Os jornais, o ódio fabricado e a
terceirização do ridículo
O país tem poucos jornais. E ainda assim
sempre estampam as mesmas e manchetes. A sociedade, que embora passe longe
deles, acaba atingida pelo ódio que fabricam
Laurindo Lalo Leal Filho
Houve época no
Brasil em que a oferta diária de jornais passava de uma dezena.
Embora a
maioria estivesse alinhada com interesses conservadores, existiam alternativas.
Basta lembrar a
Última Hora, de Samuel Wainer, comprometida com a defesa de causas populares.
Hoje os jornais
são poucos e quase sempre iguais.
É comum vermos
em determinados dias fotos e manchetes idênticas estampando suas capas.
Mesmice que acompanha
os conteúdos, unificados em linhas editoriais voltadas para fustigar
diariamente o governo federal.
Mas evitam
ultrapassar certa linha de ataques que os levaria ao ridículo.
Afinal tem uma
aura de seriedade que precisa ser preservada.
Para escapar
dessa encruzilhada abrem espaço para que terceiros digam o que eles gostariam
de dizer.
Nos editoriais,
onde se expressa a “voz do dono” surgem por vezes argumentos ponderados em
defesa das instituições democráticas e de respeito aos resultados eleitorais.
É a seriedade
oferecida como álibi para dar a leitores radicalizados e personagens opacos os
espaços necessários para as suas diatribes contra o governo, os movimentos
populares e mesmo as instituições republicanas.
As seções de
cartas dos leitores são um espaço muito mais nítido que os editoriais para
conhecermos o que pensam os donos do jornal sobre determinado assunto.
Alguns só
publicam cartas que dizem o que lhes interessa, outros tentam disfarçar com
mensagens divergentes, sempre em número e contundência menor que as outras.
Nas reportagens
a escolha das fontes é primorosa.
Da noite para o
dia surgem “lideres” de movimentos cujas origens e sobrevivência são obscuras.
Ganham espaços
generosos no noticiário porque dizem o que os jornais querem falar mas não têm
coragem.
Não voltariam,
por exemplo, a acenar com o fantasma do comunismo, mas deixam que seus
entrevistados o façam à vontade.
Nem fazem a
apologia escancarada do impeachment da presidenta, sabedores da sua inconsistência
jurídica, mas colocam essa palavra na boca dos seus personagens e fazem questão
de destacá-la nas fotos das manifestações conservadoras.
Para não falar
dos defensores da “intervenção militar”, igualmente abrigados nos jornais por
textos e imagens.
O crime contido
na mensagem raramente é mencionado.
Não vale
relativizar tudo isso dizendo que pouca gente lê jornais.
É verdade que
as tiragens no Brasil são baixíssimas mas as mensagens impressas vão muito além
da leitura do jornal.
Elas reverberam
pela internet, onde os sites de noticias que as reproduzem são os mais
acessados.
Espalham-se
pelas emissoras de rádio, tanto nas noticiosas como nas de entretenimento.
As primeiras
usando as notícias para a elaboração de suas pautas, indo atrás dos personagens
dos jornais, para por no ar vozes até então desconhecidas.
As outras,
encaixando entre músicas, receitas e aconselhamentos pessoais a leitura do
noticiário impresso, feita de forma sedutora, quase sempre coloquial.
São os chamados
comunicadores populares falando para milhões de ouvintes diariamente através do
rádio.
Na televisão,
esse aparelho que mesmo que não queríamos somos obrigados a ver em salas de
espera, bares, restaurantes e outros lugares públicos, lá estão os telejornais
e seus comentaristas repercutindo aquilo que está estampado nos jornais.
Para não falar
das bancas nas ruas, onde transeuntes se juntam para ler e, às vezes, comentar
as manchetes.
Assim como dos
outdoors e dos painéis nos pontos de ônibus e nas TVs dentro deles e dos vagões
dos metrôs, mostrando as capas de revistas transformadas em peças de propaganda
política fora do período eleitoral.
Resultado de
tudo isso: a grande maioria da sociedade mesmo passando longe dos jornais
impressos é por eles impactada absorvendo o ódio que destilam contra governos e
partidos populares, vociferado em manifestações de rua e nas redes sociais.
A linha
editorial desses jornais é responsável também pela exacerbação da crise
econômica fazendo com que muitas pessoas, mesmo imunes à ela, sintam-se
atingidas.
Os agentes
econômicos se retraem, a crise se acentua e o pais todo sofre as consequências.
Reproduzido de Revista
do Brasil. Edição setembro 2015
14 set 2015