Ela objetivava frear crimes cibernéticos.
O avanço da cidadania, da comunidade acadêmica e da nova mentalidade de Ciência e Tecnologia do atual governo em relação à mentalidade retrógradas pode ser comparado à passagem de vários séculos, considerados o ritmo da cibercultura e as mudanças que o Brasil viveu na última década.
No PL em debate, as justificativas para a aprovação da Convenção asseguram os interesses de grandes empresas e governos em acabar com a neutralidade da rede e, dessa forma, controlar o acesso à internet – mantendo a estratégia de usar o Estado e a legislação contra os interesses dos cidadãos, marca dos setores corporativos e comerciais - e punir o direito à opinião.
A deputada Luiza Erundina, do Partido Socialista Brasileiro de São Paulo (PSB-SP), tentou conter os riscos ao direito à liberdade de expressão e fez um acordo com o deputado Eduardo Azeredo, propondo um seminário sobre o assunto antes da votação do texto nas comissões. O requerimento para o debate público foi apresentado em 28 de julho, e aguarda resposta.
Elaborada no regime de urgência e no ritmo da reação ocidental aos atentados nos EUA, a lei tem uma abordagem defensiva generalizada. Se a lei for aprovada como está hoje, de acordo com o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), ela vai criminalizar ações cotidianas como gerenciar um blog, digitalizar filmes e músicas, e desbloquear cartões e aparelhos celulares, criando empecilhos a atividades relevantes para o desenvolvimento como as redes abertas (P2P), pesquisas e o uso de obras protegidas por copyright, hoje fontes de informação e educação já conquistadas pela cidadania.
O debate sobre o marco civil para Internet ainda segue o ritmo aritmético de setores retrógrados como o bancário e o político, refletidos no Congresso Federal, que retardam a maturidade necessária para propor leis que tipifiquem crimes na rede mundial de computadores e normatizem o setor, sem amarrar a sociedade à pré-modernidade.
A sociedade brasileira reivindica pontos no marco civil do uso da internet que antecedem em importância o debate da Lei Azeredo, como os direitos ao livre acesso à internet, a neutralidade da rede, a criação de regras de responsabilização civil para provedores e usuários, e medidas que assegurem a liberdade de expressão e a privacidade.
A petição apresentada pelo deputado Emiliano José, do Partido dos Trabalhadores da Bahia (PT-BA), ao presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia, deputado Bruno Araújo (PSDB-PE), é contrária à proposta vigente sobre crimes na internet. Ela já tem 163 assinaturas de representantes dos setores empresarial, civil e acadêmico.
A internet e setores como Ciência e Tecnologia, Comunicação, Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado são muito sérios para escaparem a mecanismos de vigilância da sociedade. Por último, o Brasil não pode abrir mão dos avanços civis, conquistados com muito esforço, após décadas de ditadura.
*Agência Latino-Americana e Caribenha de Comunicação
Reproduzido do clipping FNDC.
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